ACTAS  
 
8/27/2013
“Ambiente e energia, o que temos de decidir já”
 
Carlos Coelho

Antes de mais, os meus parabéns pela presença de todos antes da hora. Pedi-vos para respeitarem os horários, mas vocês levaram isso a um novo recorde. Começamos bem esta Universidade de Verão 2013.

 

Vou tirar partido do facto do nosso convidado da manhã ter tido um problema a sair de Lisboa e portanto vai chegar aqui com uns dez minutos de atraso, para dizer umas coisas que vos queria dizer ao almoço, mas assim reservo o tempo do almoço para o nosso convidado.

Provavelmente os vossos coordenadores já disseram que o trabalho de grupo para este ano vai ser sobre a revisão constitucional. Todos os anos o trabalho de grupo é diferente e considerámos importante neste ano dedicarmo-nos à análise da lei fundamental.

 

Alguém, com mais autoridade do que eu, disse que cada geração deve ter a sua Constituição. Isto é, que ao interpretar o que é a lei fundamental do país a vossa geração deve ter a legitimidade de dizer o que considera ser mais importante. Ocorre que as Constituições tal como são aprovadas na maior parte dos países têm normas mais fixas. A nossa tem normas até que não se podem modificar, são os chamados limites da revisão constitucional. Aqueles que estudam Direito sabem que isso obriga à dupla revisão: primeiro uma revisão para alterar esse artigo que não permite alterar e depois uma segunda revisão para alterar os artigos que passam a poder ser alterados. A doutrina divide-se: alguém considera que esses limites da Constituição dão-lhe força porque são valores perenes e há outros que acreditam que esses limites agarram as jovens gerações a normas que as velhas gerações consideraram que eram mais importantes.

 

Aquilo que lhes vamos pedir é um exercício complexo, mas estou certo que estarão à altura desse desafio. Aquilo que pedimos é que olhem para a Constituição e que sejam capazes de responder a três perguntas. A primeira pergunta é quais são os valores e normas fundamentais que devem continuar. A segunda pergunta é quais são as normas que devem ser eliminadas, que teriam feito sentido à data em que a Constituição foi aprovada mas que já caducaram e portanto não devem pesar sobre as jovens gerações e a terceira pergunta é quais são aquelas normas que devem continuar mas devem ser alteradas.

 

Portanto, vão olhar para a Constituição e ver o que é que querem manter, o que é que querem alterar e o que é que querem revogar. É evidente que não vão poder escrever uma Constituição alternativa, nem é isso que vos estamos a pedir. Portanto, não vão poder escrever sobre tudo, até porque os vossos grupos quando estiverem neste púlpito na quinta-feira à tarde a apresentar o vosso trabalho vão ter quatro minutos para fazerem essa apresentação. Logo, vão ter de escolher quais são os aspectos mais importantes que querem dizer, por exemplo: "eu sublinho isto, que deve continuar, isto que quero revogar e isto que quero alterar”. Vão ter de escolher, vão ter de fazer uma escolha sobre o que é mais importante, o que é mais relevante e isso também tem um peso que será comentado pelo nosso convidado de quinta-feira à tarde que será o Dr. Paulo Rangel.

 

Temos a consciência de que a maior parte de vocês não tem formação jurídica. Temos consciência disso, mas também tenho a convicção de que a Constituição que é a lei das leis, é a lei mais importante, não é apenas um exercício para juristas; todos nós, todos os cidadãos têm o direito de dizer se concordam ou não com normas que estão no travejamento essencial da lei fundamental da República Portuguesa. Mas para que haja equilíbrio entre todos vamos fazer hoje obriefingao almoço que é para tentar criar condições de equidade entre todos.

Ou seja, mesmo aqueles que não estão em Direito, ou aqueles que tendo estudado Direito não deram atenção às aulas de Constitucional, preferindo concentrar-se noutras áreas, vão ter um briefing que vai tentar explicar o que é o essencial da Constituição. É aquilo que nós pedimos ao professor Tiago Duarte, para explicar o que é uma Constituição, porquê uma Constituição, qual é a sua estrutura, como é que ela é aprovada e alterada.

 

Vamos dar-vos também uma Constituição, uma ediçãozinha de bolso para poderem pôr no vosso bolso. Não é das mais práticas para consultar mas é umgadgetengraçado. Isso ser-vos-á distribuído durante obriefingdo almoço. Se tiverem alguma dúvida, a todo o momento não hesitem em perguntar aos vossos conselheiros para esclarecermos qualquer dúvida que possa existir na apresentação deste trabalho de grupo.

Para além da apresentação oral que vão ter de fazer aqui na quinta-feira à tarde têm de apresentar o vosso contributo escrito e este será entregue até quarta-feira às 20h. Portanto, atenção às pedaladas nos trabalhos de grupo para conseguirem na quarta-feira às 20h terem o trabalho apresentado.

 

Para aqueles mais perspicazes e que ainda não adormeceram e perceberam que isto não faz muito sentido: temos Universidade de Verão até domingo e o vosso trabalho de grupo ter de ser apresentado na 4ªf à noite, esclareço já que este não é o único trabalho de grupo. Vão ter mais surpresas ao longo da semana e vão ser solicitados a fazerem outras coisas para lá deste trabalho que é de qualquer forma o trabalho de grupo mais importante.

 

Como tudo na vida isto obriga a decisões equilibradas, depois de eu ter dito que vão ter de trabalhar muito e acelerar, quero recordar um conselho que dei aos vossos coordenadores ontem à noite: não exagerem no trabalho à noite. Sei que quando começaram a entrar na pedalada vão ter odrivede querer fazer as coisas e a excitação de escrever, de querer discutir e debater e isto tende a prolongar-se, mas não encorajamos que façam directas nem que se vá para lá das duas da manhã. O bar do hotel fecha às duas da manhã exactamente a nosso pedido por causa disso. Porque isto tudo tem de ser regrado. Portanto, não se esqueçam que isto é uma semana e se começarem a pedalar exageradamente nos primeiros dias chegam ao final da semana completamente esgotados e terão menos capacidades de reagir aos desafios que vamos ter todos os dias, inclusive o desafio de sábado que é a simulação de assembleia parlamentar.

 

Relativamente ao trabalho de grupo estas eram as recomendações mais importantes. Alguém tem alguma pergunta para fazer já sobre esta questão do trabalho de grupo? Então é claro para todos o que se vai fazer. Fantástico.

Segunda questão: os vossos coordenadores ontem saíram com a grelha que aliás vocês receberam no JUV de hoje, que é a estrutura do youJUV. Se repararam na estrutura do youJUV vocês já sabem, pois os vossos coordenadores já vos devem ter dito, quais são os dias em que vocês vão fazer o youJUV. Hoje são os grupos Roxo e Verde.

 

O youJUV obriga-vos a estar atentos. O youJUV resultou de uma proposta dos vossos colegas de uma universidade anterior. Portanto, foi uma recomendação vossa, não fomos nós que nos lembrámos do youJUV, foram vocês que disseram que queriam ter um papel mais importante nele. Mas para que o youJUV tivesse, para lá da vossa participação, um interesse pedagógico para nós, formatámos o youJUV de forma a estimular a observação. Vão ter de ver qual é o grupo que gostaram mais, qual é a pergunta que os outros fizeram que foi mais interessante, o que é que os oradores disseram que mais vos marcou, etc. É uma obrigação de observação da Universidade de Verão. Portanto, além de ouvirem as aulas, participarem nos debates, fazerem as vossas avaliações, também vão ter de ver como é que os outros grupos e colegas participam nos trabalhos da Universidade de Verão.

 

Diz-nos a experiência dos anos em que fizemos o youJUV que é um instrumento muito interessante. Uma das críticas que provavelmente vocês farão, mas não quero antecipar as vossas críticas do último dia, que é a falta de mais oportunidades de interacção entre os grupos foi parcialmente colmatada com o youJUV. Porque o youJUV força encontros. Se o grupo Verde disse hoje que o melhor grupo para eles é o Branco - dizendo um grupo que não existe -, é normal que as pessoas do grupo Branco vão ter com as do Verde para dizer que eles foram simpáticos para com eles e que gostaram do que escreveram sobre eles. Isto é uma forma de não estarem todos exclusivamente fechados sobre os vossos grupos mas interagirem uns com os outros.

 

Quando o nosso orador acabar de falar - hoje será o Engº Jorge Moreira da Silva que é um homem muito sabedor mas não é dos homens que fala menos tempo, vão ver que vou ter de estar sempre a chamar a atenção para os tempos - vamos entrar na fase de debates. Espero que o atraso dele não comprometa a existência dos dois momentos. O primeiro momento são as perguntas obrigatórias. Vocês já escolheram, já tenho ali a lista, as pessoas que vão ser chamadas em cada grupo a fazer perguntas ao nosso orador. O primeiro grupo é o Cinzento e faremos uma pergunta uma resposta e assim sucessivamente até se esgotarem as dez perguntas obrigatórias. Esgotadas as perguntas obrigatórias, entramos no sistema que chamamos de "Catch The Eye” que é um sistema parlamentar muito conhecido na maior parte dos países da Europa, que não assenta numa lista prévia de oradores mas sim nos oradores que chamam a atenção do olho do Presidente.

 

Será o Presidente da JSD, o Hugo Soares, com a ajuda do deputado Nuno Matias, a fazer essa gestão do "Catch The Eye”, portanto é para eles que vocês têm de assinalar quando abrimos o "Catch The Eye” a vossa vontade de falar. Mas sugerimos ontem aos coordenadores que pudessem sinalizar aos vossos conselheiros o vosso interesse de forma a que eles nos transmitam esses pedidos. Portanto, não é obrigatório ter a intermediação do conselheiro mas pode ajudar-nos, pelo menos até olearmos este sistema, a garantirmos uma distribuição equilibrada do "Catch The Eye”.

 

Finalmente, nas mesas os almoços são livres, é um serviço debuffet, o único pedido que fiz foi os coordenadores sentarem-se na chamada mesa da presidência para conversarem com o professor Tiago Duarte durante o almoço. Mas todos os outros almoços são completamente informais. Nos jantares as mesas estão fixas, como estiveram ontem à noite. Portanto, quando chegarem à sala vêem as mesas com o vosso estandarte, mas a mesa nunca é a mesma, para garantir que não há desequilíbrios, isto é, que não há grupos beneficiados que ficam sempre mais perto do orador e outros mais prejudicados porque ficam mais longe. Embora nós tentássemos matizar esses inconvenientes com a distribuição de ecrãs ao longo da sala, o José Baptista arranjou um sistema rotativo que garante que é, tanto quanto podemos, equitativa a distribuição nas mesas.

 

Não fixem o vosso local na sala pois nunca é o mesmo, têm de ver onde é que está o estandarte com a cor do vosso grupo, porque é isso que determina a vossa localização. Em qualquer circunstância sabem que o grupo anfitrião, que é aquele que vai receber o nosso convidado, estará na mesa da presidência. Portanto, o estandarte no caso do grupo anfitrião estará no grupo da presidência, estaremos na vossa mesa - é a "vossa” mesa e não a "nossa” mesa. O grupo que faz o brinde estará na mesa redonda, no centro, na primeira fila, em frente ao orador para o saudar. Estas são as recomendações que eu tinha para vos fazer e que assim não as farei hoje no almoço reservando mais espaço para obriefingda revisão constitucional.

 

Dou as boas-vindas ao nosso Ministro, ao Eng.º Jorge Moreira da Silva, que é um ex-Presidente da JSD, portanto é alguém que conhece bem esta Universidade de Verão. É, aliás, o orador a seguir ao Prof. Marcelo Rebelo de Sousa, que mais vezes esteve em edições da Universidade de Verão, todas elas a falar deste tema do Ambiente e da Energia onde ele é o especialista.

 

O Eng.º Jorge Moreira da Silva foi membro do Governo, foi Secretário de Estado da Ciência, foi Secretário de Estado do Ambiente e hoje é Ministro do Ambiente e da Energia. Acompanho-o já há muitos anos, sou um admirador dele, mas mais do que isso, sou testemunha: fomos ambos há muitos anos, candidatos ao Parlamento Europeu e eu vi o prestígio que o Eng.º Jorge Moreira da Silva atingiu a nível europeu. Ele foi o responsável no Parlamento Europeu pelas mudanças climáticas. O sistema de comércio de emissões foi um sistema que ele criou, foi o redactor no Parlamento para o comércio das emissões e foi ele o chefe e coordenador de todas as missões do Parlamento sobre mudanças climáticas durante todo o seu mandato, sucedeu ao Eng.º Carlos Pimenta nessas novas funções.

 

Para não perder mais tempo, dou-lhe as boas-vindas e passo a palavra ao senhor Ministro.

 
Jorge Moreira da Silva

Bom dia a todos. Peço desculpas pelo atraso, sei bem que a pontualidade é um dos atributos desta universidade. Desejo-vos boa sorte, terão uma semana muito dura, como já perceberam, mas uma semana que não esquecerão, essa é a experiência que vou levando destas sucessivas edições como orador nesta universidade.

