Bom dia a todos. Vamos iniciar mais um dia de trabalhos. Começamos hoje com uma sessão que tradicionalmente os alunos da UV gostam e onde vão adquirir um conjunto de ferramentas que me parece absolutamente útil para aquilo que farão no futuro.
Antes de começarmos esta sessão, queria cumprimentar o nosso reitor que é um dos nossos convidados nesta sessão e dispensa apresentações. Se o nosso outro convidado também dispensava apresentações, por uma questão de cortesia não deixarei de dizer que o Rodrigo Moita de Deus é desta casa: foi avaliador e conselheiro na Universidade de Verão e há oito anos que faz esta sessão do "Falar Claro” e é por isso que anda aí tanta gente que fala tão pouco claro, porque temos há oito anos connosco o Rodrigo a fazer estas formações. O Rodrigo é membro da Comissão Política Nacional do partido, do PSD; é um dosbloggersmais conhecidos, tem um conjunto de obras publicadas e é director-geral de uma empresa de comunicação. Segundo o questionário que teve a amabilidade de nos remeter, o Rodrigo tem 36 anos, tem três filhos, dois dos quais andam por cá a cirandar; tem comohobbya escrita, como comida preferida "toda, infelizmente”, diz ele.
Tem como animal preferido o escorpião, o livro que nos sugere é "Diálogos no Inferno entre Maquiavel e Montesquieu”, o filme que nos sugere é "Henry V” e a qualidade que mais aprecia é a sagacidade.
Vamos dar início ao "Falar Claro” com o nosso reitor Carlos Coelho.
Carlos Coelho
Muito bom dia. Já receberam a brochura do "Falar Claro” e aperceberam-se que no título desta comunicação há um jogo semântico: "falar, claro”, porque não há política sem comunicação e "falar claro” porque queremos que todos nos entendam.
A nossa apresentação estava muito grande, tivemos que retirar algumas coisas, há conteúdos que estão nessa brochura que não estão nesta apresentação, como por exemplo a parte de escrever claro. Portanto, vamos centrar a nossa comunicação em quatro partes: "Comunicar Bem”, "Contactos com a Comunicação Social”, "Os Novos Meios” e finalmente "15 Conselhos para Falar em Público”.
Vamos começar com o "Comunicar Bem”. A primeira ideia que gostaríamos que registassem é que fazer política é comunicar. Porquê? Porque dada a natureza democrática do regime, em Democracia, o Povo é quem decide. Não é assim nas ditaduras, nos regimes teocráticos, nas monarquias absolutistas, mas em Democracia o Povo é quem decide.
Podemos ser os melhor, mas se não sabemos comunicar com o soberano que é o Povo, de nada nos vale ser os melhores e vamos perder as eleições. Temos de explicar o que vamos fazer, como estamos a fazer e por que estamos a fazer. E comunicar não é só falar, é também ouvir, saber o que é que as pessoas entendem, quais são os seus anseios, problemas e necessidades.
Em qualquer domínio da nossa intervenção social, seja na política ou em qualquer outro, grande parte do nosso sucesso depende da nossa capacidade de comunicar, de falar e de ouvir. Por isso, é preciso termos presente qual é a equação comunicacional básica e que assente nestes três elementos: o emissor, o receptor e aquilo que liga os dois é a mensagem. Se este mensagem não estabelece a ligação não há comunicação entre emissor e receptor. Deixem-me dar-vos um exemplo: se neste momento estivesse a dizer exactamente o mesmo que vos estou a dizer mas estivesse a falar em chinês a comunicação não se estabelecia.
É por isso que usamos uma metáfora que é ganhar a sintonia, o emissor e o receptor têm de se perceber da melhor maneira, têm de estar sintonizados e isso significa ter muito cuidado com o discurso. É totalmente diferente falar para um lar de idosos ou falar para uma assembleia de jovens, é totalmente diferente falar para um grupo de advogados ou para um grupo de pescadores, é totalmente diferente falar numa reunião ou assembleia do partido, ou falar na Assembleia da República.
Em todos estes casos falamos a mesma língua, falamos o mesmo português, mas falamos de maneira diferente. A mensagem só é eficaz quando se estabelece esta sintonia. E a mensagem é biunívoca, isto é, o receptor é também emissor e o emissor é também receptor. Neste momento em que estou a emitir para vocês, vocês também estão a emitir para mim, de uma forma silenciosa, porque eu estou a olhar para as vossas caras e a ver como é que estão a reagir àquilo que eu estou a dizer. Há uma mímica na vossa comunicação que vos faz emissores e me faz a mim receptor.
Quando um dirigente político faz uma sondagem, o que ele está a fazer é a ouvir as pessoas através de um mecanismo técnico. As pessoas, o povo eleitorado são emissores e nós somos os receptores. Quando o Rodrigo Moita de Deus se levantar para falar vocês se levantarem todos, virarem-se de costas, baixarem as calças e disserem: "não pagamos” ou "não gosto de ti”, ou qualquer coisa simpática nas vossas nádegas, ainda sem falarem estão a comunicar e a mandar-lhe uma mensagem muito expressiva e quiçá que ele merece.
[RISOS]
Rodrigo Moita de Deus
Vamos falar sobre o receptor da mensagem e depois ver dos outros dois elementos, o emissor e a mensagem. Este é um daqueles peixinhos dourados, que vêem no ecrã, é uma criatura extraordinária, vem quando compramos um frigorífico na Worten, vem o boião com o peixinho dourado.
O peixinho dourado é uma criatura fantástica pois tem uma memória de três segundos. Portanto ele é uma criatura feliz porque está lá no seu aquário a andar sempre à volta e cada volta que ele dá parece que está a ver uma coisa nova e fica sempre: "ah, que giro”.
Este é o nosso típico eleitor na prática. Este é o receptor da mensagem, tem uma memória muito, muito, muito curta.
Vamos falar um pouco sobre o nosso comportamento em massa e este é o nosso comportamento sociológico eleitoral, nós comportamo-nos em rebanho na prática. Antes do 25 de Abril, como não havia partidos, andávamos todos de um lado para o outro. Hoje em dia com os partidos eles funcionam um pouco como pastores e portanto há umas ovelhas que vão para a direita, há outras que vão para a esquerda e as ovelhas negras vão para o Bloco de Esquerda e funcionamos mais ou menos assim.
[RISOS]
Este senhor que vos estou a mostrar chama-se António Damásio, tive o privilégio de trabalhar com ele na Fundação Champalimaud, ele é neurocientista e fez uma série de testes e experiências do qual resultou um livro que provavelmente conhecem, "O Erro de Descartes”, onde ele chega a uma conclusão que é a antítese da conclusão de Descartes, "penso, logo existo” e era o primado da racionalidade sobre todas as outras coisas. Damásio diz exactamente o contrário, vamos tentar perceber porquê. O cérebro funciona por compartimentos exactos, ou seja, tiro um bocadinho daqui e deixo de ver, tiro um bocadinho daqui e deixo de pensar, tiro um bocadinho daqui e deixo de ser criativo. Aliás, se estiver a falar com os olhos inclinados para a esquerda é porque estou a mentir; porque estou a activar a parte do cérebro que me dá a imaginação.
A que conclusão é que ele chega nestas experiências neurocientíficas sobre o comportamento do cérebro em relação à comunicação? a memória visual é muito maior que a memória auditiva. Isto quer dizer que os presentes aqui, o mais provável é lembrarem-se da cor da minha camisa do que das minhas palavras, lembrarem-se mais da cor dosslidesdo que propriamente daquilo que o Carlos disse. Isto funciona mesmo assim. Olhamos para o Professor Marcelo na televisão, decoramos a cor da gravata e provavelmente não apanhamos aquilo que ele disse, não somos capazes de reproduzir uma frase inteira. A maior parte das vezes é mesmo assim.
Portanto, somos mesmo aquele peixinho do aquário. Vemos as coisas, fixamos determinada imagem, ou uma cor, ou um registo, mas não somos capazes de fixar aquilo que as pessoas disseram exactamente. Isto é um problema para a comunicação, aliás não é o único.
Segunda conclusão engraçada: têm aqui uma espiral em perpétuo movimento e se vocês ficarem a olhar muito tempo para a espiral vão adormecer, é quase tão interessante quanto ouvir o Carlos Coelho a falar. [RISOS]
Ficam a olhar, a olhar, a olhar e de repente apagam. Este fenómeno tem um nome técnico além da hipnose, que ézoning out.Vou-vos dar um exemplo prático. Agora já não funciona porque já há máquinas de lavar-loiça, mas antigamente lavava-se um prato, punha-se a secar e o que é que acontecia? Assim que o cérebro se familiarizava com uma determinada tarefa, lavar-se o prato e pô-lo a secar, o cérebro começava a pensar noutra coisa.
Traduzindo isto para a comunicação: se eu vier para aqui agarrar-me ali ao púlpito e começar a falar no mesmo tom de voz, muito quietinho e paradinho, as senhoras e senhoras vão começar a pensar como é que se safam do jantar desta noite. O cérebro começa a pensar no que têm para fazer a seguir, no trabalho que têm para apresentar, no almoço que têm para fazer, no SMS que têm para enviar. Começam a pensar em tudo menos naquilo que a pessoa está a dizer. Isto é assim, porque muitas vezes estamos em intervenções públicas, estamos a ouvir alguém a falar e de repente damos por nós e estamos a pensar em tudo menos naquilo que ele está a dizer. Existe e é um problema de comunicação, na prática.
Última e mais importante conclusão de António Damásio: dos testes que fizeram chegara a esta conclusão muito engraçada que é que o estímulo visual chega primeiro à parte da emoção e só depois à parte da racionalidade. É uma diferença muito pequenina, metade de um segundo, mas ainda assim muito decisiva porque quer dizer que quem não me conhecia quando eu me levantei ou gostou ou não gostou de mim e tudo o que eu disser a partir de então só serviu para reforçar esse preconceito. Se gostaram de mim: "o tipo é muito giro, diz umas coisas interessantes”; se não gostaram de mim: "o tipo é um nabo, é um idiota, não sabe o que está a dizer”. Pior ainda, o cérebro faz uma coisa extraordinária que é cada vez que acedemos a uma determinada informação deturpamos essa informação. Portanto, saem daqui e daqui a três dias quando lhes perguntarem o que acharam dele, o que acharam dele não tem nada a ver com o que eu disse mas sim se gostaram ou não. Depois, vão dizer que ele além de idiota é parvo e daqui a um mês mais parvo ainda, daqui a um ano já será muito, muito, muito parvo. E por aí fora.
Se a memória só tem espaço para três segundos, tenham cuidado com os três segundos que dão ao público. Vamos só passar um vídeo de um bom exemplo disso mesmo.
[VÍDEO]
A nossa memória não são exactamente três segundos mas são quase três segundos. Isto mexe tudo em comunicação e na forma como comunicamos e qual é a mensagem que estamos a transmitir. Já falamos do receptor, vamos falar então de mensagem propriamente dita.
Já todos ouviram a expressãosoundbite, não é? A expressãosoundbitetem uma boa razão de ser e tem uma ainda melhor razão de ser, a razão pela qual trabalhamos tanto com frase construídas para passar determinadas mensagens. Em 1960, o tempo médio de citação era 60 segundos, ou seja, um jornalista ia gravar um discurso e aquilo que passava na televisão no final do dia eram 60 segundos desse discurso; hoje em dia são sete segundos. Em rádio, aquilo que ouvem de uma intervenção, são sete segundos.
Durante esta Universidade de Verão, a intervenção final do Presidente do Partido, vão ver a seguir aquilo que vai sair na SIC, RTP, TVI, independentemente do canal que escolham, e aquilo que vai sair do que vocês ouvirem durante 40 minutos são apenas sete segundos. Ou seja, ele está obrigado, para passar uma mensagem, a condensar toda a informação do seu discurso, a sua mensagem, naquele espaço de tempo: sete segundos, o dito soundbite.
Como se faz, então umsoundbitee alguns mais famosos do que outros.
Em primeiro lugar deixem-me mostrar-vos aqui uns pequenos exemplos: "nunca erro e raramente tenho dúvidas”, sabem quem disse isto? "Geração rasca”, uma expressão que ficou da década de 90 por causa das lutas estudantis. "O país está de tanga” do Primeiro-Ministro Dr. Durão Barroso quando na Assembleia da República não explicou melhor forma de explicar que havia um problemas de contas públicas e usou esta expressão que toda a gente percebe. Ele falou durante mais de uma hora no Parlamento, discutiu o défice, taxas de juro, Euribor, etc., e disse de repente: "O país está de tanga, senhor deputado” e ficou a frase e toda a gente percebeu pois é uma expressão acessível. Uma pessoa vai num táxi e ouve aquilo e percebe logo.
"Beijar uma mulher que fuma é como lamber um cinzeiro” é um belíssimo slogan publicitário utilizado pelo nosso companheiro Macário Correia; "porcaria na ventoinha” também certamente se lembram desse e ainda mais recentemente "que se lixem as eleições!”. Qual é a vantagem de trabalharmos com estas frases feitas ou construídas para passarem uma determinada mensagem? É conseguirmos condensar o nosso conteúdo naqueles sete segundos e garantir que aqueles sete segundos transmitem aquilo que nós queríamos dizer.
Deixem-me então dar-vos outro exemplo de como podemos construir essas frases ou estessoundbites.
[VÍDEO]
Perguntam vocês, como é que é possível que dois políticos de dois partidos diferentes utilizem exactamente as mesmas palavras e as mesmas expressões para fazerem um discurso, o mesmo discurso político? Em primeiro lugar, a simplificação da linguagem: "keep it simple, stupid!” Toda a linguagem simplificada ao seu mínimo. Ao contrário do que o treinador de futebol Manuel Machado acredita, quanto mais simples a mensagem melhor a mensagem passa, certo? Nós, cá, é que temos a mania que quanto "mais caro” nós falarmos mais inteligentes parecemos. Errado, na política não funciona; quanto mais simples nós falarmos mais pessoas nos percebem, mais pessoas votam em nós. É assim tão simples.
Depois, a questão das palavras, que à semelhança dos estímulos visuais despertam determinados sentimentos e determinadas emoções.
Testámos isso numfocus groupque foi uma sala de hotel com 14 pessoas e perguntamos-lhes se gostam mais do candidato com a gravata azul ou com a gravata verde, e depois perguntamos quais são as palavras que gostam. As pessoas dizem quais são as palavras que gostam e as palavras que não gostam, quais são os estímulos a que reagem positivamente e aquelas a que reagem negativamente, ou na prática, o gostar e o gostar em política é importante.
A palavra que esteve muito na moda durante anos e anos foi "Change”, do Obama e em Inglaterra, toda a gente usava a palavra por tudo e por nada. Mas hoje em dia há outras palavras mais eficazes, porque a palavra "mudança” hoje em dia desperta conotações negativas. A palavra "novo” por exemplo em publicidade continua a ser muito utilizada. Pegamos no Skip antigo, pomos uma embalagem nova e chamamos-lhe de "novo Skip” e as donas-de-casa ficam maravilhadas porque o novo Skip lava sempre muito melhor que o velho Skip, porque o antídoto de novo é velho, portanto funciona sempre bem.
Começámos a usar isso em política: "nova atitude”, "Nova Catarina” em Oeiras, e por aí fora.
Há um conjunto de palavras que despertam bons sentimentos nas pessoas e despertam emoções positivas: "novo” que já viram aplicado, as palavras "desenvolvimento” e "emprego”. Aliás, não há político nenhum, hoje, que não fale sobre emprego. Parece que quanto mais dizem a palavra "emprego”, mais emprego criam. Não é inteiramente verdade, mas funciona, as pessoas precisam de confiança e de confiar. Crescimento, desenvolvimento, investimento, todos aqueles chavões que vêem o Partido Socialista repetir continuamente, estejam a falar da guerra na Síria, estejam a falar da Saúde, tudo é investimento, crescimento e emprego, sempre.
Se alguém pergunta: "O que é que acham sobre a guerra na Síria?”. Respondem sempre: "Investimento, crescimento e emprego” e por aí fora.
Depois, vêem isso aplicado depois em vários cartazes pelas ruas fora: "confiança”, "novo”, "ambição”. Nas ruas pelo país todo conseguem encontrar estas palavras. Depois têm as palavras que nunca se podem utilizar em campanha ou em política. "Dinheiro” é uma palavra suja, temos muito aquela tradição católica de que o dinheiro é uma coisa suja, gostamos de o ter mas não dizemos a ninguém. Portanto, utilizamos vários eufemismos como "verbas”, "receitas”, etc., dinheiro é que nunca se utiliza. Não vêem nenhum político a dizer que precisa de dinheiro. Dinheiro é uma coisa feia.
A palavra "obras”. Reparem como nestas campanhas autárquicas não há candidato nenhum que prometa obras. Se há quatro anos todas a gente prometia obras, hoje em dia não se prometem, porque a pessoa vê e ouve o político a prometer uma obra, por exemplo um novo pavilhão gimnodesportivo, e fica a pensar quando é que vai ter de pagar, quanto é aquilo custo no final do dia. Portanto, obras é algo que está excluído. "Défice”, também excluído. Sendo que o partido é completamente diferente quando ouvimos alguém falar de Economia do que quando ouvimos falar alguém do PS.
Normalmente as duas coisas estão relacionadas. Quando ouvimos alguém do PS pensamos em investimento, crescimento e emprego - naqueles três chavões - e quando é alguém do PSD pensamos em alguém como Vítor Gaspar, por isso a coisa não funciona muito bem.
"Swap” também é um termo que não se utiliza mais, nunca mais vamos utilizar mesmo se voltarmos a fazer, nunca mais se comunica umaswap,swapé mau. "Austeridade”, "PPP” é tudo mau. Podia haver PPP boas mas agora são todas más. Gaspar, Troika, rigor e por aí fora, são tudo palavras más.
Finalmente uma palavra que foi eliminada literalmente do dicionário político: "prometo”. As pessoas deixaram de acreditar nos políticos, não é de agora, mas com a crise agravou-se e não há candidato nenhum que repita a expressão "prometo qualquer coisa”.
Não sei se lembram deste cartaz das autárquicas em Lisboa, já há muitos anos, o outdoor explicava que ele ficava e evidentemente, como sabemos, não ficou. [RISOS]
Carlos Coelho
Sim, o irrevogável é muito actual. Contactos com a Comunicação Social: nas vossas funções enquanto agentes políticos ou enquanto autoridade civil, vão ter muito contacto com a Comunicação Social. Vamos dar-vos algumas notas em como lidar com os jornalistas.
Rodrigo Moita de Deus
Em primeiro lugar há que conhecer o trabalho do jornalista e o que ele faz na vida. O jornalista, tal como cada um de nós, também tem uma função a cumprir e ele tem de contar obrigatoriamente uma história. As notícias ainda são notícias neste país, mais ou menos, nem todas, mas a maior parte, ou seja, têm de contar uma história, ter um princípio, meio e fim e um título, quer queiramos quer não.
Outra noção que vos queria passar: hoje em dia as redacções são cada vez mais pequenas, os jornalistas são cada vez mais novos de idade, têm de fazer cada vez mais coisas, portanto não percebem nem têm de fazer o que nós queremos fazer. Se estamos a falar sobre um arranjo qualquer numa estrada municipal em Alcanena, não tem de saber o que se passa lá e nem sabe. Porque a seguir tem de fazer a cobertura do jogo Benfica-Sporting e depois disso ainda vai ter de escrever umtakesobre a Síria, portanto somos uma ínfima parte no dia dele. Logo, nós é que temos de tentar estar preparados de forma mais eficaz possível para ele apreender tudo o queremos passar.
Depois, precisa obrigatoriamente de um conflito, de criar história e um título que é onde normalmente as coisas correm mal.
Carlos Coelho
Alguns pequeninos conselhos que estão na vossa comunicação, no "Falar Claro”, deixem-me passar a correr pois já estamos atrasados. Sobre o momento em que chamam os jornalistas, a primeira coisa é perguntar se é necessário. Não há coisa mais ridícula que chamar os jornalistas para um comunicado e de facto aquilo não ter substância. A segunda coisa é ver em função do que querem dizer se é apetecível para os jornalistas. Podem achar que é muito importante mas se eles não acharem interessante não vão aparecer. A terceira é saber se fizeram ontem, pois a pior coisa que pode haver é banalizar os contactos com a Comunicação Social; se repetirem essas iniciativas, eles vão deixar de aparecer.
Tivemos um presidente do partido que chegou a fazer três conferências de imprensa no mesmo dia. Depois, sobretudo para os jornais regionais que são semanários, escolher o dia e a hora é muito importante. Por exemplo, se o jornal sai à sexta-feira, qualquer iniciativa que façam na quinta-feira arrisca-se a ser muito complicada porque passado uma semana já está muito desactualizada. Se o jornal sai à quarta e fecha à terça, o ideal é fazer à segunda-feira.
Não se esqueçam de fazer a convocatória com alguma antecedência. Têm em papel um exemplar de uma convocatória, que às vezes há aspectos essenciais da convocatória que se esquecem. Confirmem na véspera através de telefone, vejam o tamanho da sala. Há duas situações a evitar: uma sala deste tamanho é ridícula se estamos à espera de três jornalistas, mas uma sala minúscula pode ser muito embaraçosa se vêm mais jornalistas do que os lugares sentados. Portanto, a sala deve ser adequada à vossa necessidade. Cuidado, quando há janelas abertas ou focos de luz, as fotografias a contraluz geralmente obscurecem a cara do protagonista e por isso são ineficazes. Atenção aodécor. Há um preconceito masculino que é pensar que só as senhoras é que têm sensibilidade para as questões dodécor. Mas não, o décor cria e faz ambiente e ajuda a projectar uma imagem de personalismo.
Em 2010, pedimos a um membro dostaff, o António, que agora está no seminário, que ilustrasse isso. Isto é um dirigente da JSD a falar aos jornalistas numa conferência de imprensa. O mesmo dirigente da JSD, no mesmo local, a falar aos jornalistas numa conferência de imprensa. Reparem bem como a existência de elementos de decoração com o púlpito decorado e uma imagem por trás muda completamente a eficácia da comunicação, o ambiente que se cria e a imagem de personalismo que isso pressupõe.
Nas entrevistas, só dar entrevistas quando houver algo para dizer, pois se não houver nada a dizer não vale a pena dar entrevistas. Com os jornalistas locais às vezes não vêm com fotógrafos, é bom ter sempre fotografias para dar se quiserem que a vossa fotografia apareça no jornal da terra. Na rádio, atenção à voz firme, não leiam textos, usem notas, porque como só ouvimos o som a convicção é muito importante. Cuidado com as pausas na rádio. Cuidado com as pausas na rádio. Aqui, estou a falar convosco e posso fazer uma pausa como esta para fazer uma ênfase, porque não perdem comunicação. Numa rádio, em que não me vêem, uma pausa é a morte da comunicação. As pessoas até podem pensar que o rádio deixou de funcionar.
Portanto, as pausas na rádio, de maneira geral, são assassinas. Porque interrompem a comunicação, que é só auditiva, entre o emissor e o receptor. Cuidado com o som. Uma das coisas boas que temos na Universidade de Verão, mas há problemas muito grandes com o som.
Por exemplo, viram o que aconteceu com o Eng.º Carlos Moedas, ele chegou ali e houve um guincho, um efeito defeedback, que ele teve a inteligência de perceber e nunca mais falou naquela ponta, passou a falar naquela ponta. Recordam-se de ele ter dito que ia para a outra ponta que ali não faz guincho. Já vi, numa das situações mais constrangedoras que já vivi, no Porto, foi no Solar do Vinho do Porto em que o Professor Cavaco Silva estava na primeira campanha presidencial, o microfone guinchou, houve um efeito de feedback, não se conseguiu resolver o problema e ele decidiu inteligentemente não falar para o microfone porque não era capaz. A consequência foi que mais de metade das pessoas que estavam na sala não ouviram nada do que ele disse.
Portanto, o problema do som é muito importante para dar eficácia à comunicação e transmitir também uma imagem de profissionalismo. Cuidado também com os textos que distribuem. Distribuí-vos um exemplar de um comunicado sobre aquilo que Rodrigo Moita de Deus e eu estamos a fazer aqui e depois como ele pode ser traduzido para um texto apetecível para a Comunicação Social. Vejam a diferença entre o comunicado e o textopress release. O comunicado está em crescendo, começamos com o mais banal e acabamos com o mais forte, mas opress releaseé exactamente ao contrário para captar a atenção do jornalista. O que importa é começar com o mais importante e o mais banal deve estar no fim do texto.
Muitos jornalistas que não aparecem nas vossas conferências de imprensa só vão trabalhar o material que vocês vão enviar por e-mail, por fax, por papel, seja qual for o processo. Se em vez de enviarem o vosso comunicado enviarem um press release provavelmente vão ganhar eficácia na comunicação nos vossos jornais.
Rodrigo Moita de Deus
Algumas recomendações para falarem em televisão, daquelas simples: usar roupa escura e evitar padrões. Padrões são estas risquinhas que fazem ruído na câmara. Portanto, se estivesse agora a falar para a televisão não devia ter isto vestido. Segunda nota: inclinar o corpo para a frente quando estamos sentados cria mais presença. É muito mais agradável, parece muito melhor do que estarmos refastelados na cadeira como se estivéssemos na esplanada. Inclinar o corpo para a frente dá presença.
Nunca olhar directamente para a câmara. Há muita gente que tem esse vício. Estamos a ser entrevistados por um jornalista e ficamos a olhar para a câmara, esquecendo completamente que a pessoa que nos fez a pergunta está aqui. Em vez de começarmos a falar para a pessoa começamos a falar para a câmara. Há muito poucos políticos que conseguem fazer isto bem sem parecerem ridículos, todos nós, o comum dos mortais, parecemos ridículos a fazê-lo.
Olhar para o entrevistador significa evitar o síndroma dos olhares errantes. De vez em quando também vemos assim umas pessoas que começam a olhar e os olhos começam a passarinhar pela sala toda em vez de fixarem num ponto, a pessoa que está a falar connosco, o entrevistador, o jornalista. Seja quem for, estamos a falar com ele e conversamos normalmente.
Se conseguirmos acalmar os nervos falamos mesmo normalmente, simplificamos a linguagem ao máximo em vez de fazermos de Manuel Machado.
Controlar o cenário, lá está, o cenário dinâmico retira a concentração do público. Se estiverem muitas coisas a mexer evidentemente que a concentração do público se perde. Finalmente, se não estivermos a dar condolências às famílias dos bombeiros é para sorrir. Regra: é para sorrir. Em Portugal nunca sorrimos por causa de nada. É para sorrir, não faz mal nenhum. O sorriso quer dizer simpatia e aquilo que queremos no final do dia é que as pessoas gostem de nós. É difícil gostarmos de alguém que está sempre com um ar sisudo.
Temos também muita mania de pensarmos numa pergunta, no que ela quer dizer e respondemos à pergunta - errado, quando estamos a fazer comunicação e comunicação política o nosso objectivo não é responder à pergunta. O nosso objectivo é passar uma determinada mensagem. Bloqueamos a pergunta, dizemos qualquer coisa como "ainda bem que me faz essa pergunta, mas o importante é isto, isto e isto”.
Se a nossa mensagem for aquela, temo-la para tudo: perguntam-nos sobre hospitais e nós respondemos sobre a Universidade de Verão, perguntam-nos sobre as estradas e nós respondemos sobre a Universidade de Verão, e sempre repetindo, repetindo e repetindo. Assim, sim, conseguimos fazer uma campanha eficaz.
Carlos Coelho
Quatro conselhos finais, antes de passarmos ao próximo capítulo. Primeiro: falem para o público. Há muito a ideia e o defeito de falarmos para o jornalista. O jornalista não passa de um intermediário. Quando falam com o jornalista não estão a falar com a pessoa que está a segurar o microfone, estão a falar para as pessoas que estão por trás desse jornalista. Ele é apenas um intermediário e as pessoas são o vossotarget, os eleitores e não os jornalistas que estão à vossa frente.
Segundo: ser directo, claro e breve. Recordam-se daquele aforismo "quanto mais ele fala, mais ele se enterra”, portanto quanto menos falamos, quanto mais concentrados estivermos nossoundbitesmais eficazes seremos na comunicação.
Em terceiro lugar, com excepção de alguns limites que devem dar origem à justa indignação devem responder sempre sem exasperação, com classe. Estou a imaginar por exemplo o Rodrigo Moita de Deus a ser interpelado por um jornalista a dizer "você é mesmo um filho-da-mãe, não é?”. Estou a imaginar o Rodrigo sorrir para o jornalista e dizer: "sim, sou filho da mãe, filho do pai, honro-me muito da minha genealogia”. Responder com classe, sem exasperação.
Finalmente, cuidado com as respostas evasivas. Quando começamos fugir já nos estamos a enterrar. As respostas evasivas denunciam uma imagem de comprometimento que pode ser fatal na política. Passamos para a terceira parte: os Novos Média.
Trouxe um conjunto de perguntas de que vou quase passar à frente, queria só fazer uma pelo menos: quem é que aqui não tem facebook? Quem é que ontem viu o telejornal das oito, o momento mais informativo do país? Nenhum? Há ali uma pessoa que viu. Quantas pessoas é que foram ontem ao facebook? De onde é que vos vem a informação e as notícias, é do telejornal ou é do facebook? Algo mudou aqui, certo? É sobre isso que vamos falar e com um caso prático.
Recentemente, o nosso Presidente da República resolveu afixar as condolências ao economista António Borges - com quem tive o privilégio de trabalhar - na página do facebook da Presidência da República. Aconteceu que apenas em poucos minutos, por apelo de umbloggerbombeiro, de um blogue que se chama "Diário de um Bombeiro” as pessoas foram lá comentar aquelepostdo Presidente da República dizendo que falta as condolências aos bombeiros. De repente passaram de 100 para 200, 200 para 1000, depois para 3000 e de 3000 para 9600 comentários a malhar literalmente no senhor Presidente da República porque ele não tinha dado as condolências aos bombeiros.
Depois saiu a notícia "Cavaco foi criticado por ter mantido silêncio acerca das mortes dos bombeiros”, depois os bombeiros viram a notícias e também resolveram reclamar com o Presidente da República. Até lá não se tinham lembrado que o Presidente da República não tinha dado as condolências, mas como as pessoas começaram a reclamar e até os bombeiros vieram atrás lembrar que o senhor Presidente da República de facto não lhes deu as condolências. Depois, veio a notícia de que o Presidente da República foi obrigado a dizer que tinha enviado as condolências através de outra pessoa e por privado.
Acabou a crise? Não, não acabou a crise porque alguém preferiu vir dizer que os bombeiros preferiam evidentemente as condolências públicas do que privadas, e por aí fora. Tivemos aqui um efeito em cadeia que nasce nas redes sociais. Não é o primeiro nem será o último. Nasce nas redes sociais, vira notícia e durante dois ou três dias tivemos os jornais e rádios entupidas com algo que aconteceu com as redes sociais, que recordo-vos o princípio da nossa conversa, são também importantíssimas fontes de informação.