 

Cumprimento naturalmente o deputado Carlos Coelho, o Presidente da JSD, o deputado Nuno Matias, pela organização desta universidade. Mas quero obviamente fazer uma referência em particular ao eurodeputado Carlos Coelho pela perseverança e qualidade que tem sagrado nesta universidade na qual tenho participado por diversas vezes. Esta uma universidade em que os professores são avaliados tanto ou mais quanto os alunos. Avaliados, desde logo, porque a Comunicação Social está cá a acompanhar as nossas intervenções, mas também porque sei que depois da minha intervenção também farão uma avaliação ao meu desempenho do ponto de vista científico e pedagógico.

É, portanto, um bom exemplo de avaliação dos docentes e da matéria, que a JSD vem defendendo há muitos anos.

 

Nesta intervenção trago apenas um slide que serve só de índice da intervenção. Vou naturalmente concentrar a minha atenção nas questões centradas no Ambiente, no Ordenamento do Território e na Energia, mas gostava de fazer uma nota de contexto que está a montante desta área sectorial e que tem a ver com um momento que vivemos em Portugal e o percurso desde há dois anos até aqui chegarmos.

Portugal viu-se confrontado com a necessidade de superar uma fase de sequestro em que nos encontrávamos no défice e na dívida. Isto é, depois de uma década perdida com crescimento medíocre, com crescimento exponencial da despesa pública, com endividamento progressivo, fomos confrontados com a necessidade de pela terceira vez na nossa história democrática solicitar um resgate e uma ajuda externa.

 

Nestes dois anos, o Governo liderado por Pedro Passos Coelho olhou para este resgate sob uma forma orientada de por um lado concluirmos o memorando de entendimento o mais depressa possível, pois dessa conclusão dependia a nossa capacidade de reconquistarmos a liberdade de escolhas políticas e por outro lado de regresso ao mercado substituindo o financiamento pela Troika pelo financiamento pelo mercado. Não apenas porque isso é mais eficiente do ponto de vista económico para as famílias e para as empresas, mas também porque isso permite uma reconquista da nossa plena soberania e autonomia orçamental e financeira.

 

Nestes dois anos estes objectivos foram sendo desenvolvidos através de reformas estruturais, através de consolidação orçamental e de consolidação do nosso sistema financeiro. Depois destes dois anos de esforços e sacrifícios que foram solicitados aos portugueses foi sendo possível verificar alguns resultados que nos dão confiança quanto à capacidade de abrirmos uma nova fase, uma fase de maior esperança. Conseguimos, nestes dois anos, reduzir o défice estrutural primário e a despesa pública a níveis recorde desde 1974, foi possível reconquistar a nossa credibilidade externa através de sete avaliações positivas do memorando de entendimento, foi possível aumentar as exportações e diminuir as importações e equilibrar a nossa balança comercial e, mais recentemente, foi possível verificar a existência de alguns sinais positivos quanto à inversão da nossa trajectória económica.

 

Estamos precisamente numa fase de transição e era essa a razão pela qual eu fiz esta introdução. Estamos numa fase de transição entre o resgate e o pós-Troika, uma fase de transição entre a necessidade de concluirmos o memorando de entendimento nos próximos dez meses, prosseguir este regresso faseado a mercados e por outro lado abrir uma fase de crescimento sustentável que nos permita ter um novo modelo de desenvolvimento mais do que um resgate económico-financeiro. Nesse novo modelo de desenvolvimento, aquilo que gosto de designar por pós-Troika - recordam-se que fundei, aliás, com o deputado Carlos Coelho, a plataforma para o crescimento sustentável há dois anos e publicámos um relatório que se chamava "Uma visão pós-Troika para o crescimento sustentável” - há cinco dimensões essenciais.

 

Estas são: o aprofundamento da Democracia, a refundação do projecto político europeu, uma nova fase de responsabilidade orçamental que se segue à consolidação orçamental e nessa responsabilidade orçamental a reforma fiscal mais alinhada com o crescimento, a reforma do Estado redefinindo estas funções num quadro de maior equidade, de maior justiça social, de maior eficiência. Mas também um pilar essencial do investimento selectivo e reprodutivo e de reformas estruturais em três áreas que são estratégicas: o conhecimento, a política industrial e a Economia Verde. É aqui que gostava de centrar esta minha intervenção, precisamente na área do ambiente e da energia, dever ser assumida neste contexto de crescimento sustentável, de definição de um novo modelo de desenvolvimento, como áreas estruturantes.

Não apenas consagrando direitos do ponto de vista da solidariedade intergeracional e do ponto de vista da qualidade de vida, mas também enquanto factor de crescimento e de emprego.

 

Nesta área jogam-se grandes riscos e grandes oportunidades. Gostava de fazer um enquadramento do ponto de vista internacional, do ponto de vista europeu, mas essencialmente falar do nosso país e dos nossos desafios. No plano internacional estamos a viver, como sabem, uma crise climática e as alterações climáticas são um fenómeno inexorável e porventura o maior desafio que se coloca à nossa e à vossa geração, a capacidade de enfrentarmos um aumento das emissões dos gases com efeito de estufa e o correspondente surgimento de fenómenos climáticos extremos.

 

Para lá da crise climática há uma crise de volatilidade das matérias-primas associada também a uma crise alimentar, como sabem, há um conjunto decommoditiesna área alimentar e energética que tem vindo a verificar uma volatilidade nos seus preços e isso afecta todo o mundo em geral, mas em especial os países com menor resiliência, os países em vias de desenvolvimento, que são os mais afectados também por esta volatilidade das matérias-primas. Há uma crise da pobreza extrema, continua a existir uma fractura Norte-Sul em termos de acesso à qualidade de vida, à Educação, à Energia, à Água, no fundo, a bens que são considerados essenciais. Mas há também uma pressão cada vez maior sobre os recursos: até 2030 espera-se um aumento da pressão quanto à produção alimentar em 50%, teremos uma procura de mais de 50% de bens alimentares; um aumento da procura de energia de 45% nos próximos 20 anos, sendo que mais de metade desta procura surgirá dos países em vias de desenvolvimento; e um aumento da pressão sobre os recursos hídricos de 30% nos próximos 20 anos.

 

Portanto, reparem que do ponto de vista internacional a circunstância de os países em vias de desenvolvimento estarem obviamente e de uma forma muito legítima a procurar terem acesso a uma nova economia e à satisfação das suas necessidades, vai colocar a um planeta que já tem hoje pressões sérias do ponto de vista da crise climática, energética, alimentar e da pobreza extrema, novas pressões do ponto de vista dos recursos. Mas há também o reverso da medalha no plano internacional: esta procura de energia dos países em desenvolvimento que será de cerca de sete biliões de dólares em notação portuguesa, isto é,seven trillion dollarsnos próximos vinte anos, vai criar oportunidades para países como Portugal e outros que têm boa tecnológica, boa engenharia e bons produtos, possam neste processo de acesso à energia que os países em desenvolvimento necessitam poder criar aqui um mercado importante de crescimento e emprego.

Por outro lado, há uma contabilização do custo de mudarmos de vida e do custo da inacção. O Relatório Stern publicado há dois anos, sobre alterações climáticas, diz de uma forma muito simples o seguinte: "Se mudarmos de vida, se mudarmos a nossa forma de produção e consumo de energia isso dá um custo associado de 1% do PIB, mas se não mudarmos de vida as consequências económicas relacionadas com a mudança climática situar-se-ão entre os 5% e os 20% do PIB. Logo, o combate à mudança climática é não apenas uma obrigatoriedade do ponto de vista ético e moral, porque temos essa obrigação perante as próximas gerações, porque há dados científicos que apontam para a inexorabilidade deste fenómeno, e portanto, temos de mudar de vida, mas, por outro lado, essa mudança é mais custo-eficiente do que não fazermos nada.” Estes dados são relevantes do ponto de vista internacional.

 

No plano europeu estamos perante aquilo que designo pela dúvida de um bloco querer continuar a liderar ou perder o benefício do pioneiro. A Europa liderou durante muitos anos as políticas ambientais: alterações climáticas, energia, biodiversidade, entre outros. Conseguiu lançar uma série de directivas comunitárias que "esverdeou” a economia, criou condições para ogreeningda Economia, no fundo para colocar no preço final de todos os produtos desde esta mesa, este microfone, até a este écrã, não só o custo das matérias-primas, do marketing, da mão-de-obra, dos transportes, mas também o custo do CO2e resíduos associados à produção dos produtos.

 

A Europa lançou nos últimos 20 anos esta fase de capitalismo ambiental, isto é, de internalização de custos ambientais na Economia, degreeningda Economia. Mas hoje a Europa está confrontada com uma crise em que é fácil alguns poderem dizerem que nesta crise económica e financeira o ambiente e a energia devem ser colocados de parte, não devem ser uma prioridade e que existem outras prioridades. Este é um dos dilemas que atravessa muitas capitais europeias mas também Bruxelas: devemos, ou não, continuar a fazer do ambiente, do combate às alterações climáticas, da protecção dos recursos hídricos, do combate à perda da biodiversidade, uma prioridade ou não? É óbvio que devemos continuar a fazer desta área uma prioridade, não apenas porque é obrigatório para lidar com problemas que só se forem resolvidos hoje protegerão a próxima geração, mas por outro lado é mais eficiente do ponto de vista económico agir já do que deixar para mais tarde.

 

Desde logo porque outros países à escala internacional estão a olhar para as tecnologias limpas, para a eco-eficiência, para as energias renováveis e para novos padrões de consumo e de produção como factores de competitividade e de crescimento. Reparem: nos dez maiores produtores de equipamentos eólicos e de equipamentos fotovoltaicos, oito em dez empresas são chinesas ou indianas. Deve a Europa, depois de ter criado as bases para uma nova Economia, para a Economia Verde, abrandar a sua política energética ou a sua política ambiental deixando de fazer aquilo que deve do ponto de vista ética, mas deixando também de fazer aquilo que deve do ponto de vista económico? Eu julgo que não e objectivamente esta é uma das matérias que espero que possa ser mais desenvolvida durante a nossa conversa.

 

Vamos agora a Portugal e à nossa situação paradoxal. Temos nesta área do Ambiente e da Energia tanto riscos como oportunidades. Gostava de apontar meia dúzia de indicadores que apontam para esta circunstâncias de estarmos perante grandes riscos e grandes oportunidades. Temos a 11ª maior zona económica exclusiva do mundo, mas ainda importamos 62% do pescado que consumimos. Temos recursos energéticos renováveis muito vantajosos, à escala internacional: água, vento, sol, mas somos um dos países da União Europeia com maior dependência energética do exterior, dependemos do exterior em cerca de 80% da energia que consumimos, sendo 55% do petróleo. Fizemos uma grande aposta nas renováveis, que atravessou vários governos, mas em simultâneo temos vindo a deitar fora por via da ineficiência energética muita desta aposta. Isto é, não só somos dos países que mais aposta nas renováveis como também somos o país que tem menor eficiência energética no consumo, que mais utiliza o automóvel por cada unidade de produto que é produzido.

 

Na área da biodiversidade temos uma das nossas grandes riquezas e património: 20% do território português faz parte da Rede Natura precisamente porque estas espécies são relevantes à escala internacional, mas não só não conseguimos ainda proteger devidamente esses recursos como ainda não conseguimos dar valor económico e social aos mesmos. Alguém que vive numa área protegida, que vive em reserva ecológica ou agrícola não tem até hoje beneficiado dessa circunstância do ponto de vista económico ou social, pelo contrário, muitas vezes as pessoas vão lamentando a circunstância de viverem num área rica em biodiversidade porque não se encontrou ainda uma forma de distribuição da riqueza associada a esta protecção da biodiversidade que é feita em Castelo de Vide, não só em nome das pessoas que vivem em Castelo de Vide mas em nome de pessoas que vivem em Lisboa, ou no Porto, ou em Bruxelas, ou em Viena.

Portanto, temos aqui esta situação paradoxal de um país muito rico em biodiversidade mas que ainda não conseguiu uma forma de valorizar económica e socialmente esta biodiversidade.

 

Na área da floresta temos uma das áreas de maior valor económico, representa 2% do nosso PIB mas por via dos incêndios nos últimos dez anos destruímos 3 mil milhões de euros de valor económico da floresta, para lá naturalmente das vidas que infelizmente se vão perdendo no combate aos incêndios florestais como infelizmente foi notícia novamente hoje. Portanto, temos na área da floresta uma riqueza de 2% do PIB que faz de Portugal o país com maior valor económico atribuído à floresta, mas destruímos com os incêndios nos últimos dez anos 3 mil milhões de euros de valor económico.

 

Na área da infraestruturação de água, saneamento e resíduos fizemos uma grande aposta com mais acesso a água potável, mais saneamento, mais tratamento de resíduos, mas ainda temos um milhão de portugueses sem acesso a saneamento básico. Por outro lado, existe ainda uma discrepância grande do ponto de vista tarifário entre Interior e Litoral no que diz respeito à água e existem, como tão bem conhecem, problemas de sustentabilidade financeira ligados.