Tenham cuidado: os mundos não são isolados, não há uma coisa chamadaofflinee outraonline, pois hoje em dia estamos todosonline, estamos todos ligados. O meu telemóvel está ligado ao facebook, tiro uma fotografia, faço oupload, faço um vídeo daquilo que se está a passar aqui na Universidade de Verão e ponho no Youtube. Os mundos não estão de todo isolados. Uma coisa condiciona as notícias cá fora e as notícias cá fora condicionam o que se passa lá dentro.
Muito bem, chegámos à última parte da nossa comunicação. São 15 conselhos para falar em público. Vamos tentar passá-los rapidamente. O primeiro conselho é não ter medo do medo. Vamos ser claros: a maior parte das pessoas tem medo de falar em público, pelo menos a primeira vez e é normal ter medo. O medo, aliás, pode ser útil. A pior coisa que pode acontecer a qualquer um de nós e particularmente a um político é a auto-confiança em excesso, o excesso do auto-convencimento.
Portanto, para esses que têm muita vaidade algum medo pode funcionar como antídoto, porque quando temos algum receio não vamos com excesso de confiança.
Há uma história que gosto de contar sempre que é uma história verdadeira passada por uma grande actriz, uma diva francesa, Sara Bernhardt, que ficou na história do entertainment nos Estados Unidos da América. Antes de entrar no palco em Nova Iorque, a grande Sara quis ser simpática para uma jovem corista e perguntou-lhe: "Então, a menina está nervosa?” E a corista respondeu à grande Sara: "Eu nunca fico nervosa antes de entrar no palco.” A Sara respondeu-lhe: "Há-de ficar um dia, quando tiver algum talento.” Esta ideia de não terem medo do medo, o medo é natural e pode ser útil, mesmo que quando olhamos para as circunstâncias isso não nos pareça muito óbvio. Uma das coisas fundamentais no medo e na naturalidade é o que se faz com as mãos e o nosso especialista em mãos é o Rodrigo.
Rodrigo Moita de Deus
O corpo humano produz de facto a adrenalina e a primeira descoberta que fizemos sobre o nosso corpo quando temos muita adrenalina é esta coisa extraordinária das mãos. Pensamos que elas nunca existiram até ao momento em que estamos a falar em público e elas aparecem. O que é que fazemos às mãos? A tentação normal é agarrarmos o púlpito e ficamos ali presos com as unhas cravadas no púlpito na esperança que ele não fuja da nossa frente ou então mãos nos bolsos. Já vimos de tudo, não é? Mãos escondidas atrás das costas. As mãos já cá estavam antes e vão cá continuar a estar depois.
O que é que podemos fazer para resolver o nosso problema das mãos? Entreter as mãos, um escape para o nervosismo. Da mesma forma que tenho o papel na mão, experimentem um dia ir para o púlpito com uma caneta na mão e de repente têm a caneta na mão e escusam de ficar agarrados. O Carlos tem de ter uma caneta na mão para tirar notas também, eu brinco com os papéis e se vocês olharem para o Professor Marcelo a falar no telejornal da TVI ele brinca com o relógio. É um escape, um nervosismo, de repente começamos a brincar com as mãos. Cuidado com os movimentos das mãos para não haver excessos. Às vezes pode haver alguns problemas.
[RISOS]
Carlos Coelho
Segundo conselho: não atrair os abutres, ser firme. Tal como as moscas são atraídas pelo sangue, numa assembleia quem ataca é atraído pela fraqueza. É assim na natureza, se virem filmes de leões, tigres, ou outros predadores, quando vêem uma manada concentram-se sempre no mais fraco.
Os homens não são muito diferentes dos animais, por isso têm de aparentar mais firmeza do aquilo que sentem. Uma das coisas muito importantes ao falar para uma assembleia é olhar de frente para a assembleia. O pior é eu estar a falar convosco e não olhar para vocês, concentrar a minha cabeça e o meu olhar no papel e fazer de conta que vocês não estão. Isso não estabelece nenhuma comunicação e dá uma imagem de fraqueza. Há pessoas que me dizem - e cada um é como é - que não conseguem olhar para a assembleia.
Há um truque que é olhar para o fundo, para a última fila, ver quem é o mais alto, aqui acho que é o Pedro Cruz, e imaginar um palmo por cima da cabeça dele, fixando um ponto imaginário. Estou a falar para vocês, olhando para esse ponto. Estão a ver-me, dá ideia que estou a olhar para vocês, mas eu não estou a olhar para a cara de ninguém, estou a olhar para um ponto imaginário. Portanto não estou a desconcentrar, mas também não estou a olhar para o papel, não transmito essa imagem de fraqueza que é fatal na comunicação.
Este truque da última fila é óptimo para disfarçar alguma timidez ou insegurança. Terceira recomendação: não comecem a falar sem definir o objecto e o intuito da vossa intervenção. Ou seja, antes de começar a falar tenho de saber o que é que quero falar, mas qual é o efeito. Quero ser racional, exprimir argumentos, convencer-vos de que tenho razão ou quero despertar emoções, excitar a vossa participação. O meu registo de comunicação não depende apenas do que quero dizer mas do efeito que eu quero com isso provocar em vocês.
Portanto, definir o objecto e o intuito é essencial. Um exemplo concreto de pedido de esclarecimento: numa assembleia posso usar um pedido de esclarecimento para esclarecer algo que tenha ficado por esclarecer, ou para irritar ou enervar o adversário. É uma figura que posso usar para outros objectivos. Mesmo se pensarem na figura mais regimental que é a resposta aos esclarecimentos, isto é, se alguém me faz um pedido de esclarecimento eu tenho de responder, mesmo essa figura limitada de estar dependente da pergunta que me foi feita pode ser usada para várias coisas. Sobretudo pode ser usada para esclarecer, para mudar de assunto ou pode ser usada para contra-atacar.
Vamos dar-vos três exemplos breves. Olho para o Rodrigo e digo: Dr. Rodrigo Moita de Deus, mas afinal o que é obuzz?
Rodrigo Moita de Deus
Buzzsão as palavras que passam de boca em boca, que circulam e se generalizam.
Carlos Coelho
Ele explicou-me tecnicamente o que é o buzz. Mas eu digo: Dr. Rodrigo Moita de Deus, mas afinal o que é o buzz?
Rodrigo Moita de Deus
Buzzé um conceito novo, mas mais importante é o conceito das palavras que devemos ou não utilizar, as palavrascoolque devem ser usadas porque são percepcionadas como comportando um valor positivo.
Carlos Coelho
Ele fugiu aobuzz, usou a minha pergunta para mudar para o que ele queria, para falar sobre a lógica das palavrascool. Dr. Rodrigo Moita de Deus, mas afinal o que é obuzz?
Rodrigo Moita de Deus
Buzzé aquilo que a sua tia chama àquilo que os outros, os populares, chamam de autocarro.
[RISOS]
Carlos Coelho
Ele usou para contra-atacar. Reparem que até as respostas aos esclarecimentos podem ser usadas de forma diferente para atingir objectivos diferentes. Resumindo: antes de começar a falar definam quais são as ideias-chave, qual é o vosso intuito e ordenem ideias e argumentos. Se começarem a falar sem pensarem nestes requisitos, provavelmente não vão ter uma comunicação eficaz.
Quarta recomendação: não ignorem a audiência. Temos de falar com a audiência. Comunicar não é discursar, não é falar para, é falar com. Isso faz toda a diferença. Nunca pensem que vão discursar, falar para aquelas pessoas. Vocês vão sempre falar com aquelas pessoas, mesmo quando elas não falam. Estou a falar convosco e a ver como reagem e isso garante interactividade na comunicação.
Quinto conselho: não esqueçam que excepto na rádio as pessoas não ouvem um discurso mas sim vêem-no. Portanto, há que representar o discurso, há que transmitir argumentos e emoção, falar com o corpo, pois ele também fala, a mímica é importante. Mas, cuidado, em não apalhaçar, não posso gesticular de tal forma que dê sapatadas no microfone ou que caia numa posição ridícula - mas normalmente essa parte deixo para o Rodrigo.
Muito cuidado com os tiques, eles são fatais. Não se esqueçam nunca que um gesto vale mil palavras e sabemos isso bem da cultura portuguesa. Sexta recomendação: tenham atenção à imagem. As pessoas só votam em quem confiam.
Rodrigo Moita de Deus
Duas questões importantes: primeiro, o estímulo visual que damos às outras pessoas, que nos permite que elas gostem ou não de nós e depois aquela noção de confiança. O eleitorado só vota em quem confia, porque no final do dia está entregar uma coisa que é importante para ele, quanto mais não sejam os seus impostos. Portanto, é um elemento motivador, é uma alavanca para qualquer atitude eleitoral.
Um exemplo prático para vocês reconhecerem. Reconhecem este senhor? Em 1986 ele era candidato à presidência brasileira, candidatou-se assim. Quem é que votava nele? Quem é que lhe entregava uma junta de freguesia, quanto mais um país, certo? Depois, algo aconteceu. O Lula de 1986 transformou-se no Lula de 2004, houve aqui algo que aconteceu: é um corte de cabelo, é um fatinho novo, uma gravata mais bonita e umpinzinho.
O discurso podia ser exactamente o mesmo, por acaso não era, as mensagens exactamente as mesmas, mas num nós confiamos e no outro nem pensar nisso.
Carlos Coelho
Sétima recomendação: não falem sem sentirem o que dizem. As pessoas sentem quando vocês são autênticos e hoje em dia a autenticidade do discurso é uma coisa muito importante. Não usem um discurso monocórdico, falem com a vossa experiência, digam o que sentem porque isso faz toda a diferença. As pessoas sentem mesmo quando vocês falam o que vos vai no coração. Vou pedir para distribuir uma folhinha com uma brincadeira que vocês conhecem: são quatro colunas com dez frases em cada coluna e podem pegar em cada uma das frases e jogar umas com as outras.
Usei na primeira coluna a décima sugestão, na segunda coluna a sexta, na terceira coluna a nona e na quarta coluna usei a oitava. Mas vocês podem fazer as combinações que quiserem. Com as combinações que eu fiz vou ler a seguinte frase: o incentivo ao avanço tecnológico, assim como o desenvolvimento de formas distintas de actuação oferece uma oportunidade de verificação das condições apropriadas para os negócios. Vou repetir pois acho isto muito bonito: o incentivo ao avanço tecnológico, assim como o desenvolvimento de formas distintas de actuação oferece uma oportunidade de verificação das condições apropriadas para os negócios. A piada desta brincadeira é que vocês jogando com estas combinações podem fazer dez mil frases. Dez mil frases que soam bem mas que não dizem nada; que podem usar para dizer nada; para não convencer ninguém; e que podem usar para soar a falso.
É isto o tecnocratês: quando falamos sem sentirmos aquilo que dizemos.
Oitava recomendação: ganhar a simpatia do público. Na primeira intervenção, sobretudo quando se é jovem, às vezes há a tentação de tentar marcar pela qualidade, falar caro, muito sofisticado, para dar a ideia de que somos bons. Pois bem - sobretudo na primeira intervenção -, entre parecer convencido ou parecer modesto e simpático é melhor parecer modesto e simpático, é mais eficaz.
Há dez anos pedimos ao Rodrigo Moita de Deus para fazer um exemplo de uma primeira intervenção.
[VÍDEO]
Como vêem, ele até se engasgou na intervenção, mas transmitiu uma imagem de simpatia. O Rodrigo diz, equivocando-se naturalmente, que ele é um bom rapaz.
[RISOS]
Esta é muito importante como primeira imagem. Se tiverem de dizer o que é que querem com a primeira intervenção, com a primeira vez que falam numa assembleia se é assustar os adversários, ou ganhar simpatia, não tenham dúvidas que é de longe melhor ganhar simpatia. Portanto, o conselho é: sejam modestos sem serem humildes ou simplórios.
O nono conselho é: não sejam chatos como eu e o Rodrigo, que estamos há uma hora a falar. Sejam breves e concisos. Nunca ultrapassem os 20 minutos. Cuidado quando não falam com papel, pois nesse caso temos tendência a estendermo-nos. Se têm uma intervenção com muita coisa é melhor terem um papel escrito para limitarem o tempo. Não façam o disparate de ler depressa demais. Assisti a uma cena na Assembleia da República, do Presidente da Assembleia a chamar a atenção de um deputado a dizer-lhe que ele tinha pouco tempo e ele em vez de cortar partes do discurso começou a ler de forma acelerada.
É a coisa mais ridícula que podem imaginar. Isto aconteceu no plenário da Assembleia da República e é completamente absurdo.
Um conselho muito importante: recusem o discurso redondo. Isto é muito importante em Portugal em que toda a gente acha que deve dar imagem de grande erudição, falar com palavras caras. A comunicação não é um concurso de elegância, mas sim de eficácia. Ninguém vai considerar que vocês ganharam por parecerem muito eruditos, sábios e prolixos. As pessoas acham que vocês ganharam se vos perceberem e registarem aquilo que vocês dizem.
Vamos ver exemplos de discurso redondo e de discurso concreto.
Discurso redondo: isto foi um deputado da Assembleia da República, da JSD, Gonçalo Capitão que fez estes exemplos na sala do senado na Assembleia da República.
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Isto está muito bem escrito, muito elegante, mas agora a pergunta: o que é que ele disse? Se ele, em vez de falar redondo, tivesse falado concreto, teria dito isto.
[VÍDEO]
Era isto que ele queria dizer. Portanto, é de longe melhor falar concreto do que falar redondo.
Décimo conselho: nunca decorem um discurso escrito. As linguagens são diferentes. Provavelmente, muitos de vocês quando eram jovens ou até hoje em dia, terão declamado poesia e sabem qual é o problema quando nós memorizamos um soneto ou um poema e nos esquecemos de uma estrofe. Não estamos depois em condições de repetir, passamos em frente, bloqueamos. É exactamente a mesma coisa com um discurso escrito: quando memorizamo-lo e temos "uma branca” a meio, acabou. Não pensem que é um problema que acontece convosco porque são mais jovens ou porque nunca fizeram um discurso. Aconteceu a um dos melhores oradores parlamentares de todos os tempos, Sir Winston Churchill na Casa dos Comuns. Ele memorizou um discurso, teve uma branca e passou pela humilhação de ter de se sentar porque não se lembrava nada do que vinha a seguir.
Quando querem fazer um discurso, ou lêem e têm o discurso escrito, ou então têm notas e falam de improviso com base nas notas. Se têm uma falha a meio passam para a nota seguinte, mas não ficam dependentes daquilo que se passa nos circuitos de memória da vossa cabeça. Outra coisa muito importante é quando pedimos alguém para fazer um discurso. Já aconteceu com todos, ou porque não tínhamos tempo, ou porque achávamos que não tínhamos jeito para aquele tema e queríamos uma ajuda e pedimos a alguém. O problema é que quando vamos ler um discurso que alguém nos fez, sem nos ter preparado, temos de adaptar, pôr as palavras que nós gostamos, "pôr o discurso com a nossa cara”.