Temos um grande potencial nos recursos mineiros e geológicos, a estratégia que foi produzida por este Governo há alguns meses aponta para um valor económico ligado equivalente ao PIB, mas nos últimos 30 anos não foi aberta nenhuma mina nova. Portanto, um grande potencial nos recursos mineiros e geológicos, mas, por outro lado, do ponto de vista prático não conseguimos ainda tirar partido desta riqueza.

 

No plano do ordenamento do território temos muitos planos. Fizemos, durante muitos anos, uma grande aposta no planeamento. Portugal melhorou consideravelmente as suas políticas ligadas à ocupação do solo, mas a circunstância de termos muitos planos nem sempre assegurou um bom planeamento. Quando olhamos para a desertificação do Interior, para a degradação da qualidade de vida nas cidades e para a destruição do Litoral percebemos facilmente que não é por termos muitos planos, e muitas vezes muitos planos incidindo sobre a mesma parcela, que isso traduz um bom planeamento. Quando olhamos para modelos de municípios vizinhos percebemos que existem muitas vezes incongruências quanto aos modelos de ocupação e desenvolvimento de território que não são facilmente compreensíveis quando se tratam em regra dos mesmos recursos naturais, das mesmas realidades sociais e económicas.

 

O planeamento municipal tem, infelizmente, sido visto muitas vezes apenas na perspectiva das fronteiras desse município e portanto temos uma área em que existe uma grande complexidade de regras, uma sobreposição de planos, uma dificuldade de os cidadãos percepcionarem as regras do ordenamento do território e uma incapacidade de coordenação do desenvolvimento intermunicipal. E é nesta sinuosidade de regras, que muitas vezes se perde a competitividade, mas também que surgem fenómenos que estão claramente à margem da ética e da lei.

 

Finalmente, do ponto de vista económico e social, temos na área da agricultura, da floresta, do mar, da biodiversidade, da água, da energia, boas instituições, recursos humanos altamente qualificados, recursos naturais altamente vantajosos a escala internacional, mas não conseguimos ainda tirar partido destas riquezas do ponto de vista do potencial humano, do ponto de vista dos recursos naturais, do potencial das infraestruturas que foram realizadas e do nosso posicionamento geoestratégico à escala internacional para gerar valor económico e social nestas áreas da Economia Verde.

É neste contexto que a integração de Ambiente, Energia e Ordenamento do Território se pode verificar como sendo virtuosa.

 

Temos de encontrar políticas, mecanismos, iniciativas, que possam em simultâneo resolver os problemas ambientais, porque isso é essencial para a qualidade de vida e para a solidariedade intergeracional. Isto é, temos que encontrar uma aposta na ecoeficiência, na Economia Verde, nas tecnologias limpas, uma forma de combater problemas ambientais que ainda temos, mas em simultâneo reduzir a nossa dependência do exterior do ponto de vista alimentar, energético e dos recursos. Finalmente, fomentar uma nova carteira de actividades económicas ligadas à Economia Verde, gerando benefício económico e emprego neste sector.

 

Portanto, a aposta na Economia Verde muito para lá da mera política ambiental. Tem benefício ambiental, tem benefícios do ponto de vista das nossas contas públicas e tem benefício do ponto de vista do crescimento e do emprego. Se durante muitos anos nos habituámos a olhar para o Ambiente e para o Ordenamento do Território como políticas transversais - são-nos por definição -, não são políticas verticais, ou sectoriais. Costumo dizer que a grande virtude que um Ministro do Ambiente possa ter - não estou obviamente a falar do meu caso - é sempre a sua capacidade de se meter na casa dos outros, porque a política do Ambiente só tem resultado prático se conseguirmos "esverdear” a política industrial, a política agrícola, a política dos transportes, da educação, da saúde e por aí adiante.

 

Mas agora chegou a altura também de na área da Energia assumirmos este sector como uma área transversal e portanto beneficiar da experiência que tivemos da área do Ambiente que era uma área em que o algoritmo era horizontal, transversal, para também fazermos o mesmo na área energética. Porque é que eu acho, porque é que entendo e porque é que essa foi a opção do Primeiro-Ministro de não considerar a área da Energia como uma área apenas económica, apenas vertical e apenas sectorial? Porque hoje a Energia tem um efeito significativo na política ambiental, o sector da Energia é o que tem mais impacto no Ambiente. Mas por outro lado, as políticas energéticas que tiram partido dos nossos recursos e das ciências energéticas e tecnologias energéticas mais sustentáveis, são o principal factor para melhoria da qualidade ambiental.

 

Portanto, reparem que estamos perante uma área que é tão responsável pelos problemas como é factor de solução para outros problemas ambientais. Por outro lado, na área da Energia joga-se muito com o lado do desequilíbrio da nossa balança externa. Por via da nossa dependência energética de 80%, mais de 55% do petróleo, todos os anos entre oito e dez mil milhões de euros vão para o exterior. Logo, a nossa dependência energética, a circunstância de estarmos demasiado dependentes do petróleo e dos combustíveis fósseis, tem consequências ambientais mas têm essencialmente consequências do ponto de vista do nosso défice externo e do nosso endividamento. Assim, esta área deve ser vista também como uma preocupação transversal e não apenas sectorial.

 

Por outro lado, a ligação entre água e energia é facilmente perceptível. Uma grande parte da electricidade é produzida a partir da água. Praticamente 50% da electricidade vem da água e mais de metade do preço da água decorre do preço da electricidade. O preço da electricidade tem um impacto forte no abastecimento de água, nos custos de água que chegam a casa e por outro lado a boa gestão dos recursos hídricos tem um impacto elevado na política energética através da aposta que vai sendo feita nesses recursos para produção de electricidade. Portanto esta ideia de integração de Ambiente e Ordenamento do Território e Energia, permite também na área da Energia encarar esta área como transversal.

 

Finalmente, esta integração gera benefícios para temas que estavam dispersos entre várias áreas de política pública e que agora podem ser tratados de uma forma integrada. Não é possível pensar a política de cidades sem encarar o peso que nas cidades tem a Energia, nos edifícios, nos transportes, na iluminação, na nossa forma de utilizarmos recursos. A área da Economia Verde não faz sentido olharmos para ela e para o crescimento verde não integrando nisto um sector tão pujante como é o da Energia. Por outro lado, o tema da eficiência de recursos: devemos olhar para a eficiência energética, para a eficiência da água e da utilização do solo, de uma forma integrada. Portanto, esta ideia de integrarmos políticas tem estes benefícios para lá dos que referi, também benefícios para estas políticas que muitas vezes não eram valorizadas suficientemente, como é o caso da política de cidades, eficiência de recursos e também a Economia Verde.

 

Gostava agora de - muito mais rapidamente, pois penso que estou a falar há meia hora e tentarei concluir em dez minutos porque foi isso que combinei com o Carlos Coelho - identificar algumas prioridades, sendo certo que acho que esta nossa discussão tem mais interesse se for depois concentrada nas perguntas e respostas, mas ainda assim quero apresentar-vos uma chave de leitura daquilo que me parecem ser as prioridades. O primeiro desafio é o da conclusão da infraestruturação ambiental e da resolução dos nossos passivos ambientais. Portugal tem, como disse há pouco, desafios significativos no abastecimento da água, não apenas no acesso de água de um número maior de regiões, porque há ainda muitos portugueses que não têm acesso a água a partir do abastecimento público, mas essencialmente encontrarmos uma forma de combater a fragmentação que existe no abastecimento de água. temos cerca de 500 entidades públicas a operar no abastecimento de água, entre alta e baixa, isto é, entre captação e transporte e distribuição nos concelhos. Nalguns casos temos empresas que são apenas de uma determinada freguesia ou de um determinado grupo de freguesias, noutros casos temos empresas municipais, ou intermunicipais, ou multimunicipais, mas a verdade é que temos uma fragmentação de empresas na área da água que perdem objectivamente benefícios de escala e de economias de gama.

 

Portanto, este é um tema importante da reestruturação do sector da água, não apenas para combater esta fragmentação mas também para melhorar a sustentabilidade financeira do sector. Como sabem, existem problemas relacionados com esta sustentabilidade financeira, com a disparidade das tarifas que são praticadas entre o Litoral e o Interior. Por outro lado um maior envolvimento da inovação dos sectores mais dinâmicos nesta área.

No plano dos resíduos temos de passar a uma nova fase. Depois de uma fase em que foi necessário acabar com as lixeiras, temos de passar a uma fase em que se reduza a deposição dos resíduos em aterro e se caminhe para aquilo que - perdoem-me a expressão - se costuma chamar de uma economia circular, uma maior reutilização e reciclagem de recursos.

 

O segundo desafio é relacionado com a valorização económica dos ecossistemas. O que é que neste palavrão, nesta expressão tão tecnocrática, quero afirmar? Um país, como eu disse há pouco, que é tão rico em biodiversidade tem que encontrar uma forma de remunerar os serviços prestados elos ecossistemas, porque convém termos noção que uma floresta tem benefício económico não apenas por via da sua transformação mas pelos serviços ambientais que são prestados. A floresta tem um papel na purificação do ar, na purificação da água, na preservação da biodiversidade e isso tem um valor económico. Temos de encontrar uma forma de dar valor económico à biodiversidade porque essa é a única forma de darmos valor social às pessoas que vivem e que querem continuar a viver em áreas protegidas.

A circunstância de se viver numa área protegida num parque natural, não pode continuar a ser visto como um ónus que recai sobre uma população mas como um benefício para a comunidade mas também para essa população pela circunstância de aí existirem recursos naturais vantajosos e que importa preservar.

 

O terceiro desafio é o da eficiência de recursos, que eu falei há pouco na introdução. Desperdiçamos - fixem este número, por favor - 40% de água desde a fase de captação até à fase de consumo nas nossas casas. Isto é, cada um de nós não só consome provavelmente mais água do que deveria como na própria cadeia de distribuição se perde por ineficiência do sistema cerca de 40% dos nossos recursos hídricos que são distribuídos.

Na área da eficiência energética, o mesmo: temos níveis de ineficiência no consumo em nossas casas, na iluminação pública, na frota automóvel da administração pública e nos edifícios da administração pública. No consumo de energia na indústria temos níveis de eficiência energética que oneram a nossa conta ambiental e também a nossa dependência ao exterior.

 

O quarto desafio é relacionado com um modelo de ordenamento de território. Temos de criar condições para combater a circunstância de termos muitos terrenos expectantes, muitos terrenos urbanizáveis. Isto é, de acordo com os estudos dos últimos anos, tem um nível Portugal de expectativa de urbanização muito superior às necessidades que Portugal tem. Há quem aponte para números nos 30 milhões, uma população que devia ser de 30 milhões de habitantes para o nível de pressão de urbanização que está muitas vezes identificada nestes terrenos expectantes e, portanto, temos de combater o alargamento desta ideia de progressiva urbanização. Mas, por outro lado, temos de combater esta fragmentação de regras e a sobreposição de planos. Esta é uma matéria que tem vindo a ser trabalhada.

 

Não quero obviamente numa iniciativa partidária estar a fazer nenhum anúncio, de modo algum, mas obviamente esta matéria de um novo modelo de ordenamento do território é uma matéria central combatendo a sobreposição de planos. Esta incongruência de planos de municípios vizinhos e uma incapacidade de o cidadão poder percepcionar as regras do ordenamento do território. É necessário que o cidadão tenha capacidade para olhar para um plano e ter nele todas as regras de pode conhecer e não ser obrigatório que um cidadão que vive em Castelo de Vide conheça o PDM de Castelo de Vide, conheça o plano de ordenamento da área protegida deste parque natural e conheça o plano sectorial da Rede Natura, e se fosse no Litoral, o plano de ordenamento da orla costeira, e na eventualidade de existir aqui algum plano-pormenor também o plano de urbanização. Isto é, temos de encontrar uma forma de consolidarmos os regimes de ordenamento de território de forma a aumentar o grau de comunicação entre os planos e os cidadãos, entre os planos e as empresas, para não só protegermos os bens públicos, mas também criar condições para a competitividade da Economia.

No fundo, é termos territórios mais resilientes, uma maior coesão territorial e cidades mais requalificadas.

 

O quinto desafio é o das alterações climáticas. Já falei bastante neste desafio. Não vos quero maçar, mas objectivamente esta é uma das áreas em que Portugal tem riscos elevados mas também Portugal e Espanha são dos países da UE com mais riscos associados à mudança climática. Esta é também uma preocupação que naturalmente devemos ter com o tema dos incêndios. Há países em que o clima pode ajudar. Obviamente o ordenamento florestal, a prevenção, a protecção precoce, são políticas essenciais no combate e prevenção dos fogos florestais. Mas Portugal tem um risco adicional para que gostava de chamar a atenção que é relacionado com a mudança climática. Portanto, devemos ter aqui um esforço redobrado na atenção a dar à floresta, à biodiversidade e aos recursos hídricos. Porque de acordo com os estudos que existem das Nações Unidas, da Agência Europeia do Ambiente, mas também de cientistas portuguesas, o risco de em Portugal e Espanha e no Sul da Europa em geral, mas em especial em Portugal e Espanha, termos fenómenos agravados de seca severa e extrema nos próximos dez anos é muito superior ao resto da Europa.