Já aconteceu muitas vezes pessoas irem para cerimónias públicas ler pela primeira vez discursos que outros fizeram, criando-se grandes embaraços e fazendo figuras tristes. O 11º conselho é nunca descurar as desfesas. Sobretudo quando se faz um discurso de fundo devem evitar aquela situação em que um adversário vai dizer que daquilo que esta pessoa disse nada se aproveita, nada faz sentido e que em nada tem razão. Portanto, num discurso temos sempre de colocar alguns conceitos que nos permitam reagir a isso. Dizer algo como: "O quê? Está a dizer que não tenho razão em nada, mas então com isto não concorda? Eu disse isto e o senhor não tem a mesma opinião?”. Isto embaraça o nosso adversário, ou seja, impede-o de fazer um ataque mais demolidor.
Não é tão difícil incluir grandes princípios que todos têm de subscrever. Deixem dar algum exemplo: não há solidariedade sem reduzir as gritantes diferenças entre os cidadãos. Quem é que pode discordar disto? Sobretudo quando isto tem a ver com uma medida que nós queremos anunciar. Dizer que não há progresso justo em Portugal sem que ele se faça sentir em todas as regiões do país, se quiserem falar sobre o Interior ou o equilíbrio entre o Litoral e o Interior. Ou dizer: reduzir as assimetrias entre o Litoral e o Interior, a cidade e o campo, o Norte e o Sul do país. Lembrando ascool wordsde que o Rodrigo falou: formação, participação dos cidadãos, qualidade de vida, Ambiente, bem-estar, transparência na administração, entre outros – há conceitos que todos subscrevem e que ficarão bem que são fáceis de subscrever em qualquer discurso.
A 12ª recomendação é nunca responder se não se sabe; o pior que se pode fazer em política é simular conhecimento. É completamente ridículo uma pessoa fingir e depois ser desmascarada. Há formas elegantes para num debate, por exemplo na rádio, quando me perguntam alguma coisa para a qual eu não tenho opinião ou informação. Posso responder desta forma: "Nunca tinha visto esse problema sob esse ângulo, parece-me interessante ou talvez perigoso ou inaplicável, mas gostaria de pensar um pouco melhor antes de me pronunciar.” É melhor isto do que fazer uma figura triste, ou dizer tentando "passar manteiga” no nosso oponente: "Invocou argumentos novos que merecem reflexão, se reagisse de imediato não lhe faria justiça, preciso valorizar os seus argumentos, pesá-los com outras opiniões e voltar ao assunto na próxima oportunidade”.
Encontrar uma forma elegante de sair, numa situação embaraçosa.
Rodrigo Moita de Deus
Tecnicamente aquilo que aprendemos ou às vezes ensinamos é para não se responder às perguntas. A técnica do bloqueio e ponte. Bloquear significa fazer um prefixo qualquer: "Fico feliz por me ter feito essa pergunta”, "ainda bem que me fez essa pergunta, mas o importante é lembrar isto.” Fiz o bloqueio ao impacto negativo que a pergunta podia ter e fiz a ponte para passar a mensagem. Sempre o bloqueio e ponte, e para isto há imensas variações. Ouvem, certamente, em entrevistas pois é uma técnica aprendida quase em laboratório, mas o importante é reforçar se no final do dia passámos ou não a nossa mensagem e não se respondemos às perguntas.
Carlos Coelho
Estamos a terminar e a 13ª recomendação é atacar com firmeza protegendo a rectaguarda. Isto é, nunca afirmem aquilo que não sabem ou de que não têm provas. Embora o Rodrigo não goste muito do "parece-nos que” na comunicação e ele tem razão, às vezes o "parece-nos que” é uma boa defesa. Imaginem o seguinte cenário: estão a trabalhar numa câmara municipal do Partido Socialista em que há rumores com muita solidez relativamente ao presidente da câmara, que há um escândalo com o presidente. Não podem afirmar sobre o que não há provas, mas podem insinuar de forma protegida, por exemplo dizendo: "A confirmarem-se os rumores que correm, temos de apurar responsabilidades e retirar consequências jurídicas e políticas.” E se em vez de consequências jurídicas e políticas eu disser consequências políticas e criminais vejam o peso das palavras. As palavras têm peso. Se eu disser que temos de apurar responsabilidades políticas e criminais eu estou a fazer uma insinuação sem que alguém me possa dizer alguma coisa. Eu disse "a confirmarem-se”, reparem, ninguém me pode acusar do que quer que seja.
Ou posso dizer: "Estamos preocupados com os boatos que circulam que a confirmarem-se são prova da mais grave irresponsabilidade e de aproveitamento ilícito de recursos públicos.” Portanto, está aqui o ferrão todo mas com a defesa, protegendo a minha rectaguarda. "Boatos com esta gravidade têm de ser desmentidos, sob pena de minarem a credibilidade de autarcas que até prova em contrário devem merecer a nossa consideração.” Esta é mesma "filha-da-mãe”.
Muito bem, 14ª e penúltima recomendação: nunca atacar com maldade e dosear a agressividade. Devemos evitar ataques pessoais, devemos insinuar com fundamento e clareza e se formos atacados devemos representar a indignação, deixar os nossos adversários envergonhados. Deixem-me dar um exemplo de um ataque ao Partido Socialista em que eles nos atacaram e nós estamos a defender a nossa honra, como se diz.
[VÍDEO]
É uma forma de reagirmos: quando queremos atacar podemos atacar sendo filhos da mãe educadinhos, isto é, com subtileza. Um exemplo protagonizado pelo Rodrigo em que ele ataca alguém do PS que não disse nada de jeito.
Rodrigo Moita de Deus
Ó senhor deputado, isso é de facto brilhante, confesso que não tenho metade das suas capacidades de orador. Agora, aquilo que eu sei é que o embrulho era fantástico mas o conteúdo zero, zero!
Carlos Coelho
Portanto, nós podemos atacar sem ser grosseiros. Isso faz toda a diferença.
Nunca, nunca, nunca, aceitem ser discriminados e inferiorizados, seja pela idade, pelo sexo, pela cor, por aquilo que for. Qualquer factor de discriminação é tabu, graças a deus e nessas alturas devem recorrer à defesa da honra. O Gonçalo Capitão foi acusado numa assembleia de ser muito jovem, isto é, de não pensar aquilo que diz e ele defendeu a honra desta maneira.
[VÍDEO]
[RISOS, APLAUSOS]
Numa das primeiras edições da Universidade de Verão tinham aí uma colega vossa que era preta e que me colocou um cenário a dizer-me: "Isso da defesa da honra é muito bonito, mas imaginem uma situação em que há um conjunto acrescido de discriminações. Eu sou jovem, sou preta, sou mulher e sou discriminada numa assembleia; como é que eu reajo?”.
Portanto, imaginem um velho machista racista e eu disse-lhe que às vezes as coisas não nos saem mas o ideal era que se ela se pudesse levantar com dignidade em ser jovem, em ser mulher e ser preta e virar-se para o seu agressor e dizer-lhe qualquer coisa deste género: "Vejo-o nervoso, agressivo e precipitado” - para um homem é logo grande coisa -, "não sei o que o perturba mais” - um homem não se perturba -, "se o facto de ser jovem, de ser mulher ou se o facto de ser preta. Qualquer dos receios só por si já o deveria embaraçar. Concentre-se naquilo que eu aqui afirmei e na razão que me assiste, tudo mais é preconceito que o deveria envergonhar.” Se ela tivesse conseguido reagir assim teria sido uma coisa fantástica de reacção a um velho racista e machista. O sangue frio, nestes momentos, é essencial. O sangue frio valoriza a reacção e impede o disparate.
Meus caros amigos, ao longo desta hora, o Rodrigo Moita de Deus e eu tentámos falar-vos de comunicação. A comunicação são palavras, gestos, atitudes. Comunicar é passar mensagens e por estranho que pareça, passado uma hora de falar claro eu dir-vos-ia de uma forma irónica que talvez para comunicar nem sequer tenhamos que falar. Há uns anos, uma amiga minha disse-me que as mais lindas frases de amor são ditas no silêncio de um olhar. Se assim é, como vêem não é assim tão importante falar, o que importa é mesmo comunicar.
Muito obrigado.
(APLAUSOS)
Hugo Soares
Em vosso nome, agradecer o mérito e a excelência da exposição do Carlos e do Rodrigo e chutava a bola para esse lado. É a vossa vez de comunicar, claro, e começava com o grupo Encarnado com a Helena Grangeia.
Helena Bigares Grangeia
Carlos Coelho, Rodrigo Moita de Deus, em nome do grupo Encarnado cumprimento ambos os oradores. Isto agora é uma enorme pressão falar depois de uma aula destas. Vou fazer o meu melhor e sintam-se à vontade para me aconselhar, caso seja necessário, agradeço até.
Carlos Coelho
Já ganhou no sorriso.
Helena Bigares Grangeia
Todas estas questões da adequação do discurso e da comunicação são realmente muito importantes e as noções que nos passaram de como tornar eficaz e transmitir eficazmente a mensagem, mas o problema que nos assiste hoje é que quando se fala em política ou discurso político as pessoas à partida mostram-se logo apreensivas e não, nem sequer querem ouvir. Quando assistimos a situações do género vamos todos apagar a televisão, por exemplo quando um representante do Governo vai falar em directo para os portugueses.
Será que estamos a assistir a umzoning outdas pessoas em relação à política? Está a ficar demasiado familiar devido ao excesso de comentário políticos que há em vários canais, assuntos se calhar demasiado banalizados e as pessoas não querendo ouvir mais do mesmo nem sequer dão oportunidade a que seja passada determinada mensagem? Ou seja, apesar destas preocupações todas não se consegue passar a mensagem. Gostaríamos de saber a opinião sobre isto.
Rodrigo Moita de Deus
Sim, é verdade, "os políticos são todos iguais”. Aquele comentário do taxista é verdadeiro e olham para a Assembleia da República e acontece uma coisa extraordinária que é ver naquelas imagens toda a gente igual. Menos os nossos deputados claro, mas toda a gente igual: alternando entre o fato azul e o fato cinzento, e depois, lá no fundo, estão uns senhores sem gravata que são os mais divertidos de todos, eram, até o João Semedo ter tomado conta do partido e aí ficaram iguais aos outros. É uma espécie de ser comunista sem ser comunista, é uma coisa extraordinária.
Todos eles utilizam mais ou menos a mesma linguagem, os mesmos métodos, as mesmas fórmulas, o mesmo dicionário, as mesmas palavras (défice, euribor, economês, tecnocratês), e portanto as pessoas desligam a televisão simplesmente e provavelmente com razão. Na prática elas têm mesmo, mesmo, mesmo, razão, pois os políticos são de facto todos iguais, há uma escola, quer se queira, quer não se queira, de fazer política que se foi imperando e afastando das pessoas. Os políticos falam de uma maneira que as pessoas não percebem, comportam-se de uma maneira que as pessoas não percebem e são cada vez mais descortinados e nessa medida mais exigentes as pessoas se tornam, criando aqui um ciclo muito negativo.
Agora, a oportunidade para falar com as pessoas continua a existir, isto não é um fim do mundo, é só mais uma fase e aconteceu em tantas outras fases. A oportunidade existe, agora depende de nós agarrar ou não, porque as pessoas continuam a dar uma oportunidade. Todos os dados apontam nesse sentido, as pessoas não podem desistir do sistema, porque este é o melhor regime que temos à excepção de todos os outros e continuam a ter uma oportunidade; conquistá-la é consigo.
Carlos Coelho
Só um comentário final: quando estamos perante um cenário em que sabemos que há uma erosão da política o que temos que fazer é evitar o politiquês. Vamos supor que o Secretário de Estado do Emprego anuncia hoje medidas para promover a criação de emprego. Posso abordar isto de uma forma tecnocrática dizendo que estou muito preocupado com a evolução da curva do desemprego e a comparação dos valores portugueses, portanto fazendo um discurso politiquês, ou posso falar nas pessoas, no desespero de quem está à procura do primeiro emprego, no conjunto de famílias que não têm emprego neste momento, no conjunto de famílias que quer pai quer mãe estão desempregados. Partir dos casos reais para dizer que é urgente dar resposta a isto e que é por isso que o Governo tomou hoje estas posições.
A construção do discurso pode combater essa erosão da política. Portanto, também aí temos de ter cuidado com as palavras, com as mensagens, com a forma como comunicamos.
Hugo Soares
Grupo Amarelo, Cristiana Gonçalves.
Cristiana Gonçalves
Bom dia. Para começar gostava de agradecer a presença do Dr. Rodrigo Moita de Deus na Universidade de Verão e cumprimentar todos os restantes.
O objectivo de qualquer orador é transmitir algo para um auditório. Acha que numa altura em que o país está em crise e as pessoas estão muitas vezes frágeis e desesperadas para verem os seus problemas resolvidos, os políticos aproveitam-se dessas fraquezas e usam um discurso manipulador e que procura a adesão apelando essencialmente a factores emocionais, ou pelo contrário, a crise aumentou o nosso sentido crítico e inconformismo, o que dificulta o trabalho do orador?
Rodrigo Moita de Deus
Sobretudo aumentou o escrutínio, isso sim. Se pensarem especialmente no ano passado as conferências de imprensa do Ministro das Finanças tinham mais ou menos as mesmas audiências dos jogos do Benfica. O que era uma coisa inédita. De repente começou a haver quase tantos interessados na taxa de juro e no défice e em conceitos como a dívida pública, passámos a dominar siglas como IMF, Euribor, e o que significavam, tentando decifrar o conceito daquelas mensagens. Isto é uma coisa estranhíssima, de facto ouvir um taxista a falar sobre taxas de juros e emissão de obrigações é algo irreal.
Podemos voltar a falar sobre o Markovitch e o Stankovic que é uma coisa muito mais divertida, mas a verdade é que as pessoas aumentaram esse escrutínio porque passou de repente a ser uma questão de necessidade. Têm as duas coisas: se é verdade que as pessoas se afastaram dos políticos e acham cada vez mais que os políticos são iguais, havendo um enorme desprezo pela actividade política, a verdade é que passaram a escrutinar muito mais tudo aquilo que se passava na política e isso exige.
Só uma nota: discordo que haja muita manipulação. Há muita gente demagoga e populista, mas manipulação ainda é outra coisa um bocadinho mais à frente. Termino com aquilo que o Carlos vos disse há pouco: a única forma de combater isso e romper com este ciclo negativo é de facto largar o politiquês e o economês e tentar falar directamente para as pessoas.
Hugo Soares
Grupo Azul, Nuno Magalhães. Não o líder parlamentar do CDS, mas o nosso Nuno Magalhães.
Nuno Magalhães
Bom dia. Queria agradecer ao nosso reitor Carlos Coelho e ao nosso convidado Rodrigo Moita de Deus por esta aula que foi bastante interessante e que trouxe realmente mais-valias.
Sendo esta a melhor universidade para a formação política no país, sabemos que muitos dos que estão aqui presentes tencionam seguir o percurso político. Assim, gostaria de perguntar quais são os conselhos que o nosso reitor e o nosso convidado têm para dar para um jovem que queira fazer um caminho político harmonioso e conciso.
Carlos Coelho
Ó Nuno, quando eu estava na Jota detestava que os mais velhos me dessem conselhos. Portanto, tenho sempre algum pudor em dar conselhos mesmo quando pedem. Mas já que você pediu, eu dizia-lhe três coisas: primeiro, nunca tenha medo do medo. Acho que isso é essencial. em segundo lugar, nunca se esqueça qual é o seutarget, para quem você fala, quem é o destinatário da sua mensagem. Em terceiro lugar, nunca se esqueça que a comunicação eficaz é aquela que é bonita,sexy, atraente, mas que tem substância. Se tivermos toda a razão do mundo mas não a soubermos envelopar, ninguém nos vai comprar. Se formos muito eficazes na comunicação mas não dermos substância, somos como o Sócrates.
Portanto, aquilo que faz o sucesso da comunicação na política e diria até na vida, é um equilíbrio inteligente entre substância e forma. Se não tiver medo do medo, nunca se esquecer para quem fala, o seu target e conseguir equilibrar substância e forma, vai ter um sucesso fantástico.
Rodrigo Moita de Deus
Vou completar as palavras do Carlos, porque sou mais novo e por isso posso dar conselhos. Um conselho para toda esta gente que quer fazer política, não é? Não se meta nisso. Não se meta nisso. Se é para fazer política só para fazer política não se meta nisso. Se é para fazer intervenção, activismo, participação cívica, aí sim vale a pena.
Se é para resolver uma coisa em concreto, aí vale a pena, é muito mais divertido. Lembro que a JSD teve um deputado cuja única razão pela qual ele foi para deputado e foi fazer de deputado era por causa do terceiro rail nas auto-estradas. Ele tanto chateou os outros deputados todos, estávamos com o Governo Barroso, já em crise, tanto chateou os concessionários que fez mesmo passar uma lei para haver um segundo rail nas auto-estradas. Aquilo custa milhões e milhões de euros, mas ele tinha aquela coisa do "não, isto é importante porque salva vidas”. Isso sim é fazer política. É muito mais divertido, muito mais lucrativo para si, muito mais preenchedor (fulfilling, naquele sentido de realizar-se) e isso sim vale a pena. Política pela política, olhe, há tantos e há melhores.
Hugo Soares
Grupo Roxo, Catarina Alves da Silva.
Catarina Alves da Silva
Bom dia. Em nome do grupo Roxo, saudamos o nosso reitor Carlos Coelho e o Dr. Rodrigo Moita de Deus pela aula apresentada. Sobre este tema temos a seguinte questão: num contexto de proliferação dos meios de comunicação e estando constantemente a receber estímulos informacionais assistimos a uma contínua desinformação relativamente a temas essenciais como são por exemplo a política.
Como podemos tornar os discursos políticos mais apetecíveis e cativar aqueles que à partida não estão receptivos à mensagem porque o tema por si só não faz parte dos seus interesses?
Obrigada.
Rodrigo Moita de Deus
Percebo o ponto de vista e a pergunta, mas pense na década de 30 quando os políticos faziam política pela rádio, os discursos passavam só na rádio e foi inventada a televisão. Deve ter havido uma data de políticos que disseram que a política tinha acabado e que tudo aquilo era uma coisa terrível.
Depois na televisão só havia um canal e começaram a haver mais e toda a gente pensou: "acabou-se a política”. Pensaram que era impossível porque havia telenovelas em todos os canais e depois quando apareceram os canais de notícias, a mesma coisa; quando apareceu a tv a cabo e depois facebook, a mesma coisa.
Estamos nisto já há uma data de tempo. Há muito tempo que os políticos estão nesta actividade para falar para as pessoas e tiveram de se adaptar a todas as realidades. Disse e bem que é uma questão de adaptação no discurso, o que podemos fazer de diferente. Acho que tudo o que podia ser dito já foi aqui dito: é nas palavras e na forma como nos dirigimos às pessoas. Provavelmente a política evoluirá para um discurso muito mais directo, muito mais simplificado para o "keep it simple, stupid”, que não é uma questão de superficialidade no conteúdo, não tem de meter superficialidade no conteúdo, tem só de meter cuidado para falarmos no púlpito da mesma forma como falamos fora dele.
Porque às vezes parece mesmo que os políticos têm de facto duas caras: vão para o púlpito e parecem umas pessoas, saem do púlpito e são outras. Não falam no púlpito da mesma forma como falam como se estivessem no café ou no restaurante a falar com aqueles que lhes são próximos.
Hugo Soares
Grupo Laranja, Luís Carlos.
Luís Carlos
Bom dia a todos. Gostaria de cumprimentar o nosso reitor Carlos Coelho e o Dr. Rodrigo Moita de Deus e agradecer a sua presença bem como a sua aula que foi bastante útil e também com grande sentido de humor que foi decerto apreciado por todos.
Voltando à questão das mãos, gostaria de saber se seria mais eficaz utilizá-las como complemento do discurso ao invés de entretê-las e como aprender a fazer isso para pessoas mais inexperientes como é o meu caso.
Obrigado.
Rodrigo Moita de Deus
Vou voltar a repetir: adrenalina, certo? A adrenalina mete o corpo todo a tremer, por isso é que se chama assim, é uma coisa engraçada, toda a gente sente menos o Dr. Santana Lopes. Eu sinto, o Carlos sente, o Marcelo sente, toda a gente sente, menos o Dr. Santana Lopes.
O Dr. Santana Lopes não tem essa coisa da adrenalina, nós todos, mortais, temos. Tudo começa a tremer. As mãos passaram a existir, mas não é só as mãos. Existe umdelayenorme entre aquilo que você pensa e aquilo que você diz, mas de repente começou a pensar naquilo que diz, coisa que não acontece quando está num estádio de futebol em que quer insultar o árbitro e aquilo sai-lhe à primeira.
[RISOS]
De repente, chega aqui ao púlpito, quer insultar alguém e fica a pensar na melhor forma de formulação do insulto. Dá tempo para tudo, é uma coisa horrível, um drama. É um drama, há umdelayenorme que a adrenalina provoca, é físico, é neurológico, aliás, que a adrenalina provoca e nos faz perder a noção daquilo que queremos fazer.
Mãos, certo? A tendência normal é agarrar no púlpito, agarrá-lo bem para ele não fugir. Você esteve no pontal, só para mostrar que é um militante empenhado.
[RISOS]
Também lá estava, também vi.
É errado agarrar o púlpito, pois as mãos fazem parte do seu corpo. Portanto, quando está a tentar exprimir uma ideia as mãos são um óptimo acompanhante, tudo ganha outra mobilidade. Se você se lembrar do que dissemos do princípio da apresentação, nós dissemos aqui uma coisa importantíssima, que é que a memória visual é muito maior que a memória auditiva. Logo, você fixa muito mais as imagens que palavras e, por isso, todos esses gestos, todo este complemento cénico - de teatro, quase, não exagerando -, seja a cenografia, sejam as mãos, ajudam a memorizar ainda mais a minha presença aqui, o que no fundo é o que nós queríamos desde o princípio.
Portanto, escape, utilizando uma caneta ou um papel, não se agarre a nada e tente completar até que aquilo lhe saia naturalmente e você consiga falar. Agora, é preciso ensaio, ensaio, ensaio, ou como eu diria, muitas horas de voo.
Carlos Coelho
O Luís fez um cumprimento que eu agradeço, a dizer que usámos humor e isso oferece-me oportunidade para fazer uma anotação. O humor é muito importante na comunicação mas é como o sal na comida, é q.b.; a ausência de humor não garante grande atracção, mas o excesso de humor torna as coisas um bocado aparvalhadas. Portanto, jogar com o equilíbrio, o ponto certo, é uma ciência que a experiência dá. Se estiverem na dúvida entre parecer bem ou mal, é melhor não serem engraçados, porque o humor é como o sal na comida, é q.b. (quanto baste).
Hugo Soares
Grupo Castanho, João Fanfa.
João Fanfa
Bom dia a todos. Em nome do grupo Castanho queria saudar o Dr. Rodrigo Moita de Deus pela sua presença e também o reitor Carlos Coelho. Como podem perceber eu sou açoriano e talvez metade da sala não me está a compreender, não é?
[RISOS]
Para mim a comunicação é uma peça essencial na política, não é só a discursar - como já foi referido - em bom português, mas também com um bocadinho de humor. Já me enganei, viram? Mas o que eu queria saber de momento era mesmo, como é a minha primeira vez a falar e ainda por cima cá no continente sempre tenho de ter aquele cuidado de ter o português mais lento senão fico a falar sozinho.
[RISOS]
A minha dúvida nesta aula excelente que nos foi dada é que ao discursar na minha maneira de expressar de momento é com as mãos aqui. Se talvez estivesse com as mãos aqui assim a falar assim podia estar mais calmo e tranquilo, não é? É esta a minha dificuldade: será que ao discursar devia estar mais concentrado e com as mãos assim ou devia estar a olhar para todos e ver o que podia seguir sem estar a ler. Agora não estou a ler, para ver se consigo nesta primeira vez dar uma boa impressão em não ler e não usar ipad já que tecnologias não é comigo. Mas queria dar essa impressão para ver se consigo discursar e dizer aquilo que penso, direito, e ver se supostamente está correcto.
Carlos Coelho
Ó João, o Rodrigo dirá pela parte dele, mas pela minha parte eu acho que você esteve muito bem. Esteve muito bem na postura física e na forma como usou as mãos. Demos muitas receitas mas não têm de as decorar, só têm de decorar uma receita que é a autenticidade.
O Duarte Marques disse uma vez e tenho usado essa imagem muitas vezes, que há razões teológicas - independentemente de sermos católicos ou não todos sabemos quem é o Papa -, para se gostar ou não do Papa Francisco. Mas o Papa Francisco ganhou a imagem de simpatia pelo público pela sua autenticidade. Não sei se vai limpar o Vaticano, resolver os problemas do Banco, libertar a Cúria de pessoas indesejáveis, abrir a Igreja aos tempos novos, nem nada disso, mas as pessoas olham para o Papa Francisco e dizem que ele é autêntico. Esta é a chave do sucesso, particularmente numa altura em que a política está a falhar nisso, em que todos olham para os políticos e acham que são todos uns falsos, ou porque são políticos de plásticos (trabalhados), ou porque ignoram as convicções e só ligam aos interesses, ou porque falam politiquês, ou seja por que for. A única coisa que vocês têm de pôr na vossa cabeça é que têm de ser autênticos e isso é a chave do sucesso, na minha opinião.
Hugo Soares
Mariana Condessa do grupo Verde.
Maria Ana Condessa
Bom dia. Antes de mais quero agradecer ao Carlos Coelho e ao Rodrigo Moita de Deus pela excelente palestra e quero também desejar um bom dia aos meus colegas.
A minha pergunta é sobre a indumentária, sobre odress code. Por vezes, em momentos mais formais, os elementos que estão a fazer seja discursos políticos, seja jantares formais, têm tendência a vestir-se com mais seriedade. Não será, por vezes, que essedress codelevará a que o comum mortal acabe por distanciar um pouco da pessoa, achando talvez que a pessoa esteja a demonstrar alguma superioridade em relação a nós? É essa a minha pergunta.
Rodrigo Moita de Deus
Virei aqui o consultor de moda da Universidade de Verão, mas já me aconteceu pior.
[RISOS]
Ó Mariana, sim, contribui. Volto um bocadinho atrás para repetir aquela imagem da Assembleia da República. Existe um estereótipo em relação a tudo o que é políticos, fato azul, fato cinzento, o tailleur para as senhoras e anda tudo ali, sendo apenas uma questão de tonalidade de azul ou de cinzento. Isso, evidentemente, afasta as pessoas dos políticos. Há boas razões protocolares que nos assistem: em Espanha não pode ir de mini-saia ter com a rainha por razões evidentes; nem o Papa a recebe se não tiver o seu cabelo coberto; há assim uma série de regras elementares.
Tudo quanto seja simplicidade ajuda. Mas volto à apresentação, lembram-se do exemplo do Lula, não é? Simplicidadema non troppo, porque temos de conseguir passar uma imagem de confiança e a memória visual - repito - é muito maior que a memória auditiva. Portanto, aquele primeiro impacto, aquela imagem que as pessoas guardam de se estava bem arranjado ou não, se a camisa estava desapegada ou não, é fundamental. Há vários políticos que depois utilizam a forma como vestem para passar determinadas mensagens. Todos já repararam que o António José Seguro está mais velho, não é? Desde que é Secretário-Geral do PS envelheceu bastante, tem os óculos mais salientes, anda sempre vestido de uma maneira mais à Chefe de Estado e fala muito mais devagar como se estivesse a dar uma aula. É uma estratégia de passar uma mensagem de que ele já não é um miúdo e de que já está apto para o Governo. É distanciá-lo da idade que ele tem para que as pessoas reconheçam nele determinado mérito.
Isso faz-se muitas vezes, nem sequer é original. O Professor Salazar foi talvez o primeiro político português a passar uma mensagem com uma peça de roupa, com o buraco dos sapatos. É uma imagem que ficou para sempre. Toda a gente comentava as botas velhas do Professor Salazar. Aquilo passa uma mensagem, uma mensagem muito política: "Eu sou um homem poupado e da mesma forma como faço a gestão das minhas botas, faço a gestão do meu orçamento de Estado.” Mas sim, a imagem, a roupa, passa determinada mensagem, deve-se tentar simplificar sempre que possível e distinguir sempre que possível.
Hugo Soares
Tiago Duarte do grupo Cinzento.
Tiago Duarte
Bom dia. Rodrigo Moita de Deus, Carlos Coelho, é inquestionável a importância da comunicação através do discurso, apesar disso, a verdade é que existem muitas pessoas, principalmente jovens, que não lêem jornais, não vêem televisão e que mesmo na Internet não têm atenção a questões políticas.
A minha questão é: estaremos nós destinados a distribuir correspondência indesejada como muitos partidos de esquerda fazem ou existem outros métodos para chegar a essas populações.
Rodrigo Moita de Deus
Existem muitos métodos para chegar a essas populações. Se reparar, agora as novas regras eleitorais também restringem ainda mais a cobertura que os Média fazem pelas campanhas. Agora a CNE fez um despacho a dizer que não podíamos mandar e-mails nem SMS. É engraçado: "podem fazer campanha, desde que não façam campanha”. Portanto, não podemos mandar SMS nem e-mails a não ser que seja para anunciar eventos. Temos de retirar a parte da propaganda política, o que é relativamente fácil.
É mais ou menos como pedir à Danone para comunicar sem falar sobre iogurtes. Na prática, não é? É uma coisa gira.
Portanto, tem cada vez mais estas limitações naturais para além de todas as outras. Mas há meios. Por exemplo, tem um meio extraordinário que são as redes sociais. Em 90% dos casos as redes sociais em campanha são utilizadas pelos políticos para porem lá coisas, o que é errado. É à Cavaco Silva, não é? "Vou aqui pôr o voto de condolências ao Prof. António Borges” e pronto. É uma ferramenta de diálogo e se pensar naquilo como uma ferramenta de diálogo sai-lhe muito mais barato qualquer panfleto posto na caixa do correio e é sobretudo muito mais eficaz.
As novas tecnologias permitem, ao mesmo tempo que dispersam o público porque as pessoas já não vêem televisão nem lêem jornais, mas permitem que se volte ao contacto directo. Deixo sempre uma recomendação na histórias das campanhas e no contacto político, que é voltarmos todos às bases, à origem da coisa, que é o porta-a-porta, falar com as pessoas, apertar-lhes a mão, dar-lhes um toque, senti-las, dar-lhes um apertão, porque isso é aquilo que as pessoas precisam. Porque como já não sentem confiança, acham que os políticos são todos iguais e são porque estão nos carros pretos e vão para uns palácios e governam a partir dos palácios, se alguém me tocar provavelmente ganhará a minha confiança e a minha simpatia.
Portanto, as redes sociais, as novas tecnologias e ironicamente as velhas tecnologias, voltar à origem, voltar a apertar a mão e a tocar as pessoas.
Hugo Soares
Grupo Bege, Daniel Pinheiro.
Daniel Pinheiro
Bom dia a todos. Gostaria de agradecer em primeiro lugar ao nosso reitor Carlos Coelho e ao Dr. Rodrigo Moita de Deus pela fantástica aula a que assistimos.