Como também está previsto que o aumento da temperatura em Portugal e Espanha seja o dobro do aumento da temperatura no resto da Europa. Logo, Portugal não pode deixar de olhar para as alterações climáticas como uma área em que é necessário agir como todos os outros países na redução das emissões, nas tecnologias limpas, na aposta nas renováveis, na eficiência energética, na mobilidade sustentável, e tudo o que seja reduzirmos as emissões, mas também temos de ter uma atenção redobrada na adaptação às alterações climáticas.

 

Há níveis de mudança climática que já são inexoráveis. Mesmo que hoje decidíssemos apagar todas as luzes, parar toda a indústria, todo o sector de transportes, ainda assim a mudança climática, porque o planeta tem resiliência que é como um camião muito pesado em que accionamos o travão e ele tem uma inércia em que a travagem não é imediata, o mesmo acontece com o clima. Mesmo que mudássemos de vida na Europa, no Mundo e em Portugal hoje, ainda assim há um nível da mudança climática de fenómenos extremos de agravamento da seca, de aumento da temperatura, de subida do nível médio do mar, de destruição do Litoral, de alargamento de riscos ligados à saúde, que são inexoráveis na próxima década.

 

Gostava, naturalmente, de mobilizar a vossa geração para este desafio, não só da mitigação, da redução das emissões, mas também de adaptação às alterações climáticas. Temos de nos habituar a não só combater a mudança climática mas também a conviver com um clima que é mais difícil nos próximos dez a 20 anos. Isso obviamente cria uma pressão maior sobre a água, a floresta e a biodiversidade. Dizia também que, por outro lado, Portugal tem também grandes vantagens nesta área, porque se existe uma tendência internacional - e existe - para combate das alterações climáticas através do Protocolo de Quioto, através do sistema de comércio de emissões, através de sucessores do Protocolo de Quioto, que levará a roteiros de baixo carbono, a uma descarbonização do nosso modelo de desenvolvimento, isso vai carecer de tecnologias, de engenharia, instituições e empresas. Ora, Portugal tem nessa área grandes potencialidades de internacionalização. Portugal foi em muitas destas áreas um verdadeiro laboratório, e continua a ser e deverá continuar a ser, de ideias, de tecnologias, de engenharia, de infraestruturas, facilmente internacionalizável, gerando benefício económico para os portugueses e para as populações que vivem nesses países.

Portanto, as alterações climáticas e a Economia Verde devem ser também encaradas como factor de crescimento.

 

Na área da Energia já me referi de um modo bastante abrangente a esta área e claro que a aposta nos nossos recursos endógenos é prioritária. Não falo apenas de energias renováveis, mas também dos nossos recursos geológicos e mineiros, a eficiência energética, mas também as condições de concorrência, de competitividade, de integração cada vez maior entre Portugal e Espanha quanto às regras da política energética e uma maior integração das redes europeias de energia. Portugal e Espanha são fortemente penalizados por viverem numa ilha energética. Como sabem, existe um estrangulamento nas ligações energéticas nos Pirinéus, entre a Península Ibérica e o resto da Europa. Logo, é prioritário para a nossa política energética que a política europeia de energia possa gerar condições de maior integração dos mercados de gás e de electricidade, mas também de maior integração de infraestruturas - essa é uma condição indispensável para Portugal não sofrer de uma ultraperiferia na área da Energia.

 

Por outro lado, é necessário melhorar as condições de sustentabilidade financeira. O actual Governo tem vindo a fazer um grande esforço no combate a algumas rendas excessivas. Se não tivesse existido esse combate, as tarifas de electricidade teriam aumentado este ano em cerca de 13% e portanto o Governo conseguiu nestes dois anos reduzir alguns de interesse geral do sistema importante para os consumidores, mas é importante também para criar condições de maior concorrência no sector energético à escala nacional.

 

Mas eu gostava, uma vez que se fala tanto em rendas e de energia, de sublinhar sempre a ideia de que há uma renda de energia que raramente referimos que é a nossa renda energética relacionada com o exterior. Porque não podemos continuar a confundir energia com electricidade. A electricidade representa apenas 20% do consumo final de energia. Em Portugal, muitas vezes, estamos a falar de energia como se fosse apenas electricidade. Apenas 20% do consumo final de energia é feito através de electricidade. Nós temos uma dependência energética do exterior de 80%, 55% do petróleo, oito a dez mil milhões de euros vão todos os anos para o exterior relacionados com esta dependência, com esta renda.

 

Uma vez que se fala muitas vezes nas rendas de energia, gostava que tivéssemos sempre de uma forma implícita este desafio do combate à dependência energética do exterior e isso faz-se essencialmente por cada um de nós. Cada um de nós deve ser visto como um agente da mudança do comportamento no consumo de energia na medida em que nós utilizamos mais energia do que os outros cidadãos europeus. As cidades e a mobilidade sustentável e a reabilitação urbana devem ser vistos de uma forma integrada, mais que a expansão urbana, a requalificação e regeneração devem ser encaradas de uma forma prioritária e o arrendamento, a reforma que foi feita para o arrendamento urbano, cria condições também para que a reabilitação urbana não apenas para efeitos de comercialização mas também para efeitos de arrendamento possa ser viabilizada, em especial para os mais jovens.

 

Outro desafio que identifico é o da Economia Verde num contexto que gostava de associar também a uma alteração dos padrões de consumo e de produção de eco-inovação, de rotulagem, de compras públicas ecológicas, mas também de reforma fiscal. Este é um tema, como sabem, que há muito tempo venho defendendo a necessidade de olharmos para a fiscalidade de uma forma mais inteligente e mais alinhada com o crescimento, e não nos limitarmos a uma dicotomia de mais impostos/menos impostos. Obviamente todos queremos menos impostos e este Governo tem dito, aliás de uma forma muito clara, que a capacidade para reduzirmos impostos está obviamente dependente de reduzirmos a despesa pública e essa capacidade da redução da despesa pública está directamente ligada com a capacidade de redefinirmos as funções do Estado. Mas mais do que esta dicotomia de mais impostos/menos impostos, existe outra dimensão da fiscalidade que é a dos pesos relativos da fiscalidade: fiscalidade sobre o trabalho, sobre as empresas e da fiscalidade ambiental.

 

Naturalmente, devemos olhar com interesse redobrado para as recomendações que a OCDE produziu no relatório sobre a reforma do Estado há três meses mas também o relatório que a Comissão Europeia e Agência Europeia do Ambiente produziu há meia dúzia de meses sobre fiscalidade ambiental energética, de utilização de alguns instrumentos de fiscalidade ambiental energética sobre o trabalho e sobre o rendimento das empresas. Esta é uma área que naturalmente devemos olhar como estando alinhada com o crescimento e com a eficiência dos recursos.

 

Finalmente - e estou a concluir em um minuto -, o tema da reforma do Estado. Coloquei este tema deliberadamente como uma área prioritária também para a energia e ordenamento do território. A reforma do Estado justifica-se por razões orçamentais. Nós temos de reduzir a despesa pública. Este Governo iniciou funções com 51% do PIB, neste momento já abaixo dos 48% dos PIB, sendo que o objectivo é de reduzir este peso da despesa pública do PIB para níveis inferiores no médio prazo a 40%.

Esse é o objectivo que está identificado, como sabem, na lei do enquadramento orçamental, no tratado de estabilidade, é conseguirmos reduzir a nossa despesa pública para níveis próximos dos 40%. Logo, a reforma do Estado tem um objectivo orçamental, mas a reforma do Estado tem também um objectivo de equidade.

 

É necessário melhorar os níveis de equidade. O Primeiro-Ministro disse já por várias vezes que a forma como redistribuímos a riqueza não tem verificado ainda os níveis de equidade que são indispensáveis e o estudo que o FMI produziu aponta para a circunstância de os 20% mais ricos receberem de volta 33% da redistribuição da riqueza e os 20% dos mais pobres apenas 13% dessa redistribuição da riqueza. Logo, a reforma de Estado também se justifica para melhorar os níveis de equidade e de justiça social.

Finalmente, a reforma do Estado é indispensável para melhorar a qualidade do serviço prestado. Quando o Estado pesa 50% do PIB não está aí apenas um problema orçamental, reside aí também um problema de natureza conceptual da relação do Estado com o cidadão quanto à necessidade de valorização da criatividade, da iniciativa individual, da concorrência e do mérito.

 

Ora, nenhuma área de política sectorial deve estar imune a este debate sobre a reforma do Estado. Costumo dizer que a reforma do Estado muitas vezes padece de um síndroma semelhante ao das políticas ambientais, que é o síndroma nimby. Quando se trata de um projecto visto muitas vezes como exigente e difícil toda a gente o defende mas surge de imediato um fenómeno que é "não no meu jardim”, ou "not in my backyard”. Isso é um fenómeno muito comum na área do Ambiente, em que toda a gente defende o tratamento de resíduos mas ninguém quer o tratamento de resíduos à porta, toda a gente defende estações de tratamento de águas residuais mas ninguém as quer à porta. É um fenómeno também que não deve surgir na área da reforma do Estado.

 

Portanto, assumo na área do Ambiente e do Ordenamento do Território e da Energia também a necessidade como os responsáveis por outras pastas sectoriais, de identificarmos as actividades que devem ser cumpridas de uma forma essencial pelo Estado e as actividades que podem ser contratualizadas, realizadas em parcerias, concessionadas, num contexto que garanta a qualidade dos serviços prestados, independentemente do protagonista dessa prestação de serviços. Portanto, este desafio da reforma de Estado, que eu deliberadamente coloquei na lista de prioridades ambientais e energéticas deve ser vista também como um factor de crescimento e emprego.

 

Fico naturalmente agora à vossa disposição para a lista de perguntas que sei que costuma ser bastante exigente durante uma hora e meia. Muito obrigado.

 

[APLAUSOS]

 
Hugo Soares

Cumpre-me agora agradecer ao Eng.º Jorge Moreira da Silva pela excelente aula que aqui nos trouxe. Espero que tenha sido do vosso agrado e que vos tenha estimulado a curiosidade. Agora vamos ver se estimulou ou não, apelando à vossa participação.

 

A primeira pergunta é do grupo Cinzento, é o José Lopes e para o efeito dava-lhe então a palavra.

 
José Lopes

Caro senhor Ministro, antes de mais, o grupo Cinzento gostaria de o felicitar por esta missão que lhe foi confiada. Com a sua nomeação todo o trabalho meritório desenvolvido pela plataforma para o crescimento sustentável parece ter agora uma possibilidade de materialização e de passagem à prática.

Reparamos com muita satisfação no que concerne ao ordenamento do território que existe um alinhamento que defende a plataforma e o que tem vindo a ser defendido pela senhora Ministra da Agricultura, por exemplo, a desburocratização dos licenciamentos ambientais, urbanísticos e de actividade, a necessidade de concentração do PDM das directrizes sobre uso, ocupação e transformação do solo, entre outros.

 

Tendo em conta este enquadramento, gostaríamos perguntar ao senhor Ministro o que poderemos esperar deste novo Ministério. Existem condições para concretizar as boas ideias existentes e desenvolver a plataforma? O que poderemos esperar da sua actuação? Muito obrigado.

 
Jorge Moreira da Silva

Muito obrigado pela sua questão. De facto esta é uma das áreas que tem padecido de um certo paradoxo relacionado com a política europeia. Enquanto que na área do Ambiente, para lá obviamente da capacidade de gestão e iniciativa política dos vários governos, as directivas comunitárias traduzem um padrão que vai sendo imposto aos países da União Europeia nos vários sectores: na Água, na Energia, no Ambiente, na Biodiversidade.

 

Portanto, na área do Ambiente existe um consenso das políticas comunitárias e isso determina muito a política nacional. Costumo dizer que na área do Ambiente o Parlamento Europeu tem, na medida em que tem co-decisão, um papel tão relevante e em alguns casos até mais do que as políticas ambientais que são desenvolvidas pelos governos na medida em que muitas dessas políticas decorrem da transposição de directivas comunitárias.

 

Estando aqui o deputado Carlos Coelho e estando aqui também uma geração que está interessada na política, gostava de apelar naturalmente à vossa atenção quando à importância que o Parlamento Europeu tem e a necessidade que se tem de "não chegarmos demasiado atrasados à bola” - usando a gíria do ténis. As políticas ambientais são políticas que começam com livros brancos, livros verdes, directivas comunitárias, que são discutidas no Parlamento Europeu primeiro e só depois chegam ao Conselho Europeu. Logo, é importante que Portugal olhe cada vez mais na área do ambiente para a cadeia de produção legislativa e para o que vai sendo produzido pela Comissão Europeia. Mas isso não acontece no ordenamento do território. A própria Constituição assim prevê, que o ordenamento do território é uma política em que os municípios têm um papel central e a soberania nacional tem também um papel fundamental no contexto europeu.

 

Portanto, a política de ordenamento do território e de ocupação do solo são políticas que dependem em exclusivo de legislação nacional, com uma fortíssima parceria entre Estado central e autarquias locais. O retrato que fiz há pouco aponta para esta sobreposição de planos e para esta dificuldade de percepção dos cidadãos quanto às regras que os vinculam no ordenamento do território. O PDM deve ser cada vez mais visto como o único instrumento que o cidadão deve conhecer. O cidadão não deve ser obrigado, como uma empresa, a conhecer mais que o PDM, mas o PDM tem de evoluir para outra natureza.

 

O PDM tem de ser capaz de correlacionar modelos de desenvolvimento de municípios da mesma região e por outro lado terá de absorver as regras, verter nele as regras, dos programas especiais da Rede Natura, dos planos especiais da área protegida e da orça costeira. No fundo, este conjunto muito alargado de planos e esta arquitectura devem ser reformulados no sentido em que o PDM tenha um carácter mais estratégico, mais vinculativo e mais próximo dos cidadãos. Essa é a reforma essencial. Se me pergunta qual é a reforma essencial a fazer na área do ordenamento do território é precisamente o de consolidar, coordenar, articular, integrar e gerar uma maior capacidade de comunicação junto dos cidadãos e juntos das empresas.

 

Porquê? Porque na área do Ordenamento do Território conjugam-se dois fenómenos muitas vezes vistos, dependendo da chave de leitura de cada um, de uma forma incongruente. Muitas pessoas, muitas empresas, muitos estudos, apontam, seja na área da Justiça, seja na área do Ordenamento do Território, como sectores que são responsáveis pela perda de competitividade. Portanto, quando se trata de escolher os culpados surge sempre um estudo ou alguém que coloca o ordenamento do território como um entrave ao crescimento, ao desenvolvimento, à constituição de uma empresa. Mas há o reverso da medalha que é, se não fosse o ordenamento do território, apesar dos defeitos que muitas vezes nele existem, muita da degradação que foi realizada em diversas áreas do nosso país, designadamente na orla costeira, teriam sido provavelmente agravadas.

 

Logo, julgo que nesta área do Ordenamento do Território se devem consolidar, ou compatibilizar, duas dimensões: protecção dos bens públicos, do interesse e bem comuns; o solo tem uma função social, mesmo quando se trata de propriedade privada e a Constituição assim o prevê. Também a Constituição prevê que mesmo no caso da propriedade privada existe uma função social. O solo tem uma dimensão no contexto intergeracional. Mas por outro lado é necessário também que a liberdade de iniciativa, a competitividade e a criação de emprego possam ser vistas também como um factor importante nas políticas de ordenamento de território.

 

Portanto, para concordar com a sua intervenção e respondendo à sua questão, esta é uma questão essencial. Juntaria aqui, se me permite, o tema do Interior. A desertificação do Interior, ou o despovoamento, é uma matéria que não se resolve apenas com o ordenamento do território mas objectivamente um ordenamento do território que não assuma a resiliência do território - e estamos num município que tem esse problema - mas também o factor da qualidade de vida nas cidades como central, é um ordenamento do território que estaria apenas orientado para um certo juridismo da política pública. Portanto, o ordenamento do território não é apenas uma mera definição de regras de natureza jurídica, há um factor estratégico do território: o território tem valor económico, pode gerar competitividade, deve gerar coesão e o território é fundamental num contexto de solidariedade com as próximas gerações.

Esta é a reforma que penso ser fundamental ser realizada.

 
Hugo Soares
Obrigado, Eng.º Jorge Moreira da Silva. Tem agora a palavra o Francisco do grupo Bege.
 
Francisco Afonso

Bom dia a todos. Começo por cumprimentar o senhor Ministro, senhor Eng.º Jorge Moreira da Silva, agradecendo desde já a sua presença.

 

A energia eólica custa ao Estado cerca de 97 euros por MW/h, enquanto a energia em mercado não-renovável custa cerca de 43 euros o MW/h. Tendo em conta que o vento é um recurso natural e renovável e considerando este valor excessivo, que medidas podem vir a ser tomadas com o intuito de reduzir o preço pago pelas energias renováveis?

 
Jorge Moreira da Silva

Muito obrigado. Como imagina, não vou fazer aqui nenhum anúncio, mas em qualquer caso gostava de agradecer a pergunta e corrigir um dado que utilizou: esse valor para a energia eólica é um valor anterior à reforma que foi feita para os novos licenciamentos, num Governo aliás em que participei, em 2005, e que já baixou consideravelmente o valor pago aos parques eólicos. Os novos parques, aqueles que foram licenciados depois de 2005 têm uma remuneração que está pouco acima dos 70 euros e hoje se o CO2tivesse a cotação que estava prevista no mercado - e só não tem porque houve uma crise económica que baixou, no fundo, a escassez das licenças de emissão, mas com as medidas comunitárias que estão previstas vai voltar a aumentar esta cotação do carbono - a cotação do carbono coloca já as energias eólicas em mercado muito mais competitivo do que por exemplo o carvão.

 

Portanto, hoje existe, depois da curva de maturidade tecnológica das energias renováveis, uma remuneração que já as coloca num regime de competitividade com outras fileiras energéticas. Por que julgo que utilizou esse valor? Porque muitos dos adversários das energias renováveis continuam nos jornais, ou em estudos que vão divulgando, a utilizar dados sobre a remuneração das renováveis, que já estão corrigidos desde 2005.

Em qualquer caso, não fujo à questão que colocou aqui. Temos de apostar nas renováveis, mas é necessário que essa aposta seja feita num quadro de grande concorrência e de competitividade e distinguindo as curvas de maturidade das tecnologias.

 

Não podemos deixar de remunerar com um valor mais elevado tecnologias que são menos maduras do ponto de vista tecnológico, mas não devemos massificar essas tecnologias. Isto é, o fotovoltaico tem uma curva de aprendizagem pela frente maior do que a energia eólica. A energia eólica já é uma aposta consolidada, os custos são substancialmente inferiores aos de há 5, ou 10, ou 20 anos. Os da energia fotovoltaica, ou seja a partir do sol, também são inferiores ao que eram há 5, ou 10, ou 20 anos, ainda muito superiores aos da energia eólica.

Logo, não faz sentido fazermos uma aposta no fotovoltaico em termos de dimensão, tão grande como no eólico, na medida em que estamos com curvas de aprendizagem diferentes. Por outro lado, o fotovoltaico está hoje do ponto de vista da maturidade com uma curva mais desenvolvida do que a energia das ondas ou a energia das marés que têm ainda um custo superior.

 

O que temos de fazer é uma análise custo/benefício, tendo um cabaz com um mix energético que integre várias energias, várias possibilidades de produção, não colocando todos os ovos no mesmo cesto mas remunerando essas fontes de energia de acordo com a curva de aprendizagem que ainda têm e dando a dimensão de MW a cada sector pois isso permite compatibilizar três dimensões que não referi há pouco porque não podia fazer-vos perder mais tempo. A política energética tem de cumprir três objectivos: segurança de abastecimento, competitividade e sustentabilidade. A aposta nas renováveis tem a vantagem de reduzir a nossa dependência ao exterior, tem a vantagem de valorizar cursos endógenos, de valorizar tecnologia própria, mas objectivamente não pode ser realizada sem uma avaliação custo/benefício.

Portanto, é necessário, como este Governo tem feito nos últimos dois anos, fazer uma ponderação da remuneração a cada tecnologia, mas gostava também de alertar para os custos associados à não-aposta nas renováveis.

 

O custo das renováveis é conhecido, os benefícios e a importância da aposta nas renováveis também é conhecida, mas muitas vezes não fazemos as contas aos custos associados ou que incorreríamos na ausência das renováveis. Se não tivéssemos renováveis teríamos emissões de CO2mais elevadas, o CO2tem um preço no mercado, logo haveria um prejuízo económico para Portugal decorrente da não-aposta nas renováveis. Por outro lado a aposta das renováveis tem benefícios do ponto de vista tecnológico e em termos de criação de novas actividades, novas empresas e novos empregos. Logo, a não-aposta nas renováveis daria origem a um investimento nosso, do contribuinte, na política de inovação nos países que produzem a partir das renováveis. Porque não tenham dúvidas que objectivamente quem aposta nas renováveis, não apenas como bom utilizador, mas como produtor de tecnologia própria, terá capacidade de internacionalização. Por isso, julgo que é importante que Portugal possa fazer esta aposta nas renováveis mas com uma avaliação custo/benefício de cada tipologia de renovável e possa, por outro lado, avançar mais na cadeia de valor, sendo não apenas um bom utilizador de tecnologias renováveis, passando uma fase em que se torna num bom tecnólogo, um bom produtor de tecnologias renováveis que possam ser exportáveis.

 
Hugo Soares
Muito obrigado. Grupo Rosa, João Carlos Fernandes.
 
João Carlos Fernandes

Antes de mais, queria saudar o excelentíssimo senhor Ministro Jorge Moreira da Silva, o nosso reitor, a restante mesa e todos os meios de Comunicação Social e participantes.

 

Inicialmente, queria fazer uma exposição de alguns pequenos factores, vou abordar a temática da Energia numa óptica de energias limpas e a sua finitude. Portugal é um dos países da Europa com um número médio de horas solares anual mais elevado. No que diz respeito a energia eólica, Portugal possui uma orografia própria, uma localização geoestratégica e em termos de geografia física - a cordilheira central, a proximidade ao mar e outros factores - possui uma mais-valia para o aproveitamento desta energia.

 

No que está ligado à energia do mar, como o senhor Ministro já referiu, Portugal tem uma zona económica exclusiva, é o 11º com a zona exclusiva maior, possui uma grande linha costeira e além disso ainda não sabemos o que podemos encontrar no solo. Depois, no que diz respeito a solos aráveis e produção de biocombustíveis, o nosso território em mais de dois terços é de floresta e solos aráveis e temos um grande potencial nesse ponto de vista.

 

No que diz respeito a centrais de biomassa, estas produzem facilmente mais-valia na energia e ajudam a fazer a gestão do espaço florestal e a sua manutenção, ajudando a diminuir a disponibilidade de combustíveis no solo que depois vão ter efeito na propagação e progressão dos incêndios florestais. Desta forma diminuem-se assim os incêndios florestais e aumenta-se o contributo para o PIB da nossa floresta. No que diz respeito à rede hidrográfica, temos vários vales encaixados em que a possibilidade de construir albufeiras e barragens permite-nos tirar maior eficiência.

 

Agora, tendo em conta alguns destes princípios, como é que o quadro estratégico comum 2014-2020 e os fundos estruturais podem ser articulados para servirem de fonte de apoio e de financiamento a projectos que visem a produção de energia, diminuindo assim a nossa dependência energética externa, bem como o aumento de produção de energias limpas, contudo não descurando a questão da investigação científica e o casamento entre estes factores e tendo uma óptica de sustentabilidade?

Obrigado.

 
Jorge Moreira da Silva

Muito obrigado pela questão e pela apresentação, porque me facilita a vida na medida em que apresentou a nossa lista de riquezas na área da energia e é raro o país que consegue ter ummixenergético com uma lista tão longa. Portugal tem de facto a vantagem de nos recursos energéticos endógenos renováveis não ter apenas bom potencial hídrico, mas ter potencial solar, eólico, as ondas e marés, a biomassa, e é importante que se olhem para todas estas tecnologias.

 

Quando estava na Nações Unidas costumava, nas apresentações que fazia, utilizar uma curva de custo/benefício das tecnologias e costumava dizer que era tão errado desperdiçarmos no curto prazo a eficiência energética como seria errado estar a antecipar para hoje tecnologias renováveis que ainda não estão ainda numa fase de maturidade suficiente. Julgo que a ideia demixenergético, em que o peso de cada uma destas fileiras está relacionada com a sua maturidade e a remuneração que é dada ao KW/h produzido em cada uma destas fileiras está relacionada também com a maturidade tecnológica, dá uma boa ideia de diferença entre projectos de investigação, de demonstração e de massificação ou comercialização.

 

Há projectos de energias renováveis que devem ser encarados numa lógica de investigação e desenvolvimento e Portugal não deve deixar de tirar partido de laboratórios do Estado que tem, como o Laboratório Nacional de Geologia e Biologia, de laboratórios associados, de unidades de investigação notáveis na universidade e politécnico portugueses, para apostar nesse desenvolvimento de novas energias renováveis. Mas depois há outras tecnologias renováveis que já estão numa fase de demonstração, não estão numa fase de comercialização no mercado, não consegue ainda ombrear com o gás natural ou com o carvão e aí é necessário dar um benefício económico maior para que elas possam melhorar na sua curva de aprendizagem. Mas nesse caso, estando numa fase de demonstração, não devemos exagerar nos MW atribuídos a essa área.

 

Depois há outras energias renováveis que estão hoje, como disse há pouco, muito desenvolvidas e em que a tarifa que é dada a essas tecnologias hoje já é substancialmente inferior à que era dada há uns anos e estão hoje em condições de concorrência em mercado. A questão do financiamento também tem a ver com isso. A sua pergunta foi sobre financiamento. Os projectos de investigação devem ser financiados via política científica, programas operacionais, orçamentos de Estado, por aí adiante. As tecnologias energéticas que estão em fase de comercialização e de desenvolvimento devem ser tratadas num lógica de custo a reconhecer na tarifa porque essa é uma forma também de aumentar a concorrência, a competitividade, de criar condições para o cidadão comparar essas tecnologias, fazendo um certobenchmarkinginternacional.

 

Mas julgo que é muito importante não esquecer, quando se fala de Energia, o tema dos geológicos e mineiros. Não queria que limitássemos a política energética à electricidade, nem a electricidade às renováveis. Em regra este é um dos equívocos que em Portugal se vai desenvolvendo há mais de uma década. Temos vindo a tratar apenas de 20% de energia, que é a electricidade, no debate público e dentro da electricidade muitas vezes, a nossa atenção, dos Media, dos protagonistas, dos políticos, está muitas vezes concentrada apenas numa parte da electricidade que são as renováveis. Estas devem ser obviamente desenvolvidas, é uma aposta importante, deve ser aperfeiçoada, mas há outra vida na política energética para lá da electricidade. Isso está relacionado com a nossa redução da dependência energética do exterior como eu disse há pouco, a nossa adicção ao petróleo, a nossa adicção aos combustíveis fósseis, deve ser limitada. Mas também se descura muitas vezes a mais renovável, a mais verde, das energias que é a poupança energética. A mais verde das energias são as políticas de consumo eficiente de energia.

 

Todos nós temos uma margem de redução de nosso consumo energético. Conto sempre uma história que contava quando estava nas Nações Unidas em vários sítios, mas também já contei aqui nesta Universidade de Verão várias vezes. Quando ocorreu o apagão na Califórnia há uns anos, recordam-se que nos Estados Unidos houve um problema de abastecimento na electricidade, houve uma sobrecarga, um aumento de consumo numa determinada zona e a rede falhou. Houve um apagão na Califórnia e o Governo da Califórnia aplicou um imposto sobre o consumo de energia, não me recordo do valor exacto mas estava entre os 20% e os 30%. Nos meses seguintes e nos anos seguintes, o consumo energético caiu quase num valor correspondente entre 20% e 30%.

 

Porquê? Porque houve um sinal de preço que foi dado, que levou as pessoas a reorientar os seus comportamentos e essa reorientação de comportamentos nas casas, nos edifícios públicos, no sector público mas também nas empresas, não deu origem a uma perda de qualidade de vida, mas sim a uma aprendizagem de um consumo de energia mais eficiente. Isto é, as pessoas aprenderam a conviver com a energia de uma forma mais judiciosa, mais cuidadosa.

 

Costumo sempre dar este exemplo para explicar que nós temos - eu tenho, o meu caro amigo tem - nas nossas escolas, nas nossas empresas, nos nossos edifícios, na nossa casa, capacidade para reduzir o nosso consumo de energia de uma forma mais eficiente. Por que digo que esta é a mais verde e mais inteligente das energias? Porque isso baixa o nosso consumo, baixando a nossa factura, e tem um benefício ambiental porque a energia é um dos factores ambientais negativos e isso tem um benefício do ponto de vista da nossa conta pública pois metade da nossa dependência financeira exterior é de energia.

 

Temos aqui 50% do nosso problema de dependência de energia do exterior que está na energia. Temos de olhar para a energia com um forte sentido estratégico. Por isso tenho muitas vezes alguma frustração e perplexidade com a circunstância de em Portugal persistirmos no erro de confundirmos energia com electricidade e de consistentemente e persistentemente faltarmos ao debate mais estratégico que é a redução da nossa dependência energética do exterior e para essa redução da dependência energética do exterior o factor principal é eficiência energética no consumo, em casa, nos organismos públicos e nas empresas.

 
Hugo Soares
Muito obrigado. Grupo Encarnado, Helena Grangeia.
 
Helena Bigares Grangeia

Bom dia, Eng.º Jorge Moreira da Silva, obrigada pelos seus esclarecimentos, antes de mais.

Em relação à fiscalidade ambiental e energética, fazer aqui um contrabalanço com os apoios e incentivos à eficiência energética. Ou seja, acha que enveredar efectivamente por uma política de fiscalidade terá um papel preponderante no crescimento e transição para uma Economia Verde ou estaremos nós, se calhar, a exigir um pouco mais das empresas e a contribuir para que possam em tempos de crise ser mais facilmente asfixiadas já que eventualmente ainda não estaremos num patamar ideal de incentivos à actividade verde das mesmas?

 

Como olha para esta situação: fiscalidade versus apoios; gostávamos de ouvir um pouco a sua opinião sobre essa questão.

 
Jorge Moreira da Silva

Muito obrigado pela questão. Esta é uma das questões que acho que se deve mobilizar mais nesse contexto pós-Troika. A reforma fiscal que não é apenas o IRC, mas uma que envolva outras tipologias de tributação, incluindo a tributação ambiental. Gostava de desenvolver um bocadinho mais aquilo que disse há pouco. Sabia que esta era uma das questões que iria ser colocada e portanto deixei duas ou três coisas para dizer nesta resposta.

 

A Agência Europeia do Ambiente no tal estudo que produziu para Portugal fez uma lista de todos os impostos ambientais que são aplicados noutros países, não em simultâneo, nenhum país aplica todos estes impostos ambientais, mas fez uma lista desses impostos e fez uma projecção para Portugal da possibilidade de utilizar os impostos sobre ambiente e energia. Chegou à conclusão que existe um potencial de aumento da carga fiscal por via ambiental possibilitando uma redução da carga fiscal na mesma proporção na área dos impostos sobre o trabalho e sobre os rendimentos das empresas, de dois mil milhões de euros em 2013 e de três mil milhões de euros em 2014.

 

Claro que nenhum país aplica todos estes impostos, mas este estudo teve um grande benefício. Aliás, foi compatível com um estudo semelhante que a OCDE fez a pedido de Portugal sobre a reforma do Estado. Que é a circunstância de, não através do aumento de impostos que deu origem na área ambiental a aumento na carga fiscal - essa, como sabem, não é uma opção que se possa suportar, que o país possa admitir e aliás é uma matéria que o Governo tem vindo a recusar e por isso pretende um cumprimento de metas orçamentais e uma redução da despesa pública através da reforma do Estado e não através do aumento da carga fiscal -, mas mesmo num quadro de neutralidade fiscal. Uma reforma fiscal mais abrangente que envolva IRC e IRS pode beneficiar destes estudos ligados à fiscalidade ambiental porque muitas vezes num quadro de neutralidade fiscal a mera alteração de peso relativo da fiscalidade pode valorizar o factor trabalho, desonerando; pode valorizar o factor da criação de riqueza nas empresas, desonerando; onerando alguns comportamentos ambientais mais negativos sobre a degradação dos recursos.

 

Estou a falar objectivamente, a título pessoal obviamente julgo que não sou cínico na medida em que não deixei de acreditar naquilo que acreditava pela circunstância de neste momento ter outras funções. Há muitos anos que defendo uma política fiscal que beneficie desta alteração de pesos relativos, mas por outro lado obviamente esta é uma matéria na qual neste momento não posso vincular com a minhas convicções pessoais de há muitos anos a política pública do Governo, na medida em que o Governo tem um programa de Governo, há um programa eleitoral.

 

A fiscalidade é matéria que tem política específica, mas julgo que estes estudos, estas análises e estebenchmarkinginternacional é relevante porque pode ser um factor de crescimento e de emprego. Isto é, a fiscalidade po ser vista como um factor de crescimento e emprego. Uma fiscalidade mais inteligente, que onere alguns comportamentos que são maus para o Ambiente, maus para os recursos, desonerando alguns comportamentos que são bons para o Ambiente, para a protecção dos recursos e para a criação de emprego, pode beneficiar do ponto de vista da consolidação orçamental, mas também do ponto de vista do crescimento e do emprego e da tal competitividade fiscal. Razão pela qual, como se recordam, numa Universidade de Verão, não a última, mas a de há dois anos, introduziu-se o tema da taxa de carbono como um tema que deveria ser à época ponderado como um factor de geração de um rendimento adicional que evitasse outras opções que acabaram por ser encontradas à época.

 
Hugo Soares
Obrigado. Grupo Amarelo, Filipe Santana Lopes.
 
Filipe Santana Lopes

Muito bom dia. Em primeiro lugar, em nome do grupo Amarelo gostaria de cumprimentar o Ministro Jorge Moreira da Silva, o reitor Carlos Coelho e todos os presentes.

Em segundo lugar, vou começar por citar uma fonte das Nações Unidas, a ISDE, que estima que cada dólar gasto na prevenção e mitigação a um desastre poderemos poupar sete dólares na resposta. Atendendo ao elevado número de incêndios em Portugal e dada a necessidade de se proceder à limpeza regular de inúmeros hectares de florestas existentes no nosso país, não seria razoável de admitir as necessidades da existência de mais incentivos tanto a nível governamental como até ao nível das autarquias locais para a produção energética de carbono neutro com base na biomassa, ajudando assim à automatização energética e à respectiva sustentabilidade?

Obrigado.

 
Carlos Coelho
O Filipe saudou simpaticamente a mesa toda e não foi o primeiro a fazê-lo. Vamos estar aqui uma semana toda e se tiver de agradecer todas as vezes que me agradecem a minha presença torna-se embaraçoso limitarmos a isso as nossas conversas. Portanto, ia propor que quem quisesse saudar a presença saúde apenas a presença do convidado, uma vez que todos os outros pertencem à casa.
 
Jorge Moreira da Silva

Muito obrigado. A sua questão tem muita actualidade, na medida em que estamos numa época muito exigente dos fogos florestais e em que a nossa atenção está naturalmente na mobilização de meios para o combate aos incêndios. No fundo, para a fase da contingência e não uma fase tão estratégica. Estamos numa fase contingência, a fase de combate é uma fase de contingência e essa é uma fase em que temos de ser naturalmente muito céleres no apoio às populações, na solidariedade com aqueles que têm combatido os fogos e que infelizmente muitas vezes, como foi o caso nesta noite, são dramaticamente afectados por estes acidentes. Mas uma outra dimensão que é de todos os dias, não é uma dimensão do Verão, é uma dimensão estratégica relacionada com a gestão florestal.

 

Não me quero, naturalmente, alongar muito sobre isto. Esta é uma área sectorial própria do Governo, o Ministério do Ambiente, Ordenamento do Território e Energia tem responsabilidades nas área protegidas, na prevenção dos fogos florestais e na gestão dos parques naturais, e o Ministério da Agricultura no que diz respeito às áreas florestais nas políticas florestais. Mas independentemente disso, não estamos aqui num exercício sectorial e não estou aqui obviamente num exercício governamental, estou aqui num exercício de natureza cívica com um grupo de jovens fortemente interessados em política. Portanto, não vou estar aqui a defender uma determinada questão sectorial.

 

No essencial, a sua questão mobiliza-nos para a questão estratégica que é a necessidade de na área das florestas podermos ter uma gestão e um ordenamento florestal mais eficiente e que possa superar um dos problemas de raíz que Portugal tem que é a fragmentação da propriedade florestal. Porque muitos países têm uma floresta tão ou mais rica que Portugal, mas têm um nível de concentração da propriedade que naturalmente facilita a gestão florestal. Portugal tem muita riqueza na floresta, 2% do PIB como eu disse, uma grande relevância florestal nas exportações, mas há uma fragmentação muito elevada da propriedade florestal. Quando isto acontece, seja da propriedade florestal, da propriedade agrícola, seja no que diz respeito a áreas protegidas, o factor decisivo é o ordenamento do território, ordenamento florestal.

 

As zonas de ordenamento florestal têm precisamente por objectivo esta gestão mais integrada da floresta que tem vários proprietários. Portanto, que a gestão da floresta não seja de uma forma casuística, propriedade a propriedade, mas que a própria gestão da floresta, o ordenamento da floresta de uma articulação entre os vários proprietários e as entidades públicas. Esse esforço de ordenamento e de gestão florestal é essencial, mas por outro lado há um esforço também relevante e que diz mais respeito às áreas protegidas que é essa capacidade de nos parques naturais compatibilizarmos a protecção da biodiversidade.

Há dificuldades óbvias de fazer intervenção sobre algumas áreas que são consideradas de forte protecção, mas a necessidade de por outro lado - dizia eu - compatibilizar a protecção dessas zonas mais protegidas com a presença de projectos de desenvolvimento do território, de agricultura biológica, de actividades económicas mesmo nas áreas protegidas.

 

Mas julgo que esta reflexão é uma reflexão que não nos deve mobilizar apenas nesta altura dos fogos, a prevenção é uma política pública que deve ser naturalmente concretizada durante todo o ano. Esta fase é de contingência e nela temos de estar todos fortemente mobilizados como tem estado o senhor Ministro da Administração Interna e todo o Governo para o combate dos fogos florestais, para o apoio às populações e para a solidariedade com as corporações de bombeiros, mas é necessário o tal esforço de gestão florestal.

 

Gostava de acrescentar apenas - sei que estou a ultrapassar o meu tempo - uma dimensão a este tema dos fogos florestais para lá da dimensão que há pouco referi dos riscos adicionais associados às alterações climáticas e de portanto, em Portugal nem o clima ajudar nesta dimensão, ao contrário de outros países. Há um efeito também dos incêndios florestais na mudança climática. Isto é, a mudança climática afecta fortemente os incêndios florestais, agrava fortemente o risco de incêndio, mas por outro lado os fogos florestais agravam a mudança climática pois são um dos factores de maior emissão de CO2.

 

Portanto há uma relação directa entre mudança climática e fogos florestais, o que aumenta ainda mais a necessidade de mobilizarmos a nossa atenção para a esta matéria. Gostava sinceramente que olhássemos para o tema das mudanças climáticas na área que é menos mediática, que é menos tecnológica, que está menos relacionada com produção e consumo de energia, mas que tem a ver com a nossa capacidade de nos adaptarmos a um clima mais exigente. Isto vai obrigar os poderes públicos no ordenamento do território, as empresas, as famílias, a criarem condições de adaptação e muitas vezes fazer investimento naquilo que é menos palpável, na protecção da floresta, na protecção da costa, são áreas que muitas vezes têm menos benefício imediato. São áreas que têm menos benefício tecnológico, fazem menos capas de jornais, mas que são essenciais para aumentar a nossa resiliência.

 

Temos de olhar para o território como uma área que está sob forte ameaça da mudança climática, na área dos recursos hídricos, no mar, na costa, na floresta. Temos de realizar políticas públicas de investimentos numa altura em que ainda por cima estes são mais escassos, que possam prevenir aquilo que dentro de 5, 10, 15, 20 anos poderá vir a acontecer e que só pode ser prevenido hoje e não nessa altura.

 
Hugo Soares
Mais uma vez, muito obrigado. Grupo Azul, Pedro Cunha.
 
Pedro Cunha

Bom dia, senhor Ministro. Antes de mais, o grupo Azul quer agradecer-lhe o tempo despendido nesta aula, que mais uma vez nos relembrou para a importância do Ambiente no desenvolvimento de um futuro sustentável para todos.

 

O nosso grupo gostaria de saber se o senhor Ministro entende que a micro-geração de energia renovável pode e deve assumir um papel fundamental na sustentabilidade energética nacional e se esta pode contribuir fortemente para a independência energética ao nível das comunidades locais.

 
Jorge Moreira da Silva

Obrigado. Este é um tema que ainda não tínhamos falado, que é a ideia do cidadão ser não apenas um consumidor de energia centralizada, mas também ser ele próprio produtor de energia. Esses projectos são relevantes. Portugal fez uma aposta na micro-geração, mas isso muitas vezes também serviu para que nos desviássemos de outras tecnologias.

 

Isto é, a micro-geração é relevante, concordo consigo e em especial associada às redes inteligentes de energia hoje, assmartgridscom a contagem inteligente, o despacho de energia mais flexível, no fundo uma internet da energia, onde a produção da energia possa ser não apenas centralizada mas também local, é um padrão para o futuro. Acho que é inexorável. O nosso amigo Carlos Pimenta fala neste tema com uma grande paixão. Quando olhamos para os próximos 20 ou 30 anos e tentamos identificar o que será o padrão de consumo e produção de energia percebe-se que a ideia de uma internet de energia em que cada um de nós possa também fazer parte da produção é inexorável.

 

O problema é o tempo e o custo associado a essa aposta. Uma vez mais, gostaria de identificar essa área como relevante mas não transformarmos uma área que sendo relevante e devendo merecer a nossa aposta, numa área que seja de tal forma considerada prioritária que nos afaste de outras tecnologias que estão mais ao nosso alcance no curto prazo a um preço mais baixo e que são menos apelativas do ponto de vista da sua apresentação pública. Estou a falar dos painéis solares para aquecimento de água.

 

A micro-geração remunera cada cidadão quando este vende electricidade à rede. Portanto, as pessoas produzem electricidade para consumo próprio, depois vendem à rede com preço superior ao que compram à rede, há aí um incentivo à micro-geração. Mas na comparação com a utilização também do sol para aquecimento da água, percebe-se claramente que hoje o custo associado a uma tecnologia e a outra é muito distinto e o nosso potencial para o aquecimento de água, substituindo ou a electricidade ou o gás natural, está mais ao nosso alcance.

 

Portanto este é mais um exemplo em que não quero obviamente estar a falar do passado, aliás, raramente faço isso do anterior Governo. Até porque acho que nas áreas do Ambiente e da Energia temos vindo a fazer apostas ao longo de várias décadas consistentes, em que cada Governo, obviamente alterando algumas matérias que vêm de trás, procura tirar partido da aprendizagem do que vem de trás. Mas neste caso a aposta na micro-geração afastou-nos de uma aposta que tinha sido mais fácil à época de ser realizada no aquecimento de água com tecnologias mais baratas. A micro-geração seguramente veio para ficar, é uma aposta para o futuro, mas atenção: não é eficiência energética, enquanto que a utilização de energia solar para aquecimento de água é eficiência energética.

 

Muitas vezes não olhamos para estas matérias numa perspectiva de consumo mas apenas na perspectiva do produtor de energia. A micro-geração não representa nada em termos de eficiência energética. Produzo electricidade para a rede e eventualmente se utilizar uma central a carvão estou a produzir em minha casa através do fotovoltaico, isso é importante, mas naquela ideia de fazer de cada um de nós factor da mudança, de redução de consumo de energia ou de utilização de recursos próprios para substituir a electricidade, aí há outras possibilidades como é o caso dos painéis para aquecimento de água doméstica.

 
Hugo Soares
Grupo Roxo, o Guilherme Duarte.
 
Guilherme Duarte

Muito bom dia. Excelentíssimo senhor Ministro Jorge Moreira da Silva queria em nome do grupo Roxo agradecer a sua presença aqui hoje e tão esclarecedora, e o seu trabalho meritoriamente reconhecido à frente da JSD, no PSD e desejar-lhe felicidades para o seu ministério.

 

Passando à pergunta do nosso grupo: tendo em conta que acabou de nos mostrar a correlação entre as pastas do Ambiente e da Energia que este Governo une num só ministério e cujos objectivos comuns são evidentes, que interesses ou especificidades antecipa ter de gerir ou que entraves prevê que desequilibrem este balanço procurado?


Obrigado.

 
Jorge Moreira da Silva

Muito obrigado. Esta área é obviamente como muitas áreas do Governo que têm uma dimensão económica muito forte. O Ambiente hoje é um factor crítico nas questões económicas e a área da Energia é por definição uma área que encaramos como económica. É óbvio que um dos grandes desafios que terei pela frente é esta necessidade de compatibilizar a protecção do bem comum, a solidariedade intergeracional, a garantia de que protegemos recursos que são relevantes para o planeta e a garantia de que as próximas gerações tenham o mesmo direito ao desenvolvimento e à satisfação das suas necessidades que a geração actual.

 

No fundo, que a utilização dos recursos não comprometa a capacidade das próximas gerações de terem acesso a esses recursos naturais. Esse é um factor essencial, mas compatibilizar esta protecção ambiental dos recursos naturais com a necessidade de, também no Ministério do Ambiente, Ordenamento do Território e Energia, assumir a função/objectivo que está atribuído a todo o Governo, que é o crescimento e o emprego.

 

Portanto, é necessário que este ministério seja visto como um que trata desta qualidade de vida, desta garantia, desta valorização e protecção, mas também como um ministério da Economia Verde, que procura e procurará que o crescimento nas outras áreas do Governo seja feito seguindo um padrão verde. Podendo-se seguir duas vias, uma eventualmente mais anacrónica, mais assente na degradação dos recursos, mais assente nas importações e nas utilizações de combustíveis fósseis, ou uma via de descarbonização, de utilização eficiente, de reciclagem, de valorização dos ecossistemas, que siga esta via de crescimento verde. Por outro lado, há umclusterde Economia Verde claramente identificado e que é necessário valorizar, seja atraindo investimento estrangeiro, seja internacionalizando este sector.

 

Portugal tem na área do Ambiente, das Águas, do Saneamento, dos Resíduos, das Tecnologias de Informação e Comunicação associadas à energia, na área das Energias Renováveis, do Petróleo, do Gás Natural, e dos recursos mineiros e geológicos, nas universidades e nas empresas, recursos que podem não só dar origem a uma transformação da actual carteira de actividades, como também dar origem a uma nova carteira de actividades e a uma nova economia, seja numa dimensão interna, seja numa dimensão internacional. Olho com muito entusiasmo para esta ideia de, por um lado, proteger, valorizar, assegurar, garantir, no que diz respeito a recursos naturais e a qualidade de vida e, por outro lado, fazer também desta área uma área de crescimento e emprego.

 

Se me perguntar quais são as áreas em que Portugal pode crescer e se me perguntar também quais são as áreas em que no Mundo se pode crescer, não é apenas em Portugal e a resposta vai parar de uma forma muito directa à Economia Verde. A Economia Verde tem todas as condições para ser a nova vaga da Economia. Depois das Tecnologias de Informação e Comunicação, da Biotecnologia, esta área é vista como uma área de forte crescimento internacional e sendo assim Portugal tem tudo para vencer nesta nova Economia.

E porque é que é uma área de forte crescimento internacional? Porque finalmente se alinharam as necessidades de combate à necessidade climática e de combate à pobreza extrema através da aposta no acesso à energia e no acesso a água potável.

 

Há duas dimensões que são estratégicas para o desenvolvimento sustentável e para o combate à pobreza extrema nos países em desenvolvimento: água e energia. Um milhão e 500 mil cidadãos não têm acesso a electricidade no Mundo, 3 mil milhões de cidadãos dependem, do ponto de vista energético, apenas da queima de madeira. Temos mil milhões de cidadãos sem acesso a água potável. Reparem na pobreza extrema no Mundo, gostava que nunca desligássemos o tema do Ambiente e da Energia da nossa obrigação de enquanto europeus, enquanto portugueses e cidadãos assumirmos esta obrigação de não só protegermos o planeta mas também fomentarmos condições de maior capacidade nos países em vias de desenvolvimento para que possam superar problemas de pobreza extrema.

 

Água e energia estão totalmente ligadas ao fenómeno da pobreza extrema. De repente, o Protocolo de Quioto, as medidas de financiamento ao acesso de energia, os indicadores do desenvolvimento do milénio, tudo isso se orienta para a necessidade de ter mais acesso a água e a energia. Como ainda por cima muitos destes países em vias de desenvolvimento estão hoje a crescer com níveis superiores a dois dígitos, se eu combinar aqui uma matriz que é: quais são as áreas em que temos mais apostas realizadas do ponto de vista de infraestruturas, mais apostas realizadas sob o ponto de vista da requalificação dos recursos humanos, mais apostas do ponto de vista do apetrechamento científico e tecnológico das instituições, onde temos mais recursos naturais e melhor posicionamento geoestratégico - se combinar estes factores de forma matricial chego rapidamente às áreas da Energia e do Ambiente.

 

Portanto, olho para este desafio da Economia Verde como um desafio de crescimento sustentável e julgo que isso está totalmente alinhado com as orientações deste Governo, em especial nesta nova fase. Muito obrigado.

 
Hugo Soares
João Diogo Carlos do grupo Laranja.
 
João Diogo Carlos
Bom dia. Obrigado pela sua presença, senhor Ministro. A nossa pergunta é sobre um tema que ainda não foi abordado. Queríamos saber a sua opinião sobre a energia nuclear e se sente que esta podia ser uma aposta no futuro.
Obrigado.
 
Jorge Moreira da Silva

A minha opinião é conhecida há muito tempo, não mudo de opinião, posso não poder vincular a essa opinião mas ela é conhecida há muito tempo. Do ponto de vista prático, essa opinião está totalmente articulada com a nossa situação e com a nossa estratégia em termos nacionais. A opção nuclear é uma opção que foi já há muito tempo ponderada, do ponto de vista cíclico o tema lá vai surgindo nas últimas décadas, mas tem sempre prevalecido a ideia de que o nuclear é uma opção XXL para um país tamanho S.

 

Portanto, a opção do nuclear, por causa da nossa necessidade de consumo de energia, torna mais rígida a nossa situação de despacho energético e de planeamento energético. Uma central nuclear ocuparia a grande parte da nossa necessidade de produção de energia, o que nos obrigaria sempre a ter uma segunda central ou umbackuppara o caso de haver algum problema.

Por outro lado, o tempo acabou por resolver esse problema, porque hoje já temos uma capacidade instalada através dos ciclos combinados de gás natural, renováveis, barragens, que supera essa capacidade adicional. Além disso, o nuclear tem riscos associados do ponto de vista da segurança e da gestão de resíduos, que ainda não estão plenamente resolvidos. Mas esta é uma matéria que, como repararam, desapareceu da discussão pública nos últimos tempos, nos últimos dois ou três anos, por uma razão muito simples: deixou de haver viabilidade para uma central nuclear em Portugal, na medida em que temos uma segurança de abastecimento que já está satisfeita através do nosso actual mix energético.

 
Hugo Soares
Obrigado. Grupo Castanho, Gonçalo Melo.
 
Gonçalo Melo

Antes de mais, cumprimentar o orador e Ministro. Peço desculpa mas a nossa pergunta também está relacionada com a energia nuclear e não nos pareceu muito viável alterar agora a questão. Nós estivemos a fazer alguma pesquisa e vimos que Portugal vive não só um défice económico mas também energético, certo que 55% dos 80% de energia que importamos está relacionada com petróleo.

 

Fazendo a relação da energia eléctrica com o custo de vida, vemos que Portugal é o país que apresenta a maior relação comparativamente com os países vizinhos, Espanha e França. Depois, também vimos o mapa de centrais nucleares em Espanha e verificámos que três delas estão relativamente muito próximas do território português e duas delas muito próximas dos nossos principais rios, o Tejo e o Douro. Uma vez que compramos energia produzida desta forma, embora em pequena percentagem, e as fronteiras territoriais nada nos separam do risco de algum problema numa das centrais espanholas, não seria interessante ponderar a utilização deste tipo de energia à semelhança de Espanha e da França?

 

Sendo que apostando na energia nuclear iríamos baixar o custo do KW/h da energia para Portugal e até muitas empresas e famílias adoptariam outros métodos de aquecimento, de fornos no caso das indústrias, e baixaríamos simultaneamente a utilização dos produtos petrolíferos da qual tanto dependemos.

 
Jorge Moreira da Silva

Muito obrigado. O tema do custo da energia nuclear é um dos temas mais controversos e a verdade é que apesar de muitas potencialidades e projectos que vão sendo apresentados, na prática, a Europa tem vindo a reduzir fortemente esta aposta. Como sabem, há países que têm mesmo previsto umfasing outnuclear, que estão hoje no nuclear e que estão hoje numa fase defasing outna energia nuclear e defasing inna energia renovável. É o caso da Alemanha que assumiu, depois de muitos anos de aposta no nuclear, um desmantelamento das suas centrais e uma progressiva aposta em tecnologias renováveis e no gás natural.

 

Em muitos dos casos estamos a falar de projectos nucleares quando muitos deles vão surgindo como "país tal está a pensar em fazer uma central nuclear”. Vários estudos têm apontado para a circunstância desses projectos serem também fortemente subsidiados e portanto de não ser exactos muitos dos valores na comparação entre o nuclear e outras tecnologias. Mas tocou num tema em que não quero entrar nessa controvérsia, até porque há aqui matérias que são relacionadas com alguns estados que são produtores de tecnologia nuclear e que legitimamente com as suas empresas de capitais públicos procuram comercializar essas centrais.

 

Portanto, não posso obviamente falar, nem quero falar sobre opções que outros países façam, neste momento é relevante falar apenas de Portugal. A não ser no que diz respeito à segurança nuclear que é uma política europeia que deve mobilizar todos os países mas também Portugal, porque como disse nós temos algumas centrais nucleares na nossa fronteira e temos 24h por dia durante sete dias por semana técnicos da agência portuguesa do Ambiente com responsabilidade de monitorizar os riscos nucleares, não para benefício de Portugal, mas para benefício da UE e de um espaço mais alargado.

Existe uma rede de pontos focais europeus para monitorizar esses riscos. Mas é importante monitorizar cada vez mais esses padrões de segurança das centrais nucleares.

 

O que aconteceu em Fukushima, objectivamente, num país como o Japão que tem pergaminhos muito elevados na engenharia e no planeamento, naturalmente deu origem a uma preocupação de toda a comunidade e reforçou a prioridade política da segurança nuclear. Este é um dos temas em que a UE tem vindo a ponderar e que deve ser acompanhado também da nossa parte no dia-a-dia. Julgo que a opção de termos uma central nuclear, continuo a considerar que não se justifica, nem por razões energéticas, nem por razões económicas, nem por razões ambientais. Sendo que se - estou aqui numa aula, vou usar uma análise académica, é aqui o cidadão que está perante os militantes da JSD - hipoteticamente um país quisesse entrar no nuclear o momento em que entra é muito relevante. Esses países que entraram no nuclear fizeram-no há 20 ou 30 anos.

 

Ora, nesta fase a aposta para a qual estão todos a olhar é para as renováveis, para o gás natural e para outras tipologias energéticas que são mais competitivas e mais sustentáveis do ponto de vista ambiental. Portanto, uma entrada tardia numa opção do nuclear seria duplamente errada e, logo, não vejo nisso nenhuma vantagem.

 
Hugo Soares
Para finalizar, o grupo Verde com o Paulo Afonso.
 
Paulo Afonso

Bom dia, gostaria de saudar o Engenheiro Jorge Moreira da Silva e agradecer a partilha de conhecimentos que nos trouxe aqui hoje sobre as temáticas ambiental e energética.

 

Portugal realizou consideráveis investimentos nas energias renováveis no sentido de diminuir a sua dependência dos combustíveis fósseis. Exemplo disso foi o investimento numa rede de postos de abastecimento de veículos eléctricos e incentivos à aquisição dos mesmos, desses veículos. Actualmente existem 1.350 postos de abastecimento e em 2012 venderam-se apenas 160 veículos eléctricos, talvez em parte devido ao fim dos incentivos do Orçamento de Estado 2012.

 

As principais desvantagens destes veículos relativos à autonomia, preço e tempo de carregamento que na altura em que se iniciou este investimento eram importantes, mas hoje em dia têm uma consideração menor pois a autonomia atinge os 500 km, o tempo de carregamento chega a ser de meia bateria em meia hora e o preço situa-se entre os 20 e 30 mil euros, o que é bastante aceitável em relação aos carros de combustão. Por isso, podemos concluir que há um sub-aproveitamento da rede de postos de abastecimento de veículos eléctricos.

 

Gostaríamos, portanto, de saber que medidas podemos esperar para rentabilizar essas infraestruturas, ou seja, os postos de abastecimento de veículos eléctricos. Obrigado.

 
Jorge Moreira da Silva

Muito obrigado. Não estou em condições de responder de forma muito aprofundada; estou ainda, como imagina, a inteirar-me de vários temas, portanto vou falar deste tema de uma forma um pouco ainda abstracta e de quem olhava para este tema antes do dia 24 de Julho na medida em que esta matéria terá de ser naturalmente agora analisada e não me queria antecipar a nada antes disso. Mas, falando em termos gerais, do tema e da aposta do carro eléctrico é óbvio que também olhando para o futuro, para as próximas décadas, a descarbonização e a redução da nossa dependência do petróleo passará inevitavelmente por outras tecnologias, incluindo o carro eléctrico.

 

Portanto, é óbvio que na medida em que omixenergético de electricidade tem menos CO2do que a combustão a partir de produtos petrolíferos, é óbvio que a descarbonização é beneficiada pela aposta no carro eléctrico. O problema aqui, mais uma vez, é o tempo, a escala e tudo aquilo que esquecemos quando olhamos apenas para uma tecnologia.

Quando olhamos para uma tecnologia numa lógica monovarietal, esquecendo tudo o resto e dizendo de repente que a mobilidade sustentável nas cidades é igual a carro eléctrico, é errado. Mobilidade sustentável nas cidades também inclui o carro eléctrico e incluirá tanto mais quanto mais barata a tecnologia for, quanto mais aprofundado for o processo tecnológico, quanto maior capacidade e autonomia as baterias puderem dispor, quanto mais alargado for o benefício económico ambiental, etc.

 

Logo, é óbvio que o carro eléctrico faz parte domix, mas ummixé ummix, não é apenas uma tecnologia. E, frequentemente, quando olhamos apenas para o carro eléctrico, para a micro-geração, para uma certa "gadgetização” da política energética, porque é mais impactante, estamos a esquecer outras dimensões que requerem muitas vezes menos recursos, mais política, mais gestão e mais mudança. Estou a falar da aposta nos transportes públicos. Portugal fez uma grande aposta nos transportes públicos e deu-se uma situação paradoxal que foi os transportes públicos tornarem-se mais confortáveis, com uma rede mais alargada e a utilização dos mesmos reduziu ao longo dos últimos dez anos.

 

Tivemos esta situação paradoxal e portanto é necessário olharmos para o tema do financiamento dos transportes públicos, da reorientação de comportamentos, da mobilização das pessoas, para os transportes públicos em detrimento do individual. Isto não tem a ver com tecnologia, tem a ver com gestão, com política, reorientação de comportamentos, nalguns casos terá que ver com ordenamento do território, com fiscalidade, com dissuasão da utilização do transporte individual nas cidades. Temos também de olhar para outras formas de promover um certogreeningdos transportes individuais com outras tecnologias renováveis que não apenas o carro eléctrico, incluindo aqui gás natural e biocombustíveis.

 

Ainda não falei disto aqui, mas aproveito para dizer quais são as nossas metas que Portugal tem na área da energia. Portugal tem uma meta de 31% de renováveis no consumo final de energia, uma meta de 10% de renováveis nos transportes, uma meta de 25% de redução no consumo de energia - a média europeia é 20% -, e na administração pública há uma meta de redução do consumo de energia em 30%. Portanto, estas são as nossas metas. A Europa tem a meta 20-20-20, nós temos a meta 31-10-25-30: 31% de renováveis no consumo final de energia, 10% de renováveis nos transportes, 25% de redução no consumo de energia e 30% de redução do consumo de energia no sector público.

 

O carro eléctrico faz parte destemix. Gostava de sublinhar esta ideia de que não existem balas de prata na política energética. É tão errado ostracizar tecnologias, esperando que elas fiquem todas num grau de maturidade que só nessa altura é que apostamos nelas, porque isso não é política energética, nós temos de financiar algumas energias renováveis para que elas se possam desenvolver, ter um custo mais reduzido e isso tem um benefício ambiental também. Portanto, não podemos ter uma política energética que exclua tecnologias, mas não podemos ter uma política energética do género bala de prata em que se diz que mobilidade sustentável é igual a carro eléctrico, ou que electricidade é só eólica ou só nuclear.

Tem que haver aqui uma opção demixenergético e de ponderação dos custos relativos a cada tecnologia.

 

Como disse há pouco e concluo desta maneira, Portugal tem a grande vantagem de poder ter ummixenergético muito mais abrangente do que outros países, tendo muito mais ovos no cesto e garantias de que se algum destes ovos, se alguma destas tecnologias renováveis, acabar por se transformar num ovo de ouro, Portugal está em boas condições à escala internacional de gerar crescimento e emprego.

Deixem-me dar um exemplo: Dinamarca. Perante esta plateia é a primeira vez que uso, mas na Universidade de Verão, nas várias, utilizei este exemplo muitas vezes. A Dinamarca em 1997/1998 foi alvo de um problema nos seus estaleiros navais por causa da alteração do padrão de procura da indústria naval e os seus estaleiros navais faliram. A Dinamarca olhou para os seus estaleiros e fez as seguintes perguntas: quais são as competências, recursos e a tecnologia que tenho aqui neste estaleiro que pode ser utilizada numa nova tecnologia do futuro? E chegaram aos aerogeradores para as energias eólicas.

 

Portanto, a Dinamarca utiliza a capacidade que tinha nos estaleiros, os engenheiros, operários e máquinas para o fabrico de barcos para passar ao fabrico de aerogeradores e de pás para produção de energia eólica e, em dez anos, a Dinamarca e as suas empresas tornaram-se o maior vendedor de equipamentos eólicos. Por que estou a fazer o paralelo com Portugal? O eólico já está, é uma tecnologia em que o custo vai sendo substancialmente reduzido. Há muita inovação ainda a realizar mas é uma fileira consolidada, a prazo, tão consolidada quanto o carvão ou o gás natural. Mas há outras tecnologias renováveis que estão numa curva de aprendizagem onde Portugal está de tal forma que se pode desenvolver e poderá fazer de algum dos países que apostam nessas tecnologias do ponto de vista da engenharia, das infraestruturas e investigação e desenvolvimento, como sendo os próximos campeões. Nós temos a vantagem - como eu dizia há pouco - de termos ummixenergético tão alargado, em que várias destas opções poderão acabar por ser alvo de consolidação à escala internacional e portanto sermos um dos campeões da Economia Verde à escala mundial.

 
Carlos Coelho

Muito obrigado. Sei que havia muitas perguntas no "Catch The Eye”, mas já não vai ser possível fazê-lo, bem como uma faculdade que vocês desconhecem, mas saberão no futuro, os ex-alunos da Universidade de Verão têm a possibilidade de seguir em circuito fechado os debates que estamos a fazer aqui. Portanto, não fazemos obroadcastinggeral das aulas (são à porta fechada) mas temos feito em sinal fechado com password para os antigos alunos.

Têm a possibilidade de dirigir perguntas, entre elas algumas muito interessantes, que terão de ficar para uma outra oportunidade.

 

Em vosso nome, agradeço ao nosso orador, ao Eng.º Jorge Moreira da Silva, que irei acompanhar à saída e peço aos avaliadores e conselheiros para prosseguirem os nossos trabalhos aqui na mesa. Depois volto dentro de dois minutos para umas últimas informações.

 

Senhor Ministro, muito obrigado.

 

 

[APLAUSOS]

 

FIM