Como sabem, ontem o grupo Bege foi o anfitrião do jantar da Universidade de Verão. Tivemos a oportunidade de conversar com alguns elementos da mesa e a certo ponto falámos do antigo Primeiro-Ministro Eng.º José Sócrates. Houve um membro do nosso grupo que confessou achar o Eng.º José Sócrates realmente um bom político. Ao que o deputado Hugo Soares chamou a atenção para a confusão que muitas vezes fazemos entre um bom orador e um bom político.
Esta confusão que por vezes fazemos é uma confusão que toda a gente faz. Então, aquilo que queríamos perguntar é: tendo nós um pessoa que achamos que realmente é um óptimo orador, que estudou bem a lição do "falar claro” mas pode ser um péssimo político, o que é que podemos fazer - passo a expressão - desmascarar mostrando à população isso mesmo.
Obrigado.
Carlos Coelho
Diria que a única coisa que é eficaz é a prova do tempo, porque de facto um bom orador tem uma grande vantagem. Durante esta hora e meia que estamos a falar tentámos explicar que a política é comunicação pelas razões que vos dissemos, em Democracia dependemos do povo e portanto temos de comunicar. Um bom orador tem as portas abertas.
Agora, as pessoas acabam por perceber qual é a diferença entre um político responsável e sério e um fala-barato, mas isso não é imediato. Diria que numa primeira abordagem as pessoas podem comprar um fala-barato como se fosse um bom político. No início, Sócrates convenceu, só quando foi confrontado com a sua própria incompetência, com a incapacidade de zelar pelo interesse do país e a desfaçatez com que deixou um peso incomensurável sobre as vossas gerações, sendo que todas as obras que ele fez são vocês que vão ter de pagar, foi isso que o desmascarou.
Mas não tenham dúvidas que um bom orador tem as portas abertas e não é possível ser um bom político sem ser um bom orador ou sem comunicar bem. Aqui um bom orador é no sentido de bom comunicador, posso não ser um orador no sentido clássico, mas se eu souber comunicar, não se esqueçam da minha última metáfora sobre as mais lindas palavras de amor serem ditas no silêncio de um olhar. Portanto, não interessa às vezes tanto o falar mas transmitir a mensagem, emoções, convicções.
Isso é a prova do tempo, não há outra forma de responder a isso.
Rodrigo Moita de Deus
Estava a ouvi-lo e estava a achar o exemplo tão significativo, porque alguém fez uma avaliação de um político como o tipo que consegue aldrabar mais pessoas, aldrabar a população, aquele que conseguiu mais votos e que fala melhor. Enquanto pensarmos na política como uma espécie de negócio, em que Vale e Azevedo seria claramente o Presidente da República, porque melhor não há, estamos todos tramados.
O tipo que fala bem e consegue "enganar” muita gente nas eleições, essa mudança de paradigma tem que começar de nós que aqui estamos dentro, porque senão lá fora, que eles já têm essa ideia, se nós nos deixamos convencer também por esta questão da eficácia, da capacidade de passar expressões, do melhorspin, daquele que conseguiu enganar mais, estamos tramados. Aí é que não conseguimos muda nada.
Para fazer essa mudança de paradigma tem de começar cá dentro. Um bom político é aquele que resolve o problema às pessoas, é aquele que faz alguma coisa útil pela sua terra ou para o seu país. Isso é que é um bom político. É aquele que traz alguma coisa de novo, ou que acrescenta alguma coisa que não existia antes - isso é que é um bom político, tudo o resto aprende-se.
Estamos a dar uma aula sobre isso, não estamos? O resto nós resolvemos, se não sabe falar, não sabe pôr as mãos, não sabe sentar direito, isso é o mínimo, não se preocupe com isso, há aulas para tudo. Hoje em dia, então, vai à Internet tirar notas. Isso consegue-se resolver, o resto é que não. A boa fé, a boa natureza, a capacidade de mudar a vida das pessoas, isso não se aprende, tem mesmo de lá estar.
Hugo Soares
Liliana Correia do grupo Rosa.
Bibiana Correia
Antes de mais nada, quero cumprimentar todos: a mesa, os colegas e os demais presentes; agradecer a presença do Dr. Rodrigo Moita de Deus e pela brilhante palestra, assim como ao Dep. Carlos Coelho. Acho que é útil não só para a vida política mas também - falo por mim - para a minha faceta profissional e a pergunta que quero colocar é a seguinte: quando fazemos uma conferência de imprensa e a mensagem que sai nas notícias não é exactamente aquilo que queríamos transmitir, o que é que podemos fazer neste caso para contornar a situação?
Não estou a dizer para restringir a liberdade de imprensa ou tentar contornar de outra forma, mas digamos que a notícia sai de uma maneira mais sensacionalista. Tive um professor na faculdade, que dizia que há muitas maneiras de dizer a verdade: posso dizer que a minha colega tem uma t-shirt de manga curta, cor-de-rosa, e nas notícias sair que ela tem de manga curta quando eu queria que eles dissessem a informação mais importante que era que ela tinha uma t-shirt cor-de-rosa.
Portanto, não sei. Será que me podiam dizer se há alguma maneira de contornar esta situação ou pelo menos de tentar transmitir a mensagem que foi perdida entretanto?
Obrigada.
Carlos Coelho
Bibiana, o exemplo que vou dar não é o melhor, mas o que você diz é verdade, quando queremos que os jornalistas reproduzam exactamente aquilo que nós queremos temos de evitar ser prolixos. Porque se falarmos muito eles têm muito para escolher. Se no seu exemplo, aquilo que você queria dizer era que a t-shirt era cor-de-rosa, você tinha de excluir qualquer outro comentário. Não pode dizer que ela é curta, que ela é bonita, que ela é de marca. Tem que dizer que a t-shirt é cor-de-rosa, se é o que lhe interessa passar.
Se o jornalista perguntar se é bonita, você responde que é cor-de-rosa e se ele perguntar se cheira bem, você responde que é cor-de-rosa. Comecei por dizer que o exemplo não era bom, mas recordam-se do episódio que ocorreu entre o Dr. António José Seguro e os jornalistas a propósito da convocação de um congresso quando se dizia que o António Costa o ia desafiar. Perguntavam-lhe se ele ia invocar um congresso e ele respondeu "qual é a pressa?”.
Caiu no ridículo de dizer isso dez vezes, aliás foi muito parodiado por causa disso, mas a mensagem passou. Não houve a multiplicação de mensagens. Respondeu sempre "qual é a pressa?” e a mensagem que passou, mal ou bem, foi "qual é a pressa?”.
Portanto, evitar a multiplicação de mensagens quando queremos concentrar só numa. Tem muito a ver com aquilo que o Rodrigo dizia sobre ossound bites.
Rodrigo Moita de Deus
Pouco mais tenho a acrescentar. A questão não é como é que isso se resolve ou como é que isso se evita. Quando dá uma entrevista quem escolhe o título é você, aliás acabámos de falar sobre isso mesmo. Quando dá uma conferência de imprensa é você que escolhe o título que vai sair. Se a notícia não sair como você queria, a culpa é sua.
Uma das formas, de facto, é evitar esta proliferação de mensagens e concentrar-se naquilo que é importante. Mas o primeiro passo é responsabilizar-se por isso, é ter noção de que cada vez que fala ou é você que escolhe o que vai sair, ou alguém escolherá por si e a escolha poderá não ser a melhor.
Carlos Coelho
Deixem-me dar outro exemplo. Já repararam que estamos a dar respostas curtas. Poderiam pensar que nós faríamos isso para aumentar as oportunidades de intervenção no "Catch the Eye”; mentira, nós queremos é que se concentrem nas nossas mensagens e temos aquela ideia de que quanto mais falamos mais nos enterramos. Quanto mais curtas forem as nossas respostas menos oportunidades teremos de dizer disparates. Estou a brincar.
Hugo Soares
Dito isto, entramos mesmo no "Catch the Eye”. Inscrições? Pedia para deixarem o braço um bocadinho em pé. Vão deixando estar durante a primeira pergunta, até porque assim ficam com o braço mais firme e mais musculado.
[RISOS]
Vamos começar pelo Simão Santana do grupo Laranja.
Simão Pedro Santana
Bom dia a todos. Gostaria de cumprimentar o nosso reitor e também o nosso convidado pela explicação que nos deram. A minha pergunta vai ter uma pequena introdução e tem a ver com algo que ainda não foi falado, que tem a ver com a questão da cor.
Assisti recentemente a um episódio que me chamou a atenção, que foi o facto de nós conhecermos o Bloco de Esquerda, como normalmente põem nos seusoutdoors,pela cor vermelha e preta. Um dos últimos outdoors que eles colocaram tem a cor verde, portanto, aquilo que eu pensei na altura foi que o Bloco de Esquerda está a se calhar a deixar, neste momento em que nos aproximamos de eleições, um discurso um bocado radical para se aproximar das pessoas com uma tonalidade que se calhar cria mais empatia e simpatia.
A minha pergunta era exactamente essa: qual a importância da cor quando fazemos comunicação, quer seja numa conferência de imprensa com aquilo que vamos ter à nossa volta, quer ao nível de eleições e mesmo o que colocamos em outdoors e afins?
Hugo Soares
Vamos fazer grupos de dois a dois. O Rodolfo do grupo Castanho.
Rodolfo Cardoso
Bom dia. Agradeço a presença do Dr. Rodrigo Moita de Deus. Gostaria de fazer a seguinte questão: as campanhas políticas estão felizmente a ficar cada vez mais profissionais, é uma realidade, daí que até tenham surgido as agências de comunicação nas campanhas e no acompanhamento da actividade política. Com tantas regras, não incorremos um pouco no risco de os nossos candidatos - e refiro-me mais a nível autárquico, como é óbvio - estarem a perder um pouco da sua autenticidade e genuinidade?
Carlos Coelho
Vou responder ao Simão e o Rodrigo responde ao Rodolfo.
A cor é um elemento essencial na comunicação, na medida em que ele é congruente com a mensagem. Por exemplo, se o deputado Hugo Soares for candidato a um lugar, seja uma câmara, a deputado, ou outro, e quiser transportar uma imagem de tranquilidade a cor se calhar é o azul, com uma paisagem de mar por trás.
Se for candidato numa lógica de conflito, recordo-me por exemplo do Eng.º Carlos Pimenta ter sido candidato à associação de estudantes do Técnico com umsloganelegante: "Tudo tem um fim. Fora com eles.” (RISOS) Portanto, estão a imaginar a agressividade da campanha e já o azul pacífico, marinho, não funciona, pois queremos uma cor forte como o vermelho.
A cor tem de ser congruente à imagem. Vou regressar a isso para vos dar um exemplo concreto de congruência entre a imagem e a mensagem. É verdade que os partidos se apropriaram de cores, mas isso funciona às vezes contra. Por exemplo, a primeira campanha vencedora do Dr. Pedro Santana Lopes à Câmara Municipal de Lisboa usou cartazes eoutdoorsvermelhos. Foi uma baralhação naquelas cabeças. Quando os cartazes começaram a aparecer primeiro sem fotografia dele, só com mensagens a dizer: "Lisboa merece melhor”, tudo em vermelho, pensavam que era o PC. Quando aparece a cara do Santana Lopes as pessoas pensaram que afinal isso não era do PC.
O facto de ter usado o vermelho foi um choque psicológico, toda a gente comentou que o Santana Lopes agora usava o vermelho. Aquilo que o Rodrigo falava dobuzz: toda a gente começou a comentar a campanha do Santana Lopes. Chegou, no início da campanha, a ser mais importante a escolha da cor do que as propostas políticas. Ninguém falava se ele queria fazer túneis mas sim que ele estava a usar o vermelho. Ele foi falado, atingiu o objectivo dele que era que as pessoas falassem dele e da campanha dele.
Portanto, a cor tem de estar congruente com a imagem.
A sua pergunta leva a outra congruência: não é só a cor, é oslogan. Esta foi uma campanha do PS para a Câmara Municipal de Cascais com duas pessoas: Arrobas da Silva e Germano de Sousa. Arrobas da Silva era o candidato à Câmara e Germano de Sousa candidato à Assembleia Municipal. Eles fizeramfocus grouppara decidirem a cor. Reparem que é o vermelho. As pessoas queriam agressividade e todas as palavras dofocus grouptraduziam essa mensagem: dinamismo, juventude, mudança. O que é que eles fizeram? Puseram essas palavras em cima destas imagens.
Isto é, quando eu vejo uma pessoa de cabelos brancos aquilo que era inspira é serenidade, experiência, prudência, sabedoria, e não é o contrário. Já não consegui tirar fotografias porque eles tiraram logo, mas eles chegaram a ter um cartaz destes com esta palavra que aparecia nofocus groupporque era uma palavra importante: juventude.
Agora, juventude e dois marretas de cabelo branco por baixo, isso não dá a bota com a perdigota, ou seja, não dá coerência na mensagem.
[RISOS]
É um exemplo do que não se deve fazer.
Rodrigo Moita de Deus
Em relação à profissionalização das campanhas, as coisas boas e as coisas más. Vamos começar com as coisas boas. A verdade é que aumenta-se a experiência, há gente mais experimentada a fazer campanhas, portanto há erros que se evitam, há boas práticas que se trocam e apesar de tudo vai-se melhorando, por uma questão de experiência - horas de voo -, na prática.
Portanto, se alguém que já fez muitas campanhas trabalhar connosco saberá resolver melhor determinados problemas.
A parte má, há uma parte perversa em tudo isto. Hoje em dia, em qualquer campanha, em qualquer sítio do país, quem cola os cartazes era uma empresa. Antigamente, quando o Carlos fazia campanhas, há muitos, muitos anos, era alguém da campanha. Os cartazes ficavam mal colados? Em 80% dos casos sim.
[RISOS]
Quando era o Carlos a colá-los, pior ainda, mas havia um envolvimento maior e a campanha hoje em dia tornou-se numa coisa asséptica, isolada na direcção de campanha. Todos são muito profissionais, sim, mas reduzimos imenso o número de pessoas envolvidas e mesmo o papel que os militantes têm. O que é que um militante hoje em dia faz? Se houver uma arruada, pronto, lá é é convocado para a arruada e lá vai para agitar uma bandeirinha. Isso é mau, porquê? Porque é a política a isolar-se a si própria. Como é que conseguimos trazer as pessoas para aqui? É a colocar cartazes? Não sei, não sei se é, estou a dar uma imagem, mas a verdade é que cola os cartazes é uma empresa, quem faz não sei o quê é uma empresa e quem faz outra coisa também é uma outra empresa. Empresas a colar cartazes muito melhor do que antigamente, mas a verdade é que são empresas e cada vez mais afastamos os militantes, aquela gente que gosta de participar, afastamo-los do processo de decisão, afastamo-los do processo político e isso não é bom. Estamos a isolarmo-nos cada vez mais.
Hugo Soares
Antes de dar a palavra, vou dizer os nomes que reunimos para o "Catch the Eye” para o caso de ainda haver inscrições ou de alguém que tenha falhado, ainda estamos a tempo. Por esta ordem que vou dizer, façam o favor de nos indicar.
A Beatriz, o Carlos Tadeu do grupo Azul, a Joana Carvalho do grupo Bege, a Maria Desidério do grupo Azul, o Ruben Santos do grupo Encarnado, o Pedro Ferreira do grupo Roxo, a Alexandra Ramalho do grupo Cinzento, o Carlos Miranda do grupo Azul e o Vítor Gaspar do grupo Rosa.
Passamos então à Beatriz do grupo Laranja.
Ana Beatriz Sêco
Bom dia a todos. Queria primeiro cumprimentar o nosso reitor e o nosso convidado, o Dr. Rodrigo Moita de Deus. Pertenço à JSD de Arganil e quando assumi ser militante da JSD tive pessoas que me apoiaram e pessoas que me criticaram. Das pessoas que me apoiam é sempre fácil ouvir os elogios, é bom ouvi-los e ter esse conforto diariamente. Se as pessoas nos criticam de uma forma construtiva também é bom para evoluirmos, mas há outras pessoas que nos criticam de uma forma muito fútil, que nos costumam dizer aquela palavra que ouvimos todos tão vulgarmente, de que estamos à procura de um "tacho” e que estes 100 jovens que estão aqui são os do "tacho” e que vamos ser os próximos corruptos de Portugal.
Como é que de uma forma clara e calma podemos dizer, às vezes aos nossos amigos e aos jovens que nos acompanham que são muitas vezes contestatários ou outro tipo de intervenção que tenham na sociedade, que nós estamos aqui para conseguir pintar um futuro melhor e conseguir caminhar no rumo certo?
Obrigada.
[APLAUSOS]
Hugo Soares
Carlos Tadeu do grupo Azul.
Carlos Tadeu Paula
Boa tarde a todos. Em primeiro lugar, também agradecer ao nosso convidado Rodrigo Moita de Deus e ao nosso director Carlos Coelho. A pergunta que eu queria fazer prende-se com uma resposta que o professor Carlos Coelho deu há bocado que as respostas devem ser curtas e concisas. Já assisti a uma situação em que é dito a um palestrante que estava a meio da sua comunicação que tinha de engonhar porque ia entrar em directo.
Como é que se pode resolver este tipo de situações?
Carlos Coelho
Vou já começar pelo Carlos Tadeu. Infelizmente, nós hoje somos muito escravos das televisões e da aparição mediática, porque a televisão é o instrumento que nos permite falar para mais gente. Embora os novos média, como o Rodrigo dirá com maior autoridade do que eu, nos permita definir melhor umtargete falar especificamente para pessoas em concreto. Às vezes tem maior impacto que a televisão, mas a televisão continua ainda a condicionar muito.
Portanto, se tenho oportunidade de falar em tempo nobre, será em telejornal, acontece muito com dirigentes políticos dizer-se para aguentar mais um bocadinho em palco pois dentro de três minutos vai entrar na televisão. Por exemplo, estarei a responder à sua pergunta e direi algo sobre a minha avó, etc., e depois quando me avisam que já estou em directo eu vou às questões que quero mesmo passar para todas as pessoas. Ou seja, estou a instrumentalizar a audiência que tenho à minha frente e às vezes as pessoas apercebem-se. Mas, pronto, deixo cem pessoas chateadas mas estou a falar para dois milhões que estão a ver o telejornal. Há muitos dirigentes políticos que fazem isso.
Já aconteceu haver um Presidente do partido a dizer a mesma coisa três vezes, as pessoas que estavam presentes deviam estar a achar: "coitado, ele deve estar com algum problema de memória, já disse isto há bocadinho”. Ele não sabia quando é que entrava exactamente no ar e portanto estava a repetir para ver se chegava a hora das televisões.
Beatriz, uma vez fui ao Fundão falar para uma audiência de 200 jovens e houve um do liceu que devia ter 17 anos e que me fez uma pergunta dura, não foi malcriada mas dura, nesse registo, se os políticos eram todos uns aldrabões e a audiência aplaudiu toda. Portanto, tive 200 jovens à minha frente a aplaudir entusiasticamente o colega deles. Eu tive um frio e disse-lhes: "vocês são jovens, só vos peço que não cedam ao preconceito, pois o pior é generalizar.”
Vou a um centro de saúde, tenho um problema, levo uma injecção, o enfermeiro é bruto e faz-me doer. Eu não posso generalizar e dizer que todos os enfermeiros são brutos. Tenho um problema judicial, vou a um advogado e ele engana-me; não tenho o direito de dizer que todos os advogados são aldrabões. Tenho um professor de Matemática que não sabe ensinar Matemática, é um desastre; não posso generalizar e dizer que todos os professores são incompetentes.
Conhecem um político que roubou; vocês não têm o direito de generalizar e dizer que todos os políticos são ladrões. Estão a confundir o trigo com o joio, estão a lançar um anátema sobre aqueles que não o são e sobretudo não estão a melhorar as coisas, porque a vossa função quando puderem votar é exactamente separar o trigo do joio, é votar naqueles que são sérios e não votar naqueles que o não são. Depois, disse-lhes mais: é perfeitamente legítimo e essa é a resposta que deve dizer a quem diz que a quer ir para política para "tachos”, diz-lhe que não, que quer ir para a política para fazer a diferença.
Se você também acha que isto é mau, que a política é má, que os que lá estão não prestam, que os que lá estão roubam e mentem, organize-se, junte amigos e candidate-se. Porque a lógica da Democracia é isto: se não concordamos com os que lá estão, vamos apresentar uma alternativa. Agora, se nos acomodamos, se nos calamos, se nos sujeitamos, estamos a ser cúmplices com as situações que queremos denunciar.
[APLAUSOS]
Rodrigo Moita de Deus
Até tenho medo de acrescentar alguma coisa. Só para dizer que estou solidário, percebo muito bem o que quer dizer, escrevo muitas coisas, portanto, sou variadíssimas vezes insultado, é raríssimo não ser insultado no sítios onde escrevo, calculo que por culpa minha. Também estamos no Governo há dois anos e eu nem um "tacho” tenho, nem Secretário de Estado sou. Ainda por cima, ser insultado e nem Secretário de Estado ser é pior ainda que o seu papel. Nem Ministro, nem Secretário de Estado, nem presidente de empresa pública, nada, nem um tachinho, não guardaram nada para mim.
A melhor forma de combater o preconceito não é com palavras, nem com discurso, é com gestos e com atitudes. Portanto, a melhor forma de combater esse preconceito é continuar a ser fiel a si própria e existir. É só isso.
Hugo Soares
Obrigado. Ia dizendo há bocado, Beatriz, que a explicação e a resposta do Carlos que vos sirva de minuta para quando tiverem de utilizar.
José Bastos Pinto do grupo Encarnado.
José Bastos Pinto
Bom dia. Obrigado por estas fantásticas palavras, importantíssimas para nós que somos, alguns, militantes comprometidos com este partido, temos responsabilidades, estamos eleitos, vamos estar ser escrutinados muito em breve e a comunicação é sempre uma parte fulcral, é o que nos faz ver se está algo a falhar, não demos aquele abraço à pessoa quando foi necessário, etc. É sempre aquilo com que nós diariamente nos questionamos nas nossas freguesias, concelhos, distritos e até no nosso país, comentando com os nossos colegas todos.
A minha questão é simples, posso estar repetir-me um bocadinho pela qualidade das perguntas que já aqui passaram, mas há um livro muito interessante que aconselho todos a ler que é o "Digital Vertigo” que mostra numas experiências interessantíssimas que as redes sociais não estão cada vez mais a nos aproximar. Vejo com curiosidade quando ao almoço muita malta está agarrada ao telemóvel e aotablete pouco conversa e vejo isso. Se calhar, até deixo a sugestão, não permitiria computadores nemtabletsà hora do almoço nem à hora do jantar, para motivar mais esse contacto entre as pessoas.
Em termos aqui da nossa estrutura, vejo algumas campanhas do nosso país a apostar fortemente nas redes sociais, mas depois vou ver os dados dos utilizadores do facebook desses concelhos e têm ali 200 ou 300 pessoas no facebook. Pergunto para quê tanto investimento quando essa parte comunicativa teria um efeito muito melhor, prolífico, e assim podíamos cativar e dar essa imagem às pessoas dedoor to door, voltando aos modelos antigos?
Agora mais para o Rodrigo - porque o nosso reitor Carlos Coelho já o ouvi falar em várias oportunidades e reflexões em que ele já repetiu muitas vezes a sua opinião pelo país inteiro -, será que esta campanha será a mais informatizada de sempre? Será isso um ponto negativo e para aprendermos para o futuro em não dar tanto ênfase às redes sociais e dar sim mais ênfase a nós, à nossa presença, às nossas idas à adega do senhor, ali, ao sítio mesmo e não escondermo-nos atrás de um monitor da Canon?
Obrigado.
Hugo Soares
Grupo Bege, Joana Carvalho.
Joana de Carvalho
Bom dia, em especial ao Dr. Rodrigo Moita de Deus. No nosso grupo temos uma colega que é a Susana que é professora no Instituto Politécnico. A Susana repara que os seus alunos têm uma dificuldade em comunicar, tanto na parte oral como na escrita. A nossa pergunta é: como é que no Ensino, nomeadamente no Secundário, se pode promover junto dos jovens a apetência de comunicar, já que na nossa opinião a escola promove muito o saber em vez de o saber fazer?
Obrigada.
Rodrigo Moita de Deus
José Pinto, a questão das redes sociais, vou despachar o assunto com duas explicações. Tal como eu disse há bocado, há cada vez menos meios para fazer campanhas, por isso é normal que invistam muito nas redes sociais, porque não há mais nada, não há outros Média. Os jornais locais e as televisões estão limitados na cobertura que podem fazer e portanto sobram as redes sociais. Isto invalida aquilo que disse? Não, nada pode substituir a campanha do aperto de mão e do abraço, voltarmos à origem, haver um regresso. Se não há jornais, rádios, cartazes, ou há cada vez menos, são 30% de cartazes, se não há campanha, na prática, a campanha tem de voltar para a rua. Uma coisa não invalida a outra.
Vi uma apresentação engraçada de um especialista qualquer que dizia que a campanha em si virava até 8% do eleitorado. Ou seja, durante aqueles meses de campanha consegue mexer em 8% do eleitorado. Isso quer dizer uma coisa muito engraçada: quer dizer que em alguns casos a campanha é quase indiferente; aquilo que é importante é a outra campanha que você fez nos outros três anos e meio. Isso é que é realmente importante, porque se fez um bom trabalho de falar com as pessoas, de ir lá apertar as mãos, ir à associação recreativa, de ter ido jantar ao mesmo restaurante antes ainda de a campanha ter começado, quer dizer que chega à altura da campanha propriamente dita muito melhor posicionado. 8% é quase nada e é cada vez menos, especialmente quando há abstenção. Importante, importante, é o trabalho que você faz durante o outro tempo de campanha que é o período de não-campanha.
Não baralhei, pois não? É quase tão importante a não-campanha quanto a campanha, o trabalho que você faz antes, de comunicar com as pessoas. Relativamente à questão dos miúdos, é uma dificuldade enorme pô-los a perceber mais ou menos a necessidade que têm de comunicar e isto ser introduzido sequer nas competências, chamam-sesoft skills. Não há em Portugal uma tradição desoft skills, destas competências, há a tradição do conhecimento académico.
Agora, há formas de estimular os miúdos para fazer isto, desde o teatro até aos concursos de palavras. Há forma de introduzir isto no currículo académico, no período curricular, sem irmos contra o programa oficial. Há formas de estimular isto. Não há americano nenhum que não saiba fazer uma apresentação em Power Point e bem, é obrigatório. Não há alemão nenhum que não seja capaz de sintetizar em cincoslidesuma tese de doutoramento. Peça isso a alguém de Coimbra e está tramada, "slides, o que é isso?”.
Estassoft skillssão absolutamente fundamentais para concorrermos numa lógica de mercado global e nós continuamos muito presos à questão do conhecimento académico universitário. A verdade é que têm de ser desenvolvidos para concorrermos numa escala global.
Carlos Coelho
Concordo com tudo o que o Rodrigo disse, mas queria acrescentar duas coisas. Primeiro, relativamente ao José: andámos a fazer uma formaçãoblitzpara os autarcas pelo país com o Instituto Sá Carneiro e o Nuno Matias foi o orador na parte do marketing e das campanhas. Ele assinalava muito bem aquilo que o José acabou de dizer. Há muitos conselhos em que apenas uma minoria usa as redes sociais. Em todo o país - e o Nuno não me deixará enganar - perto de metade das pessoas não usa as redes sociais, portanto, não podemos por mais que tenhamos vontade de usar os meios esquecer os meios tradicionais, pois senão estamos condenados ao insucesso.
Agora, os novos meios têm três grandes vantagens: a primeira que o Rodrigo já salientou é o facto de que cada vez há mais a só ter acesso aos novos meios, sobretudo na malta nova, é facto que é geracional. Em segundo lugar, a circunstância de serem mais baratos. É muito mais barato fazer uma campanha pelanetdo que pela televisão, é incomparável. Posso "targetar” os destinatários, isto é, posso fazer uma coisa para professores, outra para enfermeiros, etc., se tiver as minhas bases de dados actualizados, evidentemente.
Essas vantagens de facto são trazidas pelas redes sociais, mas esqueçam a ideia de se esquecerem das formas clássicas ou tradicionais pois elas continuam a ser essenciais ao sucesso eleitoral.
Joana, como o Rodrigo disse, a nossa escola ao contrário de outras noutros países não convida à oralidade. Isso é mau, nossoft skillsque ele estava a falar, mas mais grave que isso é a nossa escola ignorar a educação e formação cívicas. Porque se acho muito importante que um jovem saia da escola a saber comunicar e falar, acho mais importante ainda que ele saia da escola tendo todas as informações que precisa para ser um bom cidadão, ser um cidadão que perceba o mundo em que vive, ser um cidadão que sabe quais são os instrumentos. Acho que qualquer jovem devia sair da escola a saber o que é uma petição nacional ou ao Parlamento Europeu, saber o que é um referendo, saber que pode assistir às reuniões da Assembleia Municipal, da Câmara Municipal, e da assembleia da sua freguesia e falar nessas reuniões todas. Saber, por exemplo, como é que constitui uma organização não-governamental, como é que faz um grupo de voluntários, como é que abraça uma causa, como é que funda uma associação, seja ela qual for; tudo isto são valências que a escola deveria dar.
Quando o Ministro Nuno Crato - a meu ver, erradamente - acabou com a formação cívica no currículo, a JSD discordou publicamente dessa medida. Eu acho que a JSD esteve de parabéns. A JSD é a organização da juventude no Governo mas deve ter autonomia para dizer aquilo em que acredita e nesta matéria acho que esteve muito bem em defender aquilo em que acredita.
Hugo Soares
Maria Desidério do grupo Azul.
Maria Desidério
Muito bom dia a todos os presentes. A minha pergunta prende-se com o seguinte: ultimamente em Portugal têm proliferado os comentadores políticos. Uns seguem um discurso populista e outros tentam tê-lo. Será o discurso populista benéfico para o panorama político em Portugal e a sê-lo que condições se deve adoptar para conseguir desenvolvê-lo? Porque nós temos um mestre que é Marcelo Rebelo de Sousa no discurso populista e temos outros que o tentam imitar mas não conseguem.
Portanto, a pergunta é: será o discurso populista benéfico para o panorama político em Portugal e a sê-lo quem o pode fazer?
Hugo Soares
Pedro Ferreira do grupo Roxo.
Pedro Ferreira
Bom dia, Dr. Rodrigo Moita de Deus. Não sei se já se falou aqui, a minha pergunta têm a ver com a variável da altura na eficácia da comunicação para a audiência.
Carlos Coelho
Começo já pelo Pedro. Evidentemente que o impacto visual é importante. Um homem alto ou uma mulher alta têm mais presença do que uma mulher alta ou um homem baixo. Eu sou um homem baixo e não tenho problemas com isso. Sob todos os pontos de vista, quer dizer, quando vemos uma mulher dizemos que é um camião e dizemos geralmente com uma referência elogiosa, é uma mulher que enche o olho. Um homem que é espadaúdo e alto tem uma presença muito maior, mas isso não é essencial.
Talvez não tenhamos tido Primeiro-Ministro tão marcante na vida política portuguesa como o Dr. Sá Carneiro que era mais baixo do que eu. A altura não é essencial, mas sim o que transmitimos. Acho que nenhum de nós deve ter problemas com aquilo que não gostamos. Acho que todos gostávamos de ser mais altos ou mais bonitos ou mais cheios, termos valências que não temos. Nós todos, se tivermos alguma ambição, gostaríamos de ser melhores do que somos, acho que isso é saudável; agora, não nos devemos apoucar-nos. Quero dizer, não devo ter um complexo de inferioridade por ser baixo ou por ser careca, ou por ter os olhos, ou as orelhas assim, ou uma deficiência física qualquer, porque isso não é determinante.
Hoje, o Ministro das Finanças da Europa - e não é só por ser alemão, mas sim pela personalidade dele -, anda numa cadeira de rodas. Não é por causa disso que ele se deixa limitar em tudo e vai a todo o lado e fala e determina e dá murros na mesa.
Acho que isso não é um factor determinante.
Maria, o populismo é uma doença. Portanto, não diria que o Professor Marcelo tem um registo populista, pois para mim o populismo é o exacerbar de tensões, o explorar de emoções com má intenção. Às vezes, o Professor Marcelo faz um registo mais popular e associa o comentário político ao comentário desportivo. Na prática ele às vezes fazentertainmenttelevisivo, é um programa que dá gosto ver e ultrapassa a lógica da análise política. Ele tem de fazer isso porque está a fazer análise política na televisão há anos; ele é o decano da análise política.
Não sei se há muita gente a querer imitá-lo. Acho que a outra análise política que vejo de outras pessoas tem registos diferentes; estou a lembra-me de Morais Sarmento, Sócrates, Marques Mendes e não vejo que eles queiram emular o estilo do Professor Marcelo que é único. Acho que o Professor Marcelo é o Professor Marcelo.
Não acho que isso seja complicado. A análise política na televisão tem uma componente política e tem uma componente de divertir, é um programa e eles seguem muito as audiências. Recordo-me que um dia fui jantar com o Dr. Marques Mendes na casa dele e ele disse-me que no momento em que ele sai do estúdio e vai-se desmaquilhar já tem uma relação de audiometria a dizer quantas pessoas é que o ouviram, mas tem mais, tem quantas pessoas o ouviram nos diversos momentos. Ele sabe qual é o minuto que teve o pico de audiência e qual foi o minuto em que teve audiência mais baixa, sabe o que estava a falar em cada um dos minutos, portanto sabe quais os temas que as pessoas gostam mais e os que gostam menos.
Através da audiometria, têm pessoas contratadas para carregar no botão, quais foram as palavras de que as pessoas gostaram e que as pessoas carregaram no botão verde e quais foram as palavras que as pessoas não gostaram e carregaram no botão vermelho. Isto é quase uma ciência, uma ciência da comunicação. Quero dizer, é levar a sofisticação do comentário televisivo a um pormenor nunca visto antes.
Rodrigo Moita de Deus
Se calhar ia directamente à questão da Maria até porque sou Marcelista, sou o único - ah, o Zeca também é, porque o professor não conta senão seremos três - e portanto tenho de defender, por uma razão muito simples: nós estávamos aqui a falar de mudarmos o discurso, mudarmos as palavras, a forma como se comunica, ser cada vez menos politiquês e você partiu do princípio, porque alguém é capaz de simplificar esse discurso, que é populismo.
Ah, está bem, referia-se a populismo no sentido de popular na capacidade de captar novas audiências e ser mais próximo. Está bem. Porque populismo tem uma carga muito negativa. Você dizia isso ao Professor Marcelo e não sei o que lhe acontecia a si, ia parar à piscina.
[RISOS]
Portanto, a questão da simplificação da mensagem, pois isso é fundamental, é importantíssimo. Por isso é que o Professor Marcelo tem aquelas audiências tão vastas e assuntos que normalmente são propriedade de uns poucos, a muitos. É através dessa capacidade de simplificar a linguagem e trazer um novo discurso para estes assuntos.
Relativamente à questão da altura também queria fazer um comentário. O Carlos tem toda a razão, não há característica nenhuma que deva inibir alguém de fazer política, pelo contrário. Já tivemos de tudo, no mundo todo há exemplo de tudo e de todos e a qualquer um é possível. É fundamental, para isso, que os próprios não se deixem condicionar pelo facto. Isso é a regra de ouro: não se deixar condicionar pelos preconceitos dos outros. Se não se deixar condicionar pelos preconceitos dos outros, então, voltamos à questão dos gestos e atitudes, pois são elas que marcam a diferença e acabam com os preconceitos.
Hugo Soares
Para dar oportunidade a todos. Alexandra Ramalho do grupo Cinzento.
Alexandra Ramalho
Bom dia. Agradecendo a qualidade desta aula ao Dr. Rodrigo Moita de Deus e ao Dr. Carlos Coelho, a minha pergunta é: como é que podemos evitar a perda de concentração e o fio condutor discursivo quando somos atraiçoados por algum excesso de adrenalina, alguma falta de confiança ou até mesmo por algum ruído vindo da plateia?
Obrigada.
Hugo Soares
Vítor Gaspar do grupo Rosa.
[RISOS]
Rodrigo Moita de Deus
Você deve ser mesmo um infeliz lá na escola, não é?
[RISOS]
Vítor Gaspar
Os últimos dois anos foram mais complicados.
Bom dia. Quero agradecer aos oradores. Dava-me jeito saber a resposta da pergunta anterior para agora.
[RISOS]
Nos novos meios qual é o papel da informação em bruto numa sociedade cada vez mais capaz de a utilizar na mensagem? Deixo um exemplo: a simplicidade das mensagens das infografias feitas pelos jornalistas fazem perder um pouco de informação.
Obrigado.
Rodrigo Moita de Deus
Se calhar começava aqui pela última pergunta, do nosso Vítor Gaspar, até por uma questão de medo e respeito. Há cada vez menos informação em bruto. Repare: a informação em bruto é da Lusa, à qual você raramente se lembra de aceder directamente, por isso não há informação em bruto. Aquilo que acontece é que toda a informação começa já a ser tratada e é-lhe entregue assim, seja no facebook, seja nos jornais, seja na televisão, e isso é um ponto importante porque implica discernimento por parte da audiência.
Temos de promover esta escola de discernimento, ou seja, não acreditar em tudo aquilo que vemos à primeira. Porque às vezes baralhamos aquilo que é um link de um site menos próprio com um link da BBC e as duas coisas não são propriamente a mesma coisa. Já não há quase informação em bruto, há informação tratada e esta análise das fontes é um dado fundamental e é uma escola que importa promover, é uma pedagogia que todos temos de ter.
Carlos Coelho
Concordo com o que o Rodrigo disse. Só respondo à Alexandra. A resposta é: "os cães ladram e a caravana passa”. Com excepção de um limite excessivo, isto é, se a assembleia está a comportar-se de uma forma impossível, o que nós temos é de ignorar os apartes. Metemos na cabeça o que queremos dizer, como é que queremos dizer e seguimos esse guião.
Porque se nós interrompermos para responder às bocas, aos inconvenientes, aos imprevistos, estamos a estimular. Eu estou a falar e a Alexandra diz: "oh, ele acha isso”. Se eu disser: "acho e acho muito bem”. Depois é o Manuel que diz: "olhó careca”. Eu digo: "tu és um cabeludo”. A determinada altura já estão a insultar. Portanto, é não estimular isso, "os cães ladram e a caravana passa”. Portanto, temos uma coisa para dizer, estamos com sobriedade. Se ultrapassar alguns limites não pode ser. Se for numa assembleia formal é virar-se para o senhor presidente e dizer que assim não pode continuar e depois cabe a ele aquietar a assembleia.
Agora, aquilo que não podem é deixar-se perturbar. Há pessoas que só querem perturbar e vocês têm é de não se deixar perturbar.
Rodrigo Moita de Deus
Posso acrescentar. Como é que impomos respeito a alguém para além do tamanho físico? A voz. A voz é quase tudo. A voz dá ordens. Somos capazes de pontuar um texto com a voz, fazer pausas, acelerações, reprimendas e tudo com voz. A primeira questão é impor a voz. Como começo a conseguir impor silêncio numa sala? Primeiro, com a voz. Se eu começar a falar assim muito baixo, daqui a pouco estão todos a dormir, a brincar com o facebook ou a fazer outras coisas.
Segunda questão: não ignorar a audiência. A partir do momento em que eu intervenho com a voz, posso também começar a fazer outra coisa que é olhar para as pessoas de facto. Se eu estou a olhar para as pessoas elas sentem-se mais inibidas de fazer barulho. Se estou a ouvir barulho daquele menino que está ali de polo cor-de-rosa, que por acaso até é interessante que até está a pegar um papel e a mostrar à outra menina, se eu olhar para ele, ele fica inibido e vai pôr o papel em cima da mesa. É uma questão de educação. Para quem não está a fazer isso com maldade, é uma questão de educação e a pessoa sente-se inibida. Não dá jeito mandar SMS quando alguém está a falar connosco ou a olhar directamente para nós.
Mas fundamental é a voz. Ponha a voz e vai ver que os outros se calam. É uma coisa quase tribal.
Hugo Soares
Ana Carvalho do grupo Amarelo.
Ana Carvalho
Bom dia. Antes de mais, queria agradecer aos oradores pela excelente palestra que nos deram. Isto é mais um protesto que eu venho fazer, em vez de uma pergunta. Há um tipo de discriminação que não foi falado aqui. Acho que como falámos em "falar claro”, há uma discriminação que eu tenho sentido desde que cheguei aqui que é a discriminação dos sotaques. Eu, efectivamente, sou do Porto e tenho muito orgulho de o ser, mas para o meu próprio grupo quando estou a apresentar alguma coisa é um bocadinho difícil falar durante dois minutos sem que alguém repita o que eu estou a dizer.
Há bocado tivemos o exemplo de alguém dos Açores que falou e falou muito bem, mas se perguntarmos o que ele disse as pessoas se calhar vão-se lembrar apenas do sotaque.
Portanto, a minha pergunta é: como é que nós, oradores, conseguimos ultrapassar esse limite? É muito engraçado gozar com os sotaques, só que para nós começa a ser demais, pois se já é tão difícil falar, se estamos a falar com alguém sempre a gozar com o sotaque, seja do Porto, de Trás-Os-Montes ou Açores, como é que ultrapassamos isso?
Rúben Santos
A minha pergunta é muito simples. Tenho aqui nos meus apontamentos que o Dr. Carlos disse que não devemos fugir às perguntas e anotei também que o Dr. Rodrigo Moita de Deus disse que devíamos manter a mensagem.
A minha pergunta é: certamente não será uma contradição, mas parece um paradoxo, onde está o senso nesta contradição?
Rodrigo Moita de Deus
Vou então começar, até porque fiquei a pensar naquilo que o João tinha dito dos Açores. Deixem-me contar-vos uma história que é absolutamente deliciosa. Ajudei na campanha dos Açores. Fizemos uns tempos de antenas. A ilha mais populosa é São Miguel. O locutor do tempo de antena era de S. Miguel porque achámos que correria melhor. O problema é que nos estúdios foi chumbado pelas outras oito ilhas que tinham sotaques diferentes e por isso não queriam um micaelense a fazer o tempo de antena. Experimentámos uma daquelas ilhas mais simpáticas, que não fazem mal a ninguém, que ninguém podia ficar ofendido, Flores. Também não quiseram. Solução para aquilo? Andámos nisto ainda um mês.
A solução foi fazer com sotaque da televisão, ou seja, sem sotaque nenhum. Nenhum. Pegar num lisboeta para fazermos para a ilha dos Açores, porque foi a única forma que as pessoas tinham de não se acicatarem com o assunto, nem ficarem magoadas ou ofendidas, era pondo um não-sotaque a falar. O não-sotaque treina-se. Conheci o José Carlos Castro que esteve durante muito tempo na TVI, ele é de Espinho. Normalmente, quando falava na Rádio Nova tinha um sotaque assim, era um locutor brilhante com uma voz extraordinária e foi trabalhando para eliminar o sotaque. Sei que é mais fácil dizer que não e "viva à diferença, etc.”, mas não, às vezes temos obrigatoriamente, para fazer da comunicação um estilo de vida, que eliminar todos os sotaques.
Carlos Coelho
Portanto, são as últimas respostas. Ruben, depois podemos falar com mais vagar, já estamos em cima da hora, mas o que o Rodrigo disse, e bem, é que nós temos uma mensagem fundamental para transmitir e que devemos usar as perguntas para isso. Isto é, se eu quero falar do emprego e na conferência de imprensa só me perguntam sobre o Hugo, tenho de arranjar maneira de meter o emprego. Agora, não posso fugir à pergunta, sobretudo se a pergunta for embaraçosa.
Porque se a pergunta for embaraçosa, o fugir à pergunta significa uma atitude de comprometimento. Se for o caso tenho mesmo de responder à pergunta. Agora, posso juntar as duas coisas, dizem-me que o Hugo fez uma barracada qualquer, perguntam-se como é que eu comento a atitude dele e eu posso dizer que acho que o Hugo esteve bem por uma outra razão qualquer, mas que aquilo que me preocupa neste momento não é esse comportamento mas sim o desemprego dos jovens e, assim, volto àquilo que quero falar que é sobre as medidas para o emprego.
Portanto, é conciliar a ideia de não trair o embaraço, dizendo que vou fingir que não ouvi a pergunta porque não quero falar nisso, mas concentrar-me naquilo que é o meucore business. Mas podemos depois pessoalmente dar um ou dois exemplos em que isso seja mais eficaz.
Ana, o sotaque é inevitável e para mim é uma riqueza. Adoro sotaques. Se alguém brinca com isso, ou podemos brincar ou podemos ignorar. Não acho que isso possa ser um factor de discriminação. Agora, ele só é um factor de discriminação se o aceitarmos assim. Quando fui para o Parlamento Europeu falava um inglês rafeiro e tirei aulas de inglês para melhorar o meu inglês, porque eu pertenço à geração em que a primeira língua estrangeira era o francês. Tive aulas em Edimburgo, na Escócia, e perguntei isso dos sotaques e um grande professor de inglês da Universidade de Edimburgo disse-me: "lixe-se para os sotaques, é irrelevante, pode falar com sotaque americano, inglês, escocês, irlandês, australiano, é irrelevante, o que você precisa é de se fazer compreender, porque ninguém vai dar atenção ao seu sotaque, mas sim ao que você diz.” Se alguém de má fé se vira para si depois de você fazer uma intervenção política e diz a rir: "sotaque do Porto”, você pode virar-se e perguntar se não percebeu e se quer que repita, se é preciso falar devagar para perceber melhor. Ou se quer um desenho, como dizem aqui.
Porque você está a falar português. Há de facto alguns sotaques mais cerrados, não é o caso do sotaque do Porto. Uma vez falei com um pescador numa comunidade piscatória na Madeira e eu não consegui perceber o que ele disse. O nosso amigo açoriano que falou há pouco tem um sotaque carregado e não houve nenhuma palavra que não tivéssemos percebido.
Os sotaques são uma riqueza da língua, não podemos aceitá-los como um anátema. Acho que o Rodrigo e eu temos de sair da sala, dizem as regras